Quando falam os camponeses pobres

Quando falam os camponeses pobres

Temperada na luta contra o cerco repressor, a LCP de Rondônia realizou nos dias 23 e 24 de novembro seu III Congresso, na cidade de Jaru. Nada menos de 700 pessoas realizaram uma vigorosa manifestação que precedeu dois dias de intensos debates sobre produção, transporte, segurança, escolas populares, além do movimento das mulheres (Movimento Feminino Popular), a situação nacional e internacional, ao que não faltaram as apresentações artísticas. Caco, um dos líderes do movimento camponês preso nos últimos meses, descreve de maneira dinâmica a vida, os planos e os objetivos traçados pelos próprios camponeses.


Passeata pelas ruas de Jarú

A Nova Democracia tem publicado frequentemente a situação da luta pela terra em Rondônia. Nos últimos meses, o principal movimento do estado, a Liga dos Camponeses Pobres, sofreu intensa perseguição dos latifundiários, com a prisão de lideranças e ações armadas, conjugadas com operações das polícias (Militar e Federal), Incra, Ibama, da imprensa reacionária e de toda a sorte de pelegos.

Em todo o país, o governo FMI-PT organiza injuriosas campanhas que tentam criminalizar e desmoralizar as lutas mais consequentes dos camponeses pobres, orquestradas com a repressão brutal nos acampamentos, o que acaba revelando, entretanto, o crescimento vertiginoso de organizações independentes e mais combativas. Vários contingentes mais ingressaram no movimento desde que os oportunistas assumiram a gerência do Estado brasileiro, lançando por terra as últimas ilusões.

Caco, em sua caracterização do estado: “Rondônia é dominada pelo latifúndio. A grande propriedade de terra se fundamenta no trabalho semifeudal. A exploração dos camponeses se faz à base de relações de produção atrasadas — nas formas da criação extensiva de gado, do extrativismo vegetal (principalmente de madeira), e o mineral (nesse caso, principalmente diamante), além do monopólio do transporte rodoviário e dos meios de comunicação. Nos últimos anos, milhares de famílias abandonaram a terra e migraram para as cidades às margens da BR-364 (Porto Velho, Ariquemes, Jaru, Ji-Paraná, Cacoal e Vilhena), ou mesmo se arriscaram a desbravar novas áreas ao sul do Amazonas, como Apuí e Humaitá, repetindo a mesma trajetória dos imigrantes das décadas de 70 e 80. De forma planejada, é retirado dos camponeses o direito de produzir, e qualquer outro incentivo. Além de sonegar verbas para uma estrutura econômica moderna, o governo repete a mesma política em relação à saúde, instrução pública, etc., o que aumenta enormemente a incidência de certas doenças (malária, hanseníase, leichmaniose, hepatite, entre outras), enfrentadas de forma corajosa pelos camponeses no desbravar das matas e no processo produtivo elementar.”

“Expulsas do campo, a maioria das famílias na cidade é lançada ao desemprego, quando melhor, no subemprego, pagando um alto custo de vida entre aluguéis de barracos nas periferias sem nenhum saneamento, pelos produtos comestíveis, tarifas públicas e a assistência em geral. Lançadas à marginalidade, cresce de forma assombrosa entre elas a prostituição, roubo de objetos pessoais, comércio de drogas ilícitas, homicídios, sendo a maior vítima os jovens que se formam sem qualquer perspectiva”, fala o camponês.

O quadro, sempre mais desolador, de exploração e miséria vem gerando no campesinato a consciência de que nada mais resta a perder e que não basta expropriar a terra ao latifundiário: é necessário quebrar a espinha dorsal do monopólio da terra, ou seja, destruir o latifúndio que sempre tenta retomar as áreas libertadas pelos camponeses e manter o sistema de opressão, atingindo outros setores da população. Caco explica que também será uma luta dura e prolongada, o que não lhes assusta. Jamais buscarão os atalhos da conciliação e do oportunismo.

