Samba do povo no coração da Lapa

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Samba do povo no coração da Lapa

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As pessoas que vão à Lapa, centro velho do Rio de Janeiro, encontram várias casas de espetáculo, bares e alguns dos melhores artistas da cidade também. Recentemente a Lapa passou por um processo de revitalização que implicou, além de um incremento na atividade cultural, um aprofundamento na especulação imobiliária e um processo de expulsão de vendedores ambulantes e frequentadores mais empobrecidos. Na Rua do Riachuelo, ao lado de uma moderna — e cara — casa de shows, está o intacto Clube dos Democráticos que nas quintas-feiras recebe, há seis anos, o grupo de samba Anjos da Lua.

Há dez anos se reuniu um conjunto de músicos preocupados em tocar simplesmente samba. Foi a retomada do tradicional clube da Rua do Riachuelo aos apreciadores da região através da afinidade musical e pessoal de seis cantores e instrumentistas: Pedro Holanda, Eduardo Galotti, Mariana Bernardes, Rubem Jacobina, Sandrinho e Pedro Miranda — este último tocando atualmente com Tereza Cristina. Nos tempos atuais, com algumas substituições, o grupo continua com o mesmo intuito: tocar o que gosta em um repertório que homenageia a música brasileira da melhor qualidade, feita pelo povo.

O repertório executado no Democráticos é escolhido na hora. Durante o transcorrer da apresentação o grupo emenda canções conforme o tema, por autor, pelo tom ou pelo que a música fala, comumente homenageando um sambista. Além do mais, muitas antigas canções desconhecidas do público ganham outra roupagem em novos arranjos.

Entre os pilares musicais que norteiam o grupo e que normalmente são tocados nos seus shows estão compositores e intérpretes como Ismael Silva, Assis Valente, Geraldo Pereira, Paulinho da Viola, Tom Jobim, Noel Rosa, Ataulpho Alves, Zé Ketti, Dorival Caymmi, Adoniran Barbosa e o que o público pedir.

O Anjos da Lua completou, em setembro, 6 anos de Democráticos e está com nova formação. Mas a parceria dos integrantes já vem de longa jornada; desde 1998 nos bares Empório 100 e Antiquário, ambos na Lapa. Todas as quartas-feiras os integrantes se apresentavam profissionalmente. Nessas ocasiões eram realizados arranjos vocais inspirados nos grandes grupos antigos especializados nesse tipo de trabalho, como Anjos do Inferno e Bando da Lua, entre outros. Foi justamente a fusão desses dois nomes que batizou o conjunto. Esses conjuntos vocais, segundo o Anjos, notabilizaram-se pela exuberância das vozes afinadas, em sutis harmonias e contracantos que valorizam a letra das músicas, ora bem humoradas, ora tristes, sempre inspiradas no dia-a-dia do povo trabalhador.

Para coroar todo esse tempo de trabalho, o grupo está em fase de pré-produção de seu primeiro disco a ser lançado em 2009 nas comemorações de uma década de carreira. O disco trará toda a essência das rodas de samba e das sucessivas quintas-feiras de Democráticos.

Enquanto o disco não se concretiza, o Anjos da Lua participou em dezembro de 2007 da gravação do CD/DVD Uma Noite Noel Rosa, evento que marcou 70 anos da sua morte. O Anjos da Lua teve a oportunidade de gravar com grandes nomes da música brasileira: João Bosco, Zeca Pagodinho, Zé Renato, Roberta Sá, Rodrigo Maranhão, Diogo Nogueira, entre outros.

Porém, o grupo enfrentará dificuldades para fazer um CD independente, já que é necessário a liberação dos direitos autorais, uma vez que o conjunto não conseguiria pagar às gravadoras e autores.

Segundo o fundador do Anjos da Lua, Eduardo Galotti, a idéia de fazer um CD de regravações com algum trabalho autoral engessa diante de algumas situações:

— Eles abrem as pernas para as gravadoras, mas jogam pesado conosco porque somos independentes. É muito complicado pra quem é pequeno. Isso é um empecilho — conta Galotti, profundo conhecedor da história do samba.

De acordo com Galotti, que é cantor e cavaquinista, o surgimento do conjunto se deveu ao fato dele ter experiência trabalhando na noite. Foi quando ele chamou os demais músicos, então da nova geração.

— Então eu os chamei inicialmente para cantar, porque todo lugar que eu cantava era apenas eu e eu. Então consegui reunir um grupo em que todos cantam e todos tocam — conta.

O cantor, violonista e cavaquinista Pedro Holanda relata que o grupo mergulha no baú de compositores antigos em virtude da vivência dos discos que os pais ouviam. Prova disso é a participação assídua no evento Samba em 4 tempos, que reúne mais três conjuntos que percorrem a história desde Donga, Assis Valente, Ari Barroso até João Nogueira, Bezerra da Silva e Beth Carvalho:

— Apenas unimos os mesmos gostos. O grupo não se preocupa muito em ficar explicando a música que vai tocar, a gente toca e pronto. Muitas vezes nos shows uma música inédita é tocada entrelaçada com uma letra consagrada do Dorival Caymmi, por exemplo. — explica Pedro.

Pedro acredita que o samba tem o seu espaço, mesmo pouco disseminado nas rádios, pois está havendo uma mudança de consciência musical, sobretudo nos jovens:

— Lógico que nessas rádios as músicas americanas têm uma avassaladora aparição. Porém, o que deve haver é uma união maior em prol do samba. Não só da iniciativa nossa e de outros grupos de samba, mas também a da Escola Portátil de Música, onde eu aprendi a tocar cavaquinho e fiz meu primeiro samba, falando do Plano Cruzado. E lá eu conheci um pessoal querendo aprender choro, tocando bandolim. Essas iniciativas são boas e não dependem das políticas culturais. Isto é, nós vamos fazendo nosso trabalho que acaba trazendo um movimento espontâneo de pessoas que queiram valorizar a música popular nos fortalecendo pouco a pouco — conclui Pedro.

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