Tendo como principal característica a mistura da arte circense com os folguedos populares, o grupo cearense de teatro de rua Garajal trabalha a arte do palhaço misturada aos brincantes da cultura do povo. Com oito anos de existência, além de levar teatro brincante para as ruas, o grupo criou também o Instituto de Artes e Cultura Popular, um núcleo de formação destinado a criar novos brincantes para que essa arte não desapareça.
Com apresentações que misturam circos e folguedos, o grupo consegue entreter e interagir
— O grupo foi fundado aqui mesmo em Maracanaú, cidade vizinha de Fortaleza. A maioria dos fundadores é oriunda do meio popular daqui da cidade. Todos nós estudamos em escola pública e já tínhamos como certo ser operários das fábricas que têm aqui, coisa comum entre os moradores desta cidade industrial, mas sentimos a necessidade de nos juntar para fazer cultura e mostrar que também podemos viver disso – explica Mario Jorge Maninho, coordenador e diretor do grupo.
— Nosso trabalho é uma mistura do reisado, do pau de fita, das quadrilhas juninas e outras manifestações, usando a figura do palhaço. A ideia é buscar, junto à comunidade, o resgate da cultura popular do Ceará para manter viva essa chama na criançada – continua.
— Em “cearês”, garajal é o nome que se dá ao lugar de guardar “bregueços”, coisas velhas. Também é aquele gradeado de levar galinhas e aquelas grades de proteção das árvores nas avenidas.
Quando começamos, dividi minha casa no meio: uma parte virou nossa sede e a outra continuou sendo minha residência. A parte que ficou para nós foi justamente a que eu guardava material velho, o garajal. Então ficou esse nome mesmo, não sei se por criatividade ou falta dela (risos) – brinca Marinho.
O grupo tem um repertório com cinco espetáculos de rua circulando hoje, três infantis e dois para adultos.
— Temos o Circo Alegria, que é uma brincadeira de circo. O mundo lendário de circo, falando sobre a questão da ecologia através das lendas do folclore brasileiro. O Totó e Tutu, também voltado para a ecologia, falando da amizade de um peixe e um cachorro. E, destinados a adultos, Uma dúvida paira sobre minha cabeça, abordando a questão do uso de drogas, o crack, e O encontro de Shakespeare e a cultura popular – Romeu e Julieta, um Romeu e Julieta que se passa dentro de um reisado – conta Maninho.
— Esse último é o nosso carro chefe, com o qual temos participado de festivais. Para realizá-lo, juntamos toda a habilidade que temos da arte circense com o nosso conhecimento de cultura popular, por vivência e pesquisas – continua.
— Paralelo as nossas apresentações, temos reunido o grupo para estudarmos mais o teatro e seus pensadores. Também a possibilidade de misturar os clássicos com os folguedos da cultura popular, como o reisado, o pau de fita, o coco de roda, o maracatu, o pastoril e tudo o mais, e fazer com que esse teatro chegue até as pessoas, como arte de rua – fala.
Trabalho coletivo inclui o povo
— Todo o processo de criação e adaptações do grupo vão para discussão. Dependendo do texto, dividimos em grupos e eles trazem os temas para o grupão. Então se discute qual o melhor tema e o melhor texto a ser montado, se vamos adaptar algum já existente ou criar um novo. Na verdade, a adaptação torna o que já existe em algo nosso, Romeu e Julieta, por exemplo, foi adaptado com uma linguagem muito cearense, com expressões como: “Arre égua!”, e outros modos especiais do pessoal daqui falar – expõe Maninho.
— Além de buscar essa linguagem popular, procuramos passar a nossa mensagem e interagir com o público, nas apresentações de rua e na sede. Temos dois eventos bem especiais aqui na sede: o projeto “Garajal de portão aberto”, quando abrimos espaços para grupos de fora mostrarem seu trabalho, e o projeto “Sararau”, que convida a comunidade para a produção conosco – conta.
— Ele funciona como um sarau mesmo, com o envolvimento da comunidade em todo o seu processo. É um espaço totalmente aberto para o povo, com música, poesia e teatro, em que a própria comunidade escolhe o artista que será homenageado. O nome vem de uma mistura de sarau com quintal, coisa bem popular – diz, acrescentando que o Sararau acontece duas vezes por ano e o Garajal de portão aberto de três em três meses.
Segundo Marinho, o grupo conta hoje com 12 componentes, com uma média de 22 anos de idade. Ele é o mais velho com 45.
— Quem entra para o Garajal tem que aprender a tocar um instrumento, é nossa regra. E acaba que aprendem até mais de um. Alguns já conseguiram o nível superior, outros estão na faculdade e outros terminando o ensino médio, mas todos muito envolvidos nos estudos de grupo – comenta.
Baseado nas nossas pesquisas e vivência, oferecemos, aqui na nossa sede, cursos de capacitação para jovens, como a oficina de circo e teatro e a de confecções de máscaras. E fazemos cenários e adereços para outros grupos de teatro e também adereços para blocos carnavalescos. Cada um recebe por aquilo que produz e isso serve na nossa manutenção, além de prêmios de editais. E assim vamos sobrevivendo como trabalhadores da cultura – conclui Maninho.
Para contatar o Garajal: (085) 8792-7355 e [email protected]