Caco lembra: “Organizamos a resistência econômica e política, procuramos criar as condições para tomar a terra e ali ficar, sem depender de Incra, bancos, de vigaristas políticos e outros que só querem nos expulsar do nosso canto. Toda esta situação empurra as famílias de camponeses para a mais encarniçada luta pela sobrevivência; elas enfrentam a miséria, o desemprego e a fome, revelando a consciência de que ou lutam ou morrem.” Para muitos camponeses se torna um princípio reafirmado nas assembléias ou mesmo nas suas conversas sobre assuntos vagos: “É melhor morrer lutando pela terra do que morrer de fome na cidade.”

Em 2003 ocorreram dezenas de expropriações contra o latifúndio realizadas pelos camponeses em toda Rondônia, mais concentradas no norte do estado, em municípios como Buritis, Nova Mamoré, Campo Novo, Cacaulândia, Cujubim, Mutum Paraná, União Bandeirante, assim como em áreas ao sul, notadamente Chupinguaia e Corumbiara, de recente expansão da lavoura mecanizada da soja, caracterizando frequentes disputas com o latifúndio por novas áreas.

Trabalho coletivo

Caco nos fala da resistência econômica e da produção, onde conta que a decisão imediata dos camponeses, logo na primeira assembléia, tem sido a de cortar e distribuir os lotes. Mas a produção tem início antes mesmo do corte e com a utilização do trabalho coletivo: “Nas primeiras experiências que tivemos em Machadinho do Oeste e Theobroma, os camponeses fizeram financiamento no BASA (Banco da Amazônia S/A) para as lavouras de café e cacau. O banco obrigou os camponeses a fazer esse tipo de lavoura. O povo tinha outras necessidades, como a pequena criação de gado, cercas, ferramentas, etc. Com a queda do preço do café em 2001, a maioria dos camponeses quebrou ou ficou com dívidas enormes; todo o prejuízo caiu nas costas dos camponeses pobres. Esta experiência nos mostrou para que servem os tais financiamentos: é uma corda atada em nosso pescoço”, explica.

Em alguns acampamentos os camponeses têm conseguido superar as dificuldades com o apoio dos pequenos comerciantes ou com empréstimos de sitiantes antigos que se solidarizam com eles. Conseguem sementes, gasolina, ferramentas de trabalho e outros materiais. Caco é taxativo: “Na maioria das vezes os camponeses têm que roçar, derrubar, queimar e descoivarar* tudo manualmente, com o trabalho de vários homens e mulheres, mas o que produzimos agora é nosso e não do banco.”

Ainda acampados, os camponeses produzem roças coletivas de milho, hortas, mandioca, arroz e feijão, relatou Caco ao se referir aos acampamentos Lamarca, em Theobroma; Cristo Rei, em Cacaulandia; Ozéias Martins, em Buritis; São Bento, em Jaru; Sol Nascente, em Cujubim — áreas onde a produção se realizou coletivamente. A forma utilizada é a divisão em brigadas de 10, 20 ou mesmo de 40 companheiros (homens, mulheres e crianças), desde a preparação até a colheita. Em algumas áreas chegou a superar 80 alqueires plantados. Além desta forma, nas áreas antigas ocorre frequentemente a troca de dias de trabalho entre as famílias, principalmente no cultivo do café que carece de maior atenção e tempo de trabalho.

“Em algumas áreas tivemos experiências importantes, como os grupos de ajuda mútua. Devido a nossa pouca experiência os resultados ainda foram pequenos, mas, avançamos no planejamento coletivo, na divisão das tarefas e avaliação do trabalho realizado. Vamos persistir neste caminho, que sabemos ser o único possível”, conclui Caco.


