A edição do dia 12 de junho deste ano da revista britânica "Economist" chegou às ruas da Inglaterra e a algumas bancas e livrarias do Brasil, com uma peça exemplar da propaganda imperialista. Pouco mais de cinco anos depois que as primeiras bombas ianques caíram sobre Bagdá, esta publicação de cabeceira da burguesia internacional dizia que o Iraque começava enfim a pôr a casa em ordem.
Izzat Ibrahim al-Douri é o líder da resistência iraquiana
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Segundo a Economist, nos últimos meses o governo iraquiano estaria conseguindo dar alguma estabilidade ao país, que depois de "muito sangue e de muitos erros cometidos", não estaria mais correndo o risco de "cair em uma eterna anarquia". Para tanto, a administração iraquiana estaria sabendo aproveitar a conjuntura internacional dos altos preços do petróleo para fazer caixa.
Para a revista, as principais evidências do suposto sucesso seriam o fato de a gerência incrustada em Bagdá estar se desvencilhando da influência do USA e, sobretudo, estar conseguindo suplantar a resistência do povo local, que a Economist chama de "milícias", e que o monopólio dos meios de comunicação costuma atribuir exclusivamente à Al Qaeda.
Mentira. E talvez a maior prova de que a resistência está viva e organizada tenha sido a forma como, no início de junho, o ex-vice-presidente de Saddam Hussein,Izzat Ibrahim al-Douri , ressurgiu, pela primeira vez desde 2003, em uma entrevista concedida ao editor-chefe do jornal egípcio Al-Mawqif Al-Arabi, Abdel-Azim Manaf.
Com a cabeça colocada a prêmio pelos ianques — a recompensa é de 10 milhões de dólares — al-Douri reapareceu para desmentir que esteja em contato com o exército invasor, como os ianques sordidamente espalham a fim de dividir a resistência. Reapareceu, sobretudo, e na condição de "Comandante da Jihad e da Frente de Libertação", para expor as linhas gerais da estratégia elaborada para a última fase do enfrentamento com os agressores — a de "sustentar a resistência e continuar a batalha até a libertação do Iraque".
Ele disse que a resistência falará com os invasores, mas apenas quando reconhecerem a derrota e a soberania do povo iraquiano, e para expor o programa estratégico da última fase da resistência, que engloba as seguintes imposições ao USA:
- Reconhecimento público oficial da resistência nacional armada e desarmada, incluindo todas as suas facções e partidos, como a única representante legítima do povo do Iraque.
- Declaração oficial de retirada incondicional do Iraque".
- Declarar nulas e sem efeito todas as instituições legislativas e políticas, assim como todas as leis e legislações criadas por elas desde o início da invasão, compensando todos aqueles que foram adversamente afetados".
- Fim dos ataques, perseguições, prisões, matanças e desalojamentos".
- Libertação de todos os prisioneiros de guerra, e de outros presos e detidos, sem exceção, compensando-os por todos os danos físicos e psicológicos".
- Restabelecimento do exército e das forças nacionais de segurança, de acordo com as leis e regulamentos anteriores à invasão, compensando todos os que foram adversamente afetados por sua dissolução".
- Promessa de compensar o Iraque por todas as perdas materiais e morais que o país sofreu por causa da invasão".
Outras nuances da bravura
Um capítulo especial — e dramático — desta resistência que se intensifica é aquele exercido pelas mulheres iraquianas. O número de mulheres resistentes mortas em ataques suicidas contra as tropas ianques em 2008 já supera o total deste tipo de ato que alia bravura e desespero nos anos anteriores de invasão. Recentemente estas heroínas foram homenageadas pelo jornal espanhol Gara.
Em editorial, o jornal ressaltou que o Iraque, o qual o USA e seus lacaios dizem ter libertado da cruel ditadura de Saddam, é hoje um país onde pretende-se outorgar um papel passivo às mulheres, retratando-as exclusivamente como mães, viúvas, filhas ou irmãs de quem mata ou morre na luta contra a invasão. "Querem as mulheres como vítimas, e nunca como agentes ativas de seu destino".
Foi a resistência do povo iraquiano à truculência ianque que derrotou a estratégia empresarial que estava por trás da invasão justificada pela mentira das armas de destruição em massa de Saddam. Em 2003, a intenção do USA era assegurar o controle dos campos de petróleo, dobrar em pouco tempo a produção de barris por dia e em seguida entregar tudo à exploração de empresas transnacionais. A extração de petróleo foi completamente inviabilizada, com a resistência incendiando poços e oleodutos e sabotando as refinarias.
E permanece inviabilizada a extração em curto prazo, ainda que o governo iraquiano, subordinado a Washington, esteja correndo para que os gigantes campos de petróleo iraquianos sejam repartidos entre as maiores transnacionais do setor o quanto antes, e aos trancos e barrancos mesmo.
Acontece que o aval da ONU para a presença de tropas ianques no Iraque termina em dezembro, o que significa que a presença militar do USA no país, em terra, água e ar, se tornará ilegal à luz dos organismos internacionais.
Isto não costuma ser empecilho para que o USA desfile seus tanques, caças e bombas mundo afora, visto que esta tal autorização da ONU só veio depois que o exército de Bush já estava no Iraque.
Mas os homens de negócios, que já viram a infra-estrutura da época do presidente Saddam Hussein ser destruída pelo povo para que os estrangeiros não roubassem a riqueza sob a terra, querem agora acelerar o fechamento de contratos antes de uma eventual retirada dos marines e diante da certeza de que, mais cedo ou mais tarde, a resistência irá novamente frustrar seus planos.
Resta-lhes mesmo, à nata das petrolíferas internacionais, aproveitar o tempo dos lacaios no poder para arrematar a terceira maior reserva de petróleo do planeta e, no futuro, dada a provável impossibilidade de explorá-las de fato — o povo iraquiano não irá deixar — valer-se de um governo lacaio provavelmente nos seus últimos dias para arrancar-lhe indenizações superiores ao preço que agora irão pagar.
Este é o cenário provável, em um futuro próximo, para um governo iraquiano de fachada, um exército invasor acuado e para o grande capital tentando garantir o que ainda é possível abocanhar. Tudo graças à bravura do povo iraquiano, que resistiu desde o primeiro dia de agressão, e não descansará até a saída ou a queda do último soldado estrangeiro, a despeito das mentiras divulgadas nas revistas burguesas e nos jornalecos dos grupos de poder econômico.
O diversionismo está aí, as manobras golpistas também — USA e os entrepostos que botaram no Iraque já preparam um acordo para substituir o aval da ONU para a matança. Mas, tanto já se fez contra este bravo povo do Iraque, que já não se acredita que algo mais conseguirá fazê-lo retroceder.