Reformas do FMI-PT

Reformas do FMI-PT

O país deveria estar estarrecido diante da capitulação de mais uma administração colonial, a qual entrou falando em esperança em vez do medo

A “reforma” da Previdência é crucial. É a primeira grande batalha lançada pela nova administração colonial para completar a devastação da economia e da sociedade brasileira. Esta já sofreu pesado bombardeio de mísseis político-econômicos, nos oito anos do “governo” tele-guiado pelo eixo Washington-Londres. As “reformas” são objeto de compromisso perante o FMI, assumido sem procuração do povo brasileiro, por dirigentes do PT, Partido das Transnacionais (bancos também o são) e registrado nas Cartas de Intenções.

Mediante esse acordo, a candidatura do PT à Presidência da República contou com benesses da pecúnia e da mídia.

O PMD, de Palocci, Mantega e Dirceu, mesma sigla de psicose maníaco-depressiva, entregou as chaves do cofre do Banco Central a mais um M (Meirelles), executivo de um dos bancos estrangeiros que tem se servido dessas chaves. Ex-presidente desse Banco, no exterior, elegeu-se, sob a legenda tucana, deputado por Goiás sem lá ter morado, mercê de fantástico derramamento de dinheiro. O PT (neo-Tucano, royalties ao Prof. Said Dib) não se limitou a seguir a política financeira do PSDB: deu o comando dela a um peessedeboston.

É proposta deste e do PT a “autonomia” do Banco Central, a qual implica a renúncia do presidente da República a seu mandato, pois ele perde o poder de confiar a quem quiser, a qualquer tempo, a direção da política monetária e financeira. Governo que admite isso não é governo, já que se autoqualifica de irresponsável, introjetando a pecha que os cobiçosos banqueiros lhe atribuem a fim de mandar na moeda e tiranizar as nações por meio de juros a seu arbítrio. O que está em jogo é importante demais para ser aprovado só porque o FMI mandou. É decidir se os ativos financeiros poderão um dia favorecer a produção e o desenvolvimento econômico e social, ou se têm de estar sempre assegurando à oligarquia o monopólio do poder econômico e político, submetendo os povos ao empobrecimento. Quando ela fundou o FED nos EUA, em 1913, o poder ficou com banqueiros privados. Por isso, os EUA são 10 vezes menos prósperos do que poderiam ser, sem falar na brutal e crescente concentração de renda.

Por que as “reformas” são decisivas? Porque se trata de golpe contra o País, numa fase do processo em que nenhum mais pode ser tolerado. Há doze anos sofremos golpes brutais. Perdemos o patrimônio e os meios de viver. Na mesma tacada, os concentradores aprofundam o domínio que detêm sobre nossas riquezas e sobre nós. Os problemas criados pelo modelo econômico que leva a esse domínio são usados como alavanca para torná-lo absoluto.

Isso se acentuou, desde a entrada de FC I em 1990, com a “desestatização” (privatizações) e a dissolução de órgãos e empresas estatais estratégicas. A mídia e as matérias pagas na televisão repetiram sem cessar que os problemas provinham das estatais. Com a liquidação delas, diziam os golpistas, todos os males acabariam, inclusive as dívidas. Resultado: o país foi privado de seu patrimônio, e as dívidas públicas tiveram seu estoque decuplicado. Em 2002, encargos financeiros de R$ 312,4 bilhões, pagos pela União, inviabilizam qualquer coisa que não seja a queda acelerada da renda, da produção e do emprego.

De repente, recupera-se algo da taxa do real. Manobra de manipuladores estrangeiros, que conta com apoios importantes: 1) juros na estratosfera; 2) brutal aperto monetário. Mas já se viu inúmeras vezes esse filme, que: 1) não tem como durar muito; 2) agrava as já terríveis condições reais da economia; 3) está em cartaz só para induzir o Congresso a aprovar as “reformas”.

A falsidade comandada do exterior diz que há deficit da Previdência Pública. A esse pretexto, pretendem espezinhar direitos básicos e adquiridos de brasileiros assalariados. Mas foi o modelo dependente que causou a deterioração geral, inclusive da Previdência, sobre a qual os servos dos concentradores colocam o foco da discussão. Não confessam que verbas da Seguridade Social são desviadas para pagar juros das dívidas públicas.

De 1995 a 2002 (FC II), abusos inqualificáveis criaram dívida como um fim em si mesmo, favorecendo transnacionais e bancos. As transferências ao exterior tornaram-se ainda menos suportáveis, e o serviço das dívidas ultrapassou a arrecadação federal de tributos, apesar de ter esta crescido enormemente. Fato tanto mais iníquo, porque são sobretaxados autônomos, assalariados e empresas nacionais, cujas rendas são também massacradas por falta de investimentos na economia e por juros de agiotagem.

Rendas sugadas por uma política centrada na extração de recursos naturais e do produto do trabalho nacional. O país deveria estar estarrecido diante da capitulação de mais uma administração colonial, a qual entrou falando em “esperança em vez do medo”. Ela adota o catecismo do FMI com fervor de neófito. Radicaliza o que a anterior fez e que conduziu ao descalabro. Como pode então sua política ser aceita por um país que deseja sobreviver? Se aceitar, é porque não está apto a sobreviver.

Reformas do FMI-PT – 2ª parte

1A administração colonial fala em deficits de R$ 39,2 bilhões com aposentadorias e pensões do setor público e de R$ 17 bilhões com os benefícios do INSS. Porém, conforme dados do SIAFI, Secretaria do Tesouro Nacional, tais deficits não existem. A Previdência faz parte do sistema da Seguridade Social, cujas receitas, em grande parte, custeiam despesas que nada tem a ver com sua razão de existir, carreadas que são para o caixa único do Tesouro Nacional. Em 2001, dos R$ 71,8 bilhões arrecadados para seguridade social, apenas R$ 35,6 bilhões lhe foram repassados. Vai tudo para pagar juros da dívida pública. Em si, a seguridade social teve superavits de R$ 26,6 bilhões (2000); R$ 31,5 bilhões (2001); R$ 36,3 bilhões (2002), perfazendo R$ 94,4 bilhões em três anos.

2O próprio INSS não tem deficit, já que dele saíram os R$ 18 bilhões destinados, em 2002, a benefícios assistenciais e a trabalhadores rurais. Milhões destes recebem salário mínimo sem contrapartida, ao contrário dos que sempre sofreram descontos previdenciários. Neste caso estão os principais alvejados pela “reforma”, os funcionários públicos ativos e aposentados. Quem tem alguma noção de justiça sabe que as prestações aos rurais e à saúde têm de ser cobertas por receita de impostos e não de contribuições. Os funcionários não têm, portanto, a obrigação de pagar por outros. Não têm, tampouco, a de custear despesas injustificadas, criadas pelo “governo”. Não lhes cabe, ademais, suprir os recursos que o poder público deixou de aportar como empregador. Essas obrigações em que o Estado é inadimplente, fariam, se cumpridas, triplicar a receita das contribuições.

3Eis a questão essencial: de quem é a responsabilidade pela situação de penúria de recursos financeiros? É dos assalariados? Ou é dos aproveitadores do modelo econômico? Este: 1) propicia as transferências de recursos das transnacionais às suas matrizes no exterior; 2) causa a exaustão das finanças públicas por meio dos juros da dívida, que absorvem a quase totalidade das receitas fiscais. Quanto aos assalariados: 1) no Brasil, a paga que recebem é ínfima em comparação com outros países; 2) o percentual de funcionários públicos em relação à força de trabalho é um dos menores do mundo; 3) os encargos da dívida da União, em 200 2, foram de R$ 312,4 bilhões, enquanto os salários e encargos sociais importaram em R$ 72,9 bilhões.

4Os donos do modelo econômico têm forçado a administração colonial, que eles controlam, a usar de expedientes danosos à economia do País e ao patrimônio público, fazendo as condições de penúria insuportáveis. Há que dizer basta. A gestão calamitosa da coisa pública ajuda a explicar por que tantas entidades e empresas estão inadimplentes. As dívidas para com a Previdência atingiram 150 bilhões em 2001. Somente isso cobriria anos de seu pretenso deficit.

5Não há tampouco que imputar aos funcionários a responsabilidade pelas renúncias fiscais concedidas a entidades filantrópicas, clubes de futebol, agroindústrias, optantes do Simples, etc. Essas isenções têm custado R$ 12 bilhões por ano ao sistema de seguridade. Ademais, a administração colonial mostra-se permissiva diante da sonegação. O Procurador da República Luiz Francisco de Souza afirma (Jornal Inverta nº 342 – 31 de Março de 2003 – Ano XII): “Minha posição é baseada no parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), que diz claramente que se fosse combatida a sonegação, haveria superavit de R$ 90 bilhões na Previdência Social.”

6Os aproveitadores do modelo econômico devem responder por brutal desemprego (que, mesmo subestimado pelo IBGE, já passa de 12% da PEA). Em vez de arruinar mais gente com falsas reformas, eles têm de explicar por que, nas poucas vagas do mercado de trabalho, quase só há empregos informais. Estes, que, em 1985, eram 53% dos existentes no setor privado, chegaram a 62% em 1999. Desemprego e informalidade reduzem a arrecadação da Previdência. Outra causa dessa queda é a insistência da administração colonial em: 1) achatar salários no setor público; 2) provocar aposentadorias antecipadas pelo temor de mudanças das regras (antes de FC I, havia 2 ativos para 1 aposentado, relação que caiu para 1,17); 3) não realizar concursos para substituir os que se aposentam. Tudo coerente com o objetivo de liquidar o Estado e suprimir-lhe a atividade reguladora e administrativa, arranjando funções gratificadas para protegidos e criando agências “reguladoras”, antes, clubes recreativos dos “regulados”.

7Com um modelo econômico autônomo, livre da ditadura do Banco Central exercida pelos beneficiários dos juros públicos, a renda e o emprego cresceriam, e, com isso, a receita da Previdência. Se o Brasil tivesse adotado esse modelo nos últimos 30 anos, o PIB equivaleria hoje a US$ 7 trilhões e não a US$ 450 bilhões, como está. Além disso, a renda, bem distribuída, implicaria massa de ativos na economia mais de 20 vezes superior à atual. Deficit da Previdência? Boa piada.

8Apesar da mesquinha situação em que está o país: 1) não há deficit; 2) o superavit seria muito maior, se a União aplicasse competentemente as contribuições recolhidas a seus cofres, ainda que com rendimento muito abaixo das taxas de juros que ela paga. Conforme cálculos atuariais conhecidos, contribuição mensal de R$ 550 acumularia, à taxa real de juros de 6% aa., em 36 anos, recursos para prover aposentadoria maior que o salário-base (R$ 5 mil) e ainda um pecúlio de R$ 795.290.


*Adriano Benayon, Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo, Alemanha. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento” [email protected].
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