Encerramento do III Congresso da LCP-RO

Legisladores e executores

Neste III Congresso da Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia, foi aprovada a elaboração de um plano geral de produção. Em 2002, a coordenação estadual chegou a definir metas e prazos em cada área, mas não conseguiu fazer avançar. No decorrer do ano passado é que os camponeses de cada área levantaram planos para produzir e garantir o próprio sustento.

Para retorno imediato, os camponeses plantam arroz, milho, feijão, mandioca, que produzem depois de três meses e são a base da sua alimentação. Em termos de comercialização, o retorno é pequeno devido à ação dos atravessadores e grandes armazéns controlados pelo latifúndio. Por exemplo, na entressafra, que vai de junho a novembro, o preço do arroz era de R$ 45 a saca, agora, na colheita, caiu pra R$ 20. Menos da metade!

A ausência de estradas é um dos grandes problemas enfrentados pela maioria dos camponeses das regiões. Nestes locais, a produção se perde por não se ter como escoar. Revela Caco: “Em alguns lugares, temos nos organizado coletivamente para abrir carreadores com moto-serra, enxadão, foice. Em outros, conseguimos o apoio de pequenos madeireiros que abrem estradas e pontes improvisadas facilitando o acesso de veículos e o escoamento da produção.”

As massas decidem

As assembléias são o órgão máximo de poder popular nas áreas. Nelas os camponeses decidem e se organizam, estabelecem a produção, o que e como vão produzir, as normas de conduta, disciplina, segurança, etc. Nas assembléias, os camponeses têm aprendido a exercer o seu poder, que não se resume à discussão dos problemas e à decisão coletiva. Eles cuidam para que a decisão tomada se torne realidade, organizando sua execução: “Em relação a isso temos avançado na compreensão do novo caráter das assembléias. Muitos dos problemas que enfrentamos, durante um tempo, tiveram por base o fato da direção não se apoiar nas massas na hora de tomar decisões. No último período, houve muita luta para envolver todos os companheiros nas discussões e decisões. Isso gerou maior envolvimento nas tarefas e autoridade dos companheiros na solução dos problemas.”

Para um tempo novo

O companheirismo já não é o mesmo, em que predominava a solidariedade nas derrotas, lamúrias e solidão, ou êxitos de pouco alcance. A luta avançou e os camponeses ousaram ser donos da sua própria vida. Chegam à conclusão de que, ainda que a propriedade seja familiar, individual, os maiores problemas são resolvidos apenas quando decidem e executam algo juntos. E a questão reside na maneira com que decidem e executam juntos. Existem doentes, mas toda aquela gente se une para combater as doenças. São companheiros de um novo tempo — sem exagero.

É comum o trabalho de arrecadar recursos que funcionam ali, como o dinheiro, remédios, alimentos, roupas, para auxiliar em casos de doenças ou mesmo para situações recentes de mães separadas ou de viuvez. Muitos emprestam motos e arranjam outro tipo de transporte de doentes, localizam parentes ou outros companheiros na cidade que acolhem os doentes para que eles possam se restabelecer de maneira mais cômoda. Em situações graves, os camponeses fazem uma cota, pequenos comerciantes também ajudam, aparecem as passagens e o paciente chega a outro estado, onde passa a dispor de maiores recursos.

Entre os trabalhos mais perigosos está o da derrubada, quando os acidentes são constantes. Conta Caco: “Tivemos um caso recente de um companheiro, o Barbudo (do Vale do Anari), que faleceu neste trabalho. Claro, os companheiros providenciaram alimentos para suprir as necessidades da família. Quando entramos numa área nova, geralmente, pequenos comerciantes, camponeses pobres e médios nos fornecem alimentos, leite para as crianças e remédios que completam o nosso modesto abastecimento.”


A comissão de cozinha

O caráter da escola

As experiências realizadas em duas áreas foram importantes e serviram para entender o que esperam os camponeses de uma escola nova. Em primeiro lugar, a escola deve partir de seus interesses imediatos: a alfabetização, a organização da produção e de sua vida, como os problemas de saúde orgânica e atividades prazerosas no tempo livre dos camponeses. Deve contar, em todos os momentos, com a presença ativa dos trabalhadores, e não tê-los como meros espectadores.

