Rondônia – Ao Norte, camponeses se rebelam

Rondônia – Ao Norte, camponeses se rebelam

Julho foi o mês de intensas mobilizações das massas camponeses na região norte do País, em especial no Estado de Rondônia, onde os conflitos agrários dos últimos meses se intensificaram. A inexistência de uma política agrária comprova a falácia da gerência FMI/PT e demonstra cada vez mais que só a revolução agrária pode resolver os problemas no campo.

Foi na madrugada do dia 29 de junho que cerca de 20 jagunços encapuzados e munidos de armas de grosso calibre adentraram, por volta das 3 horas da madrugada, no acampamento Flor do Amazonas, em Candeias do Jamari, distante cerca de 35 km de Porto Velho. Lá, queimaram barracos com os pertences dos camponeses, perseguiram, atiraram e torturaram adultos e crianças.

Da mesma forma o acampamento Cafezal, em Ariquemes, vinculado à Liga dos Camponeses Pobres, sofreu no mês de junho inúmeros ataques do latifúndio. Segundo a nota da Liga em Rondônia, “Denunciam os acampados que pistoleiros contratado pelo sr. Jaime Giacomelli estão transitando na área do acampamento e ameaçando as famílias que se encontram no local. Se gabam os pistoleiros que aquele pouco de pessoas que estão no local nem precisa de policiais pra retirá-los porque caso não saiam por bem sairão por mal, na bala”.

Também em Porto Velho, camponeses das áreas Joana D’Arc II e III bloquearam na manhã do dia 19 de julho, trecho da BR 319 (saída para Manaus), nas proximidades da balsa sobre o Rio Madeira. Abandonados à própria sorte, sem estradas e energia elétrica, reivindicavam melhorias para área educacional, regularização fundiária e implantação de energia elétrica. O oportunismo do deputado federal Eduardo Valverde (PT) foi rechaçado pela massa camponesa, que não mais aceitava as desculpas pelo descaso naquela região.

Em Jacinópolis (ver AND 34), município de Nova Mamoré, a situação não é diferente. Os camponeses, há meses, sofrem os ataques do latifúndio e de seu fiel lacaio Estado policial. Em nota divulgada à imprensa a Liga dos Camponeses Pobres denunciou mais uma investida do aparato policial na região na mesma data em que os camponeses ali realizavam um protesto na BR 364, sentido Rondônia-Acre.

Pobres respondem

No acampamento Flor do Amazonas as famílias, durante semanas aguardaram uma apuração da polícia federal sobre acusações de ataques criminosos que jamais aconteceram. O INCRA, através de sua Procuradora em Rondônia, Srª Aparecida Martins, afirmou “A terra da fazenda Urupá é pública”, constatação que os camponeses conhecem há anos, quando denunciam ter sido a terra grilada por uma madeireira. Cansados de esperar, os camponeses voltaram à área, organizando comissões de defesa e, através de mutirão, constroem suas casas para continuar produzindo para suas famílias.

AND acompanhou as ações dos camponeses de Jacinópolis, que bloquearam durante quase 48 horas a rodovia BR 364, único acesso terrestre para o Acre, na localidade de Jaci-Paraná, distante cerca de 80 km da capital de Rondônia. Sobre a ponte do Rio Jacy, faixas, pneus e pedras denunciavam as ações criminosas de que são vítimas os camponeses. Também são ameaçados de despejo em virtude de uma liminar da Justiça Federal que prevê a retirada de mais de 30 mil famílias distribuídas entre Jacinópolis, Nova Dimensão e União Bandeirantes.

Dona Ana da Silva, 49 anos, foi uma das primeiras a chegar para o bloqueio da rodovia, que começou às 4 horas da manhã do dia 23 de julho.

— Capixaba, ela veio para Rondônia aos 15 anos, já que em sua terra natal a família dela foi expulsa por latifundiários. Dirigiram-se inicialmente a Cacoal, depois, à Alvorada D’Oeste, na região central do Estado, sempre trabalhando na terra dos outros. Há 4 anos mora em Jacinópolis onde, através da Liga dos Camponeses Pobres, conseguiu sua própria terra para produzir, após 34 anos em Rondônia.

Histórias como a de dona Ana são encontradas entre os despossuídos da terra — os que, em virtude de uma simples decisão judicial, perdem o pouco que conseguiram durante anos de migração errante.

O latifúndio é que será despejado do Brasil

Zé Pedro, uma das mais antigas lideranças da região de Jacinópolis, explica os objetivos do bloqueio e os passos que os camponeses pretendiam seguir:

AND – Quantos camponeses estão na mobilização do bloqueio, como se deslocaram até aqui e o que reivindicam?

— Nos dirigimos em quatro ônibus que saíram da região de Jacinópolis, quatro caminhões de Nova Dimensão (localidade vizinha a Jacinópolis), e de outras localidades menores. Há mais de 5 anos que sofremos esses problemas e estamos cansados de receber apenas promessas. Hoje (23), conseguimos juntar cerca de 400 camponeses dispostos a permanecer com a rodovia fechada esperando uma posição favorável a nós.

AND – Quais as principais reivindicações?

— A principal é o arquivamento de uma liminar da Justiça Federal que prevê o despejo de cerca de 30 mil famílias nas localidades de União Bandeirantes, Jacinópolis e Nova Dimensão. A liminar considera a região uma área de “amortecimento”, já que está no entorno do parque estadual Guajará-Mirim. Queremos a abertura da Rodovia 421, que liga Jacinópolis à sede do município de Nova Mamoré, para que possamos escoar nossa produção. Queremos escolas, postos de saúde e energia elétrica.

AND – Quantas crianças estão sem estudar?

— São 250 crianças só em Jacinópolis, sem contar com as de outras localidades.

AND – Qual a posição do governo federal e de seus órgãos de representação sobre este problema?

— Há três meses, uma representação do IBAMA e Ministério do Meio Ambiente esteve na região de Nova Dimensão e não houve acordo. O Ibama disse que era impossível voltar atrás em virtude de que, além do entorno, a rodovia atravessaria o parque.

AND – Mas os camponeses não construíram com suas próprias mãos a estrada, desviando seu trajeto para não atingir o parque?

— Sim, isso foi feito, (ver AND 28). Mas mesmo assim o Ibama, INCRA e justiça federal prometem ir à frente. Daí com o apoio dos próprios camponeses e de pequenos comerciantes dos municípios vizinhos, como Buritis, Campo Novo e Nova Mamoré, conseguimos recursos para este manifesto.

Quase 48 horas após o bloqueio, os camponeses, em assembléia geral, decidiram encerrá-lo temporariamente. Lá compareceu o chefe de gabinete do governo do Estado que imediatamente enviou máquinas à rodovia 421 no trecho solicitado pelos camponeses. Quanto às demais reivindicações nenhum representante do governo federal compareceu para respondê-las. As famílias, orgulhosas de sua ação, voltaram às suas casas para preparar novas ações até que a liminar seja suspensa.

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