Ela foi uma criança e adolescente brasileira influenciada pelo monopólio dos meios de comunicação, que só tocava a música enlatada dançante, a chamada discoteca. Mas bastou um olhar mais atento para que Teresa Cristina abraçasse a música popular brasileira, o samba, e se tornasse uma cantora respeitada nesse universo. Apresentando-se há dez anos com o Grupo Semente, cantando ao lado de Paulinho da Viola, e outros grandes nomes do samba, Teresa caiu no gosto popular.
Teresa Cristina nasceu em 1968, na Vila da Penha, subúrbio do Rio, perto do bairro da Penha, um local tradicional de rodas de samba/choro. Mas, como a maioria de sua geração, não tinha a oportunidade de apreciar a música brasileira, por ser massacrada pelos modismos importados e veiculados pelo monopólio dos meios de comunicação.
Sua história no samba teve início quando Teresa, aos 25 anos de idade, reencontrou um disco do Candeia, que era de seu pai, chamado Samba de Roda.
— Meu pai ouvia esse disco todos os dias, e eu não me interessava na época. Mas quando o reencontrei e parei para ouvir, fiquei muito tocada pela qualidade da música, e impressionada por não ter identificado isso quando criança — lembra Teresa.
A partir daí Teresa Cristina começou a pesquisar sobre a obra de Candeia, e a primeira pessoa que a ajudou foi o biógrafo do artista, João Batista Vargens, que lhe apresentou Wilson Moreira. Por sua vez, Wilson lhe apresentou a velha guarda da Portela, que lhe apresentou Paulinho da Viola. Dessa forma Teresa começou a entrar no universo do samba. O segundo passo foi o seu talento.
— Paulinho da Viola é uma pessoa emblemática na minha carreira, porque o meu primeiro CD solo foi gravado somente com músicas suas. Eu já havia participado do CD O Samba é minha nobreza, e a gravadora me deu a idéia de fazer um só com músicas do Paulinho, o que achei sensacional. É um compositor especial, com uma obra muito rica. A partir desse disco passei a ser chamada de sambista — diz.
Ela era vistoriadora no Detran/ RJ quando começou a cantar profissionalmente, em 1998, ao lado do Grupo Semente, no bar Semente, que fica na Lapa. Ficou por cerca de um ano fazendo as duas coisas, até se dedicar somente a carreira de cantora, sempre ao lado deles.
— Eles estão comigo desde o início, é uma parceria de vida. Acreditaram no meu trabalho e resolveram me acompanhar quando eu não era ainda cantora, e não tinha nenhum passado que me levasse para a música . — diz com carinho.
Aos 27 anos de idade compôs sua primeira música.
— Material para compor é a vida, e o olhar que nós temos sobre as coisas e o desejo de reportar algum assunto é o que nos faz compor. Eu não sabia que era compositora, que poderia fazer isso um dia. Aconteceu naturalmente — comenta.
No ambiente do samba Teresa não encontrou nenhuma dificuldade para mostrar o seu talento, muito pelo contrário, foi abraçada por pessoas importantes, que lhe deram apoio.
— Fui muito bem recebida. Principalmente pela Velha Guarda da Portela, que recebe todos com muito carinho e atenção. As dificuldades que tive são as que enfrentam todos até hoje: lançar um disco, divulgá-lo, viajar para o exterior com o trabalho, e dentro do país também. Patrocínio é sempre uma barreira, por exemplo, desde o princípio da minha carreira quero fazer um show em homenagem ao Candeia e não aconteceu por falta de patrocínio — conta.
Mas mesmo com dificuldades Teresa tem viajado pelo mundo e sido muito bem recebida.
— Somos muito ricos culturalmente, com uma música e literatura muito fortes e isso gera respeito — acredita.
A opressão continua
Para Teresa Cristina, apesar da riqueza da música popular cultural brasileira, ela continua sendo oprimida dentro da sua pátria, censurada em favor da música comercial.
— Acredito que a censura vai trocando de nome, mas a opressão continua. O Estado opressor que existia tempos atrás, na ocasião da ditadura, não existe mais, no entanto, essa opressão foi se camuflando, se maquiando, ficando mais difícil de se enxergar.
