Trabalhadores mostram quem tem valor de verdade

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Trabalhadores mostram quem tem valor de verdade

Em julho último, após três rodadas infrutíferas de negociação entre trabalhadores e patrões do transporte de valores de Belo Horizonte, deu-se início a uma grande mobilização em todo o setor, não só entre os motoristas, mas todo o pessoal da tesouraria, setor administrativo e vigilantes. A greve dos trabalhadores do transporte de valores de Belo Horizonte colocou fim em parte das aviltantes condições de trabalho. Na multinacional espanhola Prosegur, há mais de 20 anos não havia greve, a situação era insustentável. Mantém-se as mobilizações e novas batalhas estão por vir.

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Diante das reivindicações de aumento salarial, os representantes das empresas, de forma arrogante, ofereciam 4% de reposição salarial e recusavam-se a discutir as cláusulas sociais. Foi o estopim para o movimento que trouxe à tona as humilhantes condições de trabalho dos funcionários da tesouraria, que não tinham direito sequer a uma vestimenta digna para exercer seu ofício, formas ilegais de remuneração como os "horistas", um desrespeito à Convenção Coletiva de Trabalho.

Antes mesmo de convocar a primeira assembléia, o Sindicato enviou uma comissão para denunciar a grave situação dos trabalhadores da multinacional Prosegur. A empresa impunha a 39 funcionários da tesouraria o pagamento da diferença de valores após a contabilidade.

— Havia previsão para descontos nos salários de alguns funcionários até o ano de 2009 "para cobrir os prejuízos da empresa"— relatou Emanuel Sady, delegado sindical, motorista de profissão, conhecido e respeitado por todos na empresa e no Sindicato.

Neste dia a tesouraria da Prosegur parou. Os funcionários, atendendo ao apelo do Sindicato paralisaram o trabalho por um dia inteiro e animaram o movimento grevista que contou com a adesão maciça dos trabalhadores de todos os setores, que decidiram levar a luta até o cumprimento de suas reivindicações.

Empresas na contramão

O boletim Volante Rodoviário, publicado pelo Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários de Belo Horizonte e Região, já denunciava há muito as condições de trabalho nas empresas do transporte de valores:

Proforte
Os trabalhadores da tesouraria desta empresa eram submetidos a condições de trabalho desumanas, salário de miséria, abusos e desrespeitos por parte dos patrões. Lá os trabalhadores eram obrigados a pagar pela diferença nos valores após a contagem, como se estivessem roubando a empresa, enquanto cumprem jornadas de trabalho que vão das 15h até às 8h do dia seguinte. Os motoristas não suportam dirigir os caminhões com a direção tão pesada que por vezes precisam pedir ajuda dos companheiros para virar a direção. Devido a este problema, muitos motoristas desenvolveram graves problemas na coluna.

Embraforte
Nesta empresa os salários não eram pagos no dia correto. Vigilantes estavam cumprindo função de motorista sem serem classificados como tal e sem receber o salário equivalente a esta função. Alguns vigilantes não possuem sequer o curso necessário para transportar valores. Além disso, de acordo com o Sindicato dos Rodoviários, a Embraforte tem o costume de descontar no salário do trabalhador o valor das peças mecânicas de reposição dos carros da própria empresa.

Rodoban Os carros desta empresa estão em péssimo estado de conservação.
Vários trabalhadores vão trabalhar sem coletes à prova de bala, pois a empresa não os oferece em número suficiente.

A apuração do Sindicato constatou que na tesouraria da Rodoban, os trabalhadores chegam a cumprir uma jornada de até 18 horas consecutivas.

Blinks
Nesta empresa os motoristas em trânsito não tem o direito de usufruir do horário de almoço, conforme a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

Prosegur
Nesta empresa as contradições entre trabalhadores e patrões manifestaram-se de forma ainda mais agudas.

O Volante Rodoviário denunciava que havia vigilantes dirigindo carro-forte há mais de dois anos sem receber promoção, além de desrespeitos à CLT. O horário de almoço dos trabalhadores não era respeitado, faltam uniformes, rádio-comunicadores, os trabalhadores da tesouraria são submetidos a condições humilhantes de trabalho e recebem salários miseráveis. Ainda na tesouraria era praticada uma forma de pagamento ilegal, os "horistas", não recebendo sequer um salário mínimo.

Muitos motoristas da Prosegur estão sofrendo graves problemas na coluna e vários deles tiveram que se submeter a cirurgias, sendo posteriormente afastados definitivamente do trabalho.

Pela dignidade

E a greve explodiu. Como não poderia deixar de ser, o Sindicato convocou uma Assembléia Geral dos trabalhadores do Transporte de Valores. Na assembléia uma posição era unânime:

— Companheiros, esta situação já está se arrastando por muito tempo. Nas empresas, na rua, todo mundo fala a mesma coisa. Lá na Prosegur o pessoal não aguenta mais, na tesouraria não se pode fazer nada: não pode usar calçado, não pode ir ao banheiro. Tem trabalhador recebendo 190 reais! Nossa opinião é que devemos organizar a greve. Nenhum carro-forte levará dinheiro para os bancos, nem recolherá. Se eles não atendem a nossa reivindicação, veremos até quando os bancos e o comércio irão funcionar sem dinheiro. Nós, da Prosegur, somos pela greve, e o Sindicato também, mas temos que decidir todos, unir a classe — foram as palavras de Emanuel Sady, ouvidas atentamente e acatadas por todos.

