A reforma da Previdência proposta pelo governo Lula tem como objetivo real atender aos interesses dos Estados Unidos, que querem salvar os seus fundos de pensão e, por consequência, a Bolsa de valores norte-americana. A conclusão se baseia na seguinte sequência de fatos: em maio deste ano, em artigo publicado no jornal Le Monde Diplomatique, a redatora-chefe Martine Bulard expõe que os fundos de pensão dos Estados Unidos estão se inviabilizando em face do crescente número de aposentados e a redução do pessoal da ativa. "A montadora americana Ford, que demitiu em massa nas duas últimas décadas, conta anualmente com um empregado ativo para cada dois aposentados", escreveu Martine.
Para reverter a situação, haveria quatro soluções possíveis: criar empregos para reequilibrar esta relação, aumentar a contribuição patronal (que é recusada pelo patronato), aumentar as contribuições dos ativos ou reduzir os benefícios. Nenhuma delas é viável. "A partir de 2005, o famoso fundo de pensão americano Calpers (dos professores do estado da Califórnia) deverá apresentar um aumento sem precedentes do número de aposentadorias a pagar: ele deverá vender em larga escala as ações, o que resultará numa queda do patrimônio do fundo dos ativos, os quais deverão, portanto, contribuir mais, da mesma forma que se dá hoje com a queda das bolsas", lembrou Martine. Segundo ela, "esta é a razão pela qual financistas americanos se esforçam para criar na Europa fundos de pensão capazes de arrematar maciçamente estes papéis jogados no mercado a fim de evitar o colapso. Os assalariados europeus pagarão as aposentadorias dos mais ricos americanos."
Da mesma forma que está sendo implementada na Europa, encontraremos aqui no Brasil a mesma correlação de forças que obriga a criação de fundos de pensão na modalidade contribuição definida, que favorece o sistema financeiro norte-americano. Vamos aos fatos:
– em palestra no seminário promovido pela Associação Nacional de Previdência Privada (ANAPP), o secretário de Previdência Complementar disse que "o governo vai criar fundos de pensão públicos, na modalidade contribuição definida, administrados por financeiras privadas." Na ocasião, o presidente da AEPET, Fernando Siqueira, perguntou se ele conhecia a perda total dos aposentados da Enrom e da WorldCom com a falência delas e de seus planos CD.
– o presidente da Susep (Superintendência de Seguros Privados), no mesmo seminário, declara que "após a reforma da Previdência, a participação das seguradoras no mercado passará de 3,7% para 7% do PIB." A maioria norte-americana.
– o ex-ministro da Previdência e atual presidente da Comissão Especial para a Reforma da Previdência informou: "A contribuição dos inativos e a redução das pensões são negociáveis. O que é inegociável é a integralidade para os novos funcionários públicos."
– o ministro da Fazenda enviou, em maio deste ano, carta ao FMI prestando contas das suas ações onde ele menciona que a reforma da Previdência já foi enviada ao Congresso. Palocci disse também que não aceitaria mudanças na proposta da reforma em face do compromisso que tinha assumido com o Fundo Monetário Internacional.
Além da campanha dos interlocutores acima, os governadores do PSDB e PFL, o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, e os colunistas neoliberais dos grandes jornais defendem a integralidade e o limite de R$ 2.400. Por esta razão, reafirmam que acima deste valor seriam os novos funcionários obrigados a buscar um fundo para aplicar os seus rendimentos.
Fernando Siqueira é engenheiro e presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)