A prática foi a de organizar escolas que atendessem às necessidades gerais das áreas como instrução primária, técnica, voltada para a produção, a literatura e a arte, o lazer. O estudo e o trabalho estão ligados e presentes em todas as atividades. A estrutura montada visava atender essas necessidades. Houve um rico período de experiências na relação com os camponeses e na luta por construir sua escola. Muitas dificuldades interromperam certas vezes os avanços no projeto da escola de educação intelectual, física e politécnica — ligada à produção, com maior conteúdo e currículo simplificado.

Caco prossegue em seu relato: “A questão arte, em particular a música, foi muito trabalhada nas escolas e acampamentos. Em algumas áreas os camponeses incorporaram certas canções, como Bela ciao e Bandeira rubra. Essas, todos cantam; são as preferidas. Há outras mais, como Conquistar a terra, O risco, Jovem guarda e o hino dos trabalhadores de todo o mundo, A Internacional, sempre cantado com respeito e com muita emoção pelos camponeses. As músicas fazem parte de quase todas as atividades, como reuniões, assembléias, congressos, casamentos nas áreas. Sempre fazemos a questão de explicar seu significado e difundir suas letras para facilitar o aprendizado.”

O apoio nas cidades

Caco prossegue narrando: “Aqui em Rondônia, as cidades vivem em função do campo, a prosperidade dos pequenos comerciantes depende do trabalho dos camponeses pobres. Só existe comércio forte onde há camponeses produzindo. Muitos comerciantes defendem e apóiam a Liga (política e materialmente), pois sabem que somente a produção camponesa pode evitar sua ruína, e que, para isso, tem que haver domínio dos meios de produção pelos que trabalham, o que implica em expropriar os latifundiários. Existe muita propaganda estigmatizando os camponeses (que os latifundiários e pelegos chamam de sem-terra), de baderneiros, que vão invadir a cidade e tomar tudo dos pequenos comerciantes. Mas a nossa prática demonstra o contrário: sabemos separar os amigos dos inimigos e nas regiões onde avançaram as expropriações que os camponeses pobres fizeram aos latifundiários, os comerciantes passaram a entender melhor isto.”

Em Theobroma, Machadinho do Oeste e Vale do Anari, muitos cobram maior presença da Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia, como forma de afugentar a crise. No Machadinho, por exemplo, comerciantes e residentes na cidade cobram da Liga que expulse os latifundiários, porque a cidade está parada e também o comércio. “Ocorreu um fato interessante: alguns membros da Liga foram à Câmara dos Vereadores para divulgar a realização do Congresso camponês. Espectadores, dispersos, ouviam os vereadores, uns até dormindo, mas quando os companheiros começaram a falar desse encontro da Liga, todos ficaram atentos bem rápido.”

E Caco emenda: “Também em outros lugares é cada vez maior a participação de pequenos comerciantes, profissionais liberais, professores, que vão constituindo uma frente de apoio à luta pela terra. Um exemplo que ilustra esta relação foi a declaração de um comerciante de Jaru, o seu Miranda da loja Barcelona, que disse a um companheiro: Acho que o Congresso foi ótimo e, se convidado, vou participar onde for. É correta a maneira que a Liga trabalha, e tem pessoas muito sérias, pelo menos as que eu conheço. Também, tem mesmo que cortar a terra. Não pode ficar esperando o Incra para cortar. Tem que entrar, cortar e distribuir a terra como a Liga faz, voltar o homem para o campo, porque ele traz desenvolvimento e na cidade ele tem que pagar água e luz, enfrenta prostituição, fome e desemprego. Só cortando e entregando as grandes propriedades é que vamos ter desenvolvimento neste país.”

Os motivos da perseguição

Caco segue tirando da memória passagens e explicações sobre a estratégia dos latifundiários e dos camponeses: “Nos últimos meses sofremos ataques concentrados do poder, que tinham como objetivo frear a luta pela terra na região, desarticulando o movimento mais consequente. Isto ocorreu porque estavam assustados com a onda de tomadas de terra em todo o estado. Montaram planos sinistros, prenderam lideranças e ativistas, ameaçaram e mataram dois companheiros; tudo como forma de nos intimidar. Mas seus planos foram frustrados pela ação combativa dos camponeses organizados na Liga, que repudiaram e enfrentaram a repressão do inimigo. Saímos mais fortes, porque defendemos os interesses dos camponeses, que é conquistar a terra e destruir o latifúndio. Para isso, enfrentamos o ódio do latifúndio, de seus serviçais e suas instituições, demonstrando a presença da organização classista e o caminho da revolução agrária.”

Segundo Caco, isso concorreu para aumentar rapidamente o prestígio da Liga entre os camponeses de outras áreas, que já procuravam contato. Eles passaram a frequentar a sede do movimento na busca de soluções para a questão da terra, questões jurídicas, apoio para problemas sérios de saúde, etc. A preparação e realização do III Congresso foi uma expressão disto, porque centenas de camponeses se envolveram na sua organização.

O congresso camponês

O Congresso contou com a presença de delegações de áreas camponesas em todas as partes do estado. Acampamento Gonzalo, Cujubim, Primavera, Lamarca, Barragem, além dos companheiros de Corumbiara — onde um deles andou 30 quilômetros para chegar ao local em que o ônibus o apanharia — , representantes das escolas populares, estudantes do Movimento Estudantil Popular e Revolucionário e companheiros de outras regiões, como o Norte de Minas Gerais, Centro Oeste e Belo Horizonte. Procedeu-se ao credenciamento de todos e foram compostas as comissões de segurança, limpeza e cozinha. Os estudantes se reuniram para organizar sua intervenção com o tema: “Servir o povo e principalmente aos camponeses pobres“.

O camponês expõe: “Estava programada uma manifestação que começou às 13h30, porque o carro de som que havíamos contratado furou em cima da hora. Provavelmente foi pressionado. Arranjamos outro, mas este só pode ir até a metade da manifestação, porque tinha outro serviço no mesmo dia. A passeata se realizou com muito vigor e animação. Participaram cerca de 700 pessoas. E como as dificuldades só nos temperam, mesmo quando o carro de som foi embora, a manifestação prosseguiu, com vários companheiros puxando palavras de ordem no gogó mesmo, cantando e soltando fogos, mantendo a organização até o final. Fizemos algumas paradas, para explicar o objetivo da passeata. Muita gente saiu às ruas acompanhando e apoiando a passeata. A Polícia Militar tentou impor outro trajeto, que não foi obedecido e, então passou a tirar fotos dos camponeses que falavam no carro de som.”

Camponeses com a palavra

O Congresso foi aberto ao som da Internacional, Conquistar a terra e palavras de ordem. Iniciada as intervenções de abertura, as organizações saudaram o III Congresso, expressando total apoio à luta pela terra e à Liga de Rondônia. Os oradores inflamaram o plenário.

Seguiram-se os informes das áreas camponesas. Os representantes falaram sobre o problema da organização da Liga e sobre as lutas nas áreas. Também houve os informes dos acampamentos e escolas populares.

Às 20h teve início a atividade cultural com apresentações de diversas músicas populares e o forró se estendeu até as 23h.

No segundo dia houve um intenso debate sobre a situação nacional e internacional, assim como sobre a situação do movimento camponês atualmente. Vários camponeses se inscreveram e falaram sobre esses assuntos, além das entidades e movimentos convidados, que tiveram importante participação no debate.

