Se é verdade que a internet é dominada e controlada pelo imperialismo, também é verdade que esse domínio e controle são relativos. Com o crescimento da internet vai ficando cada vez mais difícil para o imperialismo impedir a circulação de ideias e conteúdos em geral. Há cem anos a nascente indústria fonográfica era “ardorosa defensora da livre reprodução de conteúdos” (veja AND 48) e falava que a propriedade intelectual era uma falácia. Hoje, ela e suas filhas, as indústrias cinematográficas e de jogos eletrônicos são as maiores defensoras dos direitos autorais, não para defender os autores, mas para explorá-los ainda mais.
Se aferram ao passado como podem, sentem saudades do gramofone e dos discos de vinil, quando reinava absoluta e era praticamente impossível a cópia não autorizada de discos e muito menos de filmes. Com o advento das fitas K7 isso começou a mudar e a indústria a espernear. Já era possível pedir o vinil emprestado e copiá-lo, da mesma forma que era possível duplicar a fita de vídeo.
Mas foi o avanço da informática, particularmente da internet, que mudou de forma definitiva o panorama. A internet, de forma extremamente didática, mostrou que os monopólios não são mais necessários e que, portanto, são um entrave ao desenvolvimento da humanidade. Hoje é possível, com relativamente pouco dinheiro, produzir vídeos, músicas, jornais etc. e distribuí-los pela internet.
Os vídeos que AND produz são exemplos claros disso. Com um equipamento inimaginável há 20 anos, nem tanto pela capacidade, mas pelo custo, e criatividade, é possível gerar conteúdo de qualidade. Além disso, não é mais possível ao monopólio impedir a duplicação e a difusão de conteúdo gerado por ele, o que permite a milhões de pessoas ao redor do mundo, que nunca poderiam comprar um CD ou ir ao cinema regularmente, terem acesso a praticamente tudo que se produz.
A difusão de cultura e informação não é problema do monopólio, apenas a circulação de mercadorias e o controle da informação importam. Tentam desesperadamente barrar o progresso e conter o que chamam de pirataria. Hoje, uma intensa batalha é travada entre o imperialismo e seus monopólios, de um lado, e os milhões e milhões de usuários da internet, do outro.
Recentemente esta luta se agudizou com a tramitação de dois projetos de lei no congresso ianque. São elas o ‘Ato Pare a Pirataria Online’ (Stop Online Piracy Act – SOPA) e o ‘Ato de Proteção da Propriedade intelectual’ (Protect Intellectual Property Act – PIPA). As duas leis dariam ao governo ianque o direito de fechar sites “que praticassem pirataria” no USA e no exterior, forçar que operadoras de cartões de crédito, por exemplo, congelem os recursos destes sites e por aí vai. A parte mais dura da lei, e a que revela seu real caráter, é a que permitiria a ação sem passar pela justiça, bastando a denúncia por parte do detentor do direito autoral. Mesmo uma imagem ao fundo que tenha direitos autorais pode ser motivo para um conteúdo ser tirado do ar, pelo menos até que o judiciário se pronuncie. Um vídeo de uma manifestação ou de uma atrocidade policial onde aparecesse, acidentalmente, um cartaz de cinema ao fundo, poderia ser tirado do ar e, até que a justiça se pronunciasse, o vídeo perderia o impacto. A lei prevê ainda que sites que tenham ligações para estes conteúdos deveriam tirá-las no prazo de cinco dias. Isso praticamente inviabilizaria sites de compartilhamento de vídeos como o Youtube e criaria severas dificuldades para páginas de busca como o Google.
Mesmo antes da sua aprovação o USA mostrou do que é capaz: o FBI fechou o maior site de compartilhamento de arquivos na internet, o Megaupload, sediado fora de seu território, e processou seu fundador e outros executivos. A resposta foi imediata: o grupo de hackers conhecido como Anonymous(Anônimo) atacou e tirou do ar os sites do FBI, Departamento de Justiça, Universal Music, entre outros. Algumas empresas como a Sony Music escaparam, pois se intimidaram e retiraram o apoio às leis com medo das ameaças do grupo.
Devido à forte reação, as leis acabaram sendo arquivadas. Entre os que protestaram encontram-se o criador da internet, Tim Berners-Lee, que declarou: “Se você está nos Estados Unidos, você deveria se mover, ligar para alguém ou mandar um e-mail para protestar contra esses projetos, porque eles não foram elaborados para respeitar os direitos humanos, como seria apropriado em um país democrático“. Inúmeros sites saíram do ar por 24 horas em forma de protesto, como a enciclopédia online Wikipédia. Houve protestos também entre as grandes corporações, caso do Google – também proprietário do Youtube – que colocou uma frase de protesto no página e se posicionou contra as leis que, se aprovadas, o prejudicariam bastante.
Mesmo com o arquivamento das leis não podem restar ilusões de que a luta terminou. Os monopólios continuarão usando o governo ianque como polícia do mundo para tentar impor o terror na internet, como fazem no mundo real, e o FBI continuará garantindo o direito de todos ficarem calados, como no bordão do cinema. A grande limitação de muitos, aí inclui o Anonymous, é não relacionar a opressão e a luta que acontecem na internet com as que acontecem fora dela, como na Índia, no Peru, Afeganistão ou Iraque, e não perceber que esta luta só terá fim com o fim do sistema imperialista, que não pode ser retocado, tem que ser destruído.