No passado o artista sabia exatamente o que impedia a sua arte de ir adiante, atualmente está cada vez mais difícil de se saber isso, por causa da camuflagem dessa censura, gerando várias respostas. Os meios de comunicação estão, em grande parte, nas mãos de empresários que censuram a música popular brasileira, querendo divulgar o que vende mais rápido.
A impressão que eu tenho é de que a mídia vive para a juventude. Ela quer vender e isso funciona melhor com os jovens. O adulto geralmente questiona para comprar alguma coisa. Ele quer saber o preço, a origem, a fonte, quem está fazendo aquilo. O jovem muitas vezes não tem esse discernimento — continua.
Mas Teresa acredita que o povo em geral, jovens e adultos, sempre consegue distinguir a boa música daquilo que é jogado pela mídia simplesmente para vender, quando tem um contato maior com essa boa música.
— O que tem acontecido no momento e de muito proveito, não só para o samba, mas para a música brasileira em geral, é um grande interesse dos mais jovens pela cultura nacional. O tempo que vão levar para saber se uma música é de qualidade ou não vai depender da cultura de cada um.
Creio que temos que lutar para que as pessoas enriqueçam culturalmente e possam ter um discernimento que lhe permitam escolher algo, porque a pressão da mídia é muito forte. A música comercial persegue a todos. Se vai a um supermercado, banco, livraria, e ela está lá tocando. Cabe à pessoa identificar qual é a música que procura e qual é a que a mídia lhe obriga a ouvir — acrescenta.
Para Teresa Cristina a música brasileira extrai forças da própria realidade do povo para continuar sobrevivendo.
— Somos um povo sobrevivente. Um país como o Brasil, com a extensão que tem, as dificuldades, a fome, doenças, dengue, políticos corruptos, e muito mais, e o povo encontra tempo e disposição pra falar de amor, da natureza, de rancor, de intolerância, pra contestar o governo e a situação política do mundo, e tantas outras coisas, isso mostra a força que temos — declara.
Algo que tem ajudado a manter viva essa música popular brasileira, diante da pressão da mídia em impor outra música, é a iniciativa que fez o renascimento da Lapa, no centro do Rio, com suas muitas casas que têm divulgado o samba/choro.
— Esses locais se tornaram importantes quando a iniciativa privada resolveu apostar na Lapa como um lugar central de boemia. O samba por lá não é uma novidade, já aconteceu com vários nomes bem falados da música brasileira: Pixinguinha, Ciro Monteiro, Wilson Batista. Ela tem uma história muito forte.
Atualmente a Lapa se tornou um assunto. O que era só um lugar a mais no Rio para as pessoas se divertirem virou um centro de cultura. Hoje se pode ouvir o que quiser, e escolher entre as muitas casas para entrar. As pessoas se divertem com pouco ou muito dinheiro. Além das casas, tem muita gente na rua, que vêm de toda parte da cidade e também turistas — acrescenta.
ParaTeresa Cristina, o problema é que não se tem apoio do poder público para divulgar a cultura no local, que, além disso, não tem cumprido com sua obrigação de segurança e limpeza do local. Amigas suas foram assaltadas perto dos arcos e o povo é obrigado a fazer mutirão para manter o local limpo.
— Outro dia vi na internet o povo limpando os arcos, por considerarem que são cartão postal do Rio, e quem deveria estar fazendo isso certamente não é o povo. A Lapa existe, chama atenção, divulga a cultura do Rio e por extensão a do Brasil e não tem importância perante a prefeitura ou estado — fala.
Teresa continua se apresentando esporadicamente na Lapa, com o Grupo Semente, e viajando pelo país com seu show Delicada, CD que lançou no final de 2007. No final de julho viajará para a Bulgária, para mais uma vez divulgar a música brasileira no exterior, e já tem reserva de data para shows na Argentina em setembro.
— É tentar expandir o máximo possível a nossa música. Desejo lançar meu disco no sul, fazer turnê pelo nordeste e conhecer a região norte. Além disso, continuo compondo, mas não sei ainda no que vai resultar. Certamente é para o próximo disco — Finaliza Teresa.