Após o almoço foi realizada uma reunião com o MFP (Movimento Feminino Popular), onde se destacaram as discussões sobre a dificuldade e a disposição das mulheres se inserirem na luta e se reafirmou a grande vitória que é as mulheres constituírem um movimento de mulheres realmente popular.

À tarde, com todos de volta à plenária, procedeu-se à leitura das cartilhas com as teses do Congresso. Em seguida foi feito um debate sobre os problemas de cada área, das coordenações e da direção da LCP-RO, e foram ouvidas várias sugestões dos camponeses.

O advogado da Liga também fez uma intervenção informando a situação jurídica das áreas camponesas. Logo após, foram realizadas três intervenções especiais sobre a Escola Popular, Movimento Feminino Popular e a sustentação da Liga em Rondônia. Nessas falas os companheiros conseguiram explicar detalhadamente cada problema, colocando em evidência, principalmente, a necessidade de elevar a integração e o suporte ao movimento camponês.

Ao final, foram eleitas as coordenações da Liga de Rondônia em cada área expropriada pelos camponeses e acampamentos, e aprovadas propostas, algumas delas como:

1Unir todo movimento camponês para acabar com o latifúndio.

2 Luta contra a intromissão do Ibama em nossos lotes.

3 Grande campanha pela libertação dos presos políticos.

4 Grande luta pela produção em todas as áreas.

5 Luta para criar uma vara agrária em Rondônia e pela energia elétrica nas áreas conquistadas pelos camponeses.

O juramento perante a bandeira da Liga foi particularmente vigoroso. Todos os camponeses e convidados se reuniram no centro da plenária, formando uma massa compacta que repetia em uníssono o que era lido por um coordenador na mesa. Nesse momento, compenetrados, os camponeses mostraram a infinita confiança na vitória da luta pela terra e pela construção do poder popular e democrático. No encerramento todos cantaram o Conquistar a terra e bradaram palavras de ordem.

“Quanto à organização, tivemos problemas. O colégio onde se realizou o Congresso foi arrumado na última hora, porque a Polícia Militar e Federal, articularam para que não fizéssemos o Congresso no colégio Jean Carlos Muniz, inventando um evento na mesma data. Depois, de forma descarada, proibiram o diretor do colégio onde acabou sendo realizado o Congresso, de emprestá-lo para a Liga, acusando os trabalhadores de baderneiros, mas foi em vão. A limpeza funcionou muito bem durante todo o Congresso. Até o amarelão que havia nos azulejos foi retirado. O presidente da Associação de Pais e Professores da escola elogiou nossa organização e a limpeza. Ao final, novo mutirão foi organizado para uma faxina geral. O diretor e os funcionários da escola também observaram que o estabelecimento foi entregue em melhor estado do que quando entramos”, diz Caco orgulhoso.

Grandes lições

O depoimento de Caco demonstra claramente o avanço do movimento camponês, a luta dura — necessária de ser travada fora da institucionalidade e do peleguismo — que tem anunciado outras, mais decisivas e estratégicas. Isto se manifesta em todos os aspectos do movimento: na conquista da terra, na produção, instrução pública, nas atividades de literatura e arte, na saúde orgânica, etc.

Ficam mais claras as duas estratégias presentes no movimento camponês e que seguirão se enfrentando cada vez com maior intensidade: a primeira, ainda hegemônica em termos nacionais, mas que vem perdendo terreno dia a dia, prega a conciliação, chama de utópica toda e qualquer resistência, se aninha no aparato de Estado e se envergonha até do nome de sua classe, que prefere denominar sem-terra ou trabalhadores agrícolas. A segunda aponta um programa — como nos congressos da Liga, se identificando com os anseios das imensas massas de camponeses pobres e outros explorados — e ganha corpo na medida em que se aprofundam as contradições, se consolida a cada embate e prepara o futuro radioso.


*Descoivarar: limpar o terreno após a queimada.

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