Não era momento para vacilações. No dia seguinte, piquetes pararam as três maiores empresas do transporte de valores de Belo Horizonte.

E a tesouraria, 20 anos sem fazer uma greve, parou!

A Prosegur submetia os trabalhadores da tesouraria às mais humilhantes condições de trabalho: homens e mulheres eram obrigados a passar por uma minuciosa revista ao entrar e sair da sala onde trabalhavam, não havia banheiro, não se podia sequer usar calçados. Fizesse calor ou o frio de 13ºC ditado pelo ar refrigerado, era permitido o uso somente de um macacão. Nada de bolsos, nada de meias. Caso houvesse alguma diferença na conferência dos valores, quem arcava com os prejuízos eram os funcionários.

A Prosegur também mantém a prática inconstitucional da contratação de trabalhadores "horistas", que chegam a receber menos de 100 reais após os descontos de tiquet- alimentação, transporte e FGTS. Os horistas trabalham cumprindo horas extras sem recebê-las, varam madrugadas trabalhando, sem falar nos finais de semana e feriados.

O lucro é do patrão

Pesquisando as empresas de transportes de valores e sua movimentação financeira, descobrimos que suas ramificações estendem-se não somente pelo Brasil. Elas compõem uma rede mundial na qual a transnacional espanhola Prosegur tem lugar de destaque tanto pelos lucros, como pela exploração a que submete os trabalhadores em todos os países.

Somente no Brasil a Prosegur possui frota de 750 carros-forte e mais de 400 veículos leves. A transnacional mantém efetivos nas filiais instaladas em Portugal, França, Itália, Espanha, Romênia, Chile, Argentina, Uruguai, Paraguai, Brasil, Peru, México e Colômbia.

No Brasil, a Prosegur atua não somente com o transporte de valores, mas também no ramo da segurança privada, patrimonial e segurança eletrônica de grupos monopolistas "nacionais" e estrangeiros como o Banco ABN-Amro/Real, Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Caixa Econômica Federal, Citibank, e empresas como McDonald’s, Magazine Luiza , Carrefour e inúmeras outras.

Em 2004, a Prosegur aumentou ainda mais sua área de atuação comprando os grupos Preserve e Transpev. Esta operação, que custou R$ 80 milhões ao grupo espanhol, rendeu faturamento da ordem de R$ 400 milhões — 40% superior a 2003.

"Trabalhadores, uní-vos!"

Fato revelador da ação exploradora desta multinacional em nível mundial é esta carta de um trabalhador português da Prosegur denunciando as condições de trabalho na empresa, publicada no blog "Vidas Precárias".

(http://vidasprecarias.blogspot.com/2006/06/denncia-explorao-dos-trabalhadores-na.html)

Denúncia à exploração dos trabalhadores na Prosegur

Exmos Senhores:

Venho por este meio denunciar a ultrajante exploração que a Companhia de Segurança Prosegur tem vindo a fazer aos seus trabalhadores. Apelo à vossa simpatia por esta denúncia e ao apoio em divulgá-la.

A Prosegur obriga os seus trabalhadores a horários de 12 horas a 16 horas diárias, com meia hora de almoço/jantar… sendo tácito que são o horário normal de trabalho, já que se um trabalhador não concordar com esta imposição pode despedir-se, porque outro trabalhador o aceitará. E é tão fácil compreender porque aceitam estas condições. Afinal, o país sofre de crise econômica, o desemprego grassa por todo lado, e os salários são extremamente baixos.

De qualquer modo, as horas extraordinárias só são pagas nos turnos da noite, independente das horas que fazem durante o dia. Com esta carga horária, continuamente acontece os trabalhadores fazerem o fecho da noite às 23h30 e entrarem no dia seguinte às 6 horas ou 8 horas da manhã.

A questão das folgas é completamente abusiva. Há meses em que têm uma folga de 8 em 8 dias, há meses em que folgam apenas 2 vezes e este último mês de Maio de 2006 aconteceu no Centro Comercial Amoreiras, em Lisboa, o absurdo de não permitirem folgas aos seus trabalhadores. (…)

Para além disso, as chefias fazem jogo psicológico insinuando que na meia hora de almoço/ jantar que temos é uma regalia que a empresa lhe confere, pelo que se pressupõe que lhes podem retirar esse privilégio. Porque considero que com estas condições de trabalho todos os direitos que o trabalhador conquistou no último século XX estão a ficar esquecidas, e porque receio que quando a pobreza aumenta estamos em terreno profícuo para que as situações de exploração ou mesmo escravatura se instalem, lanço este apelo à vossa ajuda na denúncia à exploração dos trabalhadores na Prosegur.

Contra a precariedade laboral!

TP

Lições da luta

Uma breve entrevista com o Coordenador Político do Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários de Belo Horizonte e Região, Denílson Dornelles:

A greve conquistou direitos para os trabalhadores, sobretudo os da tesouraria, como o Sindicato avalia a luta?

— A greve, como dizemos sempre, é uma das formas dos trabalhadores em sua luta contra os patrões, assegurarem os seus direitos e conquistarem suas reivindicações. Esta greve dos trabalhadores da tesouraria tem um significado muito importante. Eles se levantaram sob condições desumanas de trabalho e estavam há mais de 20 anos sem realizar uma greve. O Sindicato tem persistido em conscientizar não só a categoria, mas todos os trabalhadores da necessidade de nos organizarmos e deflagrarmos uma Greve Geral contra os ataques aos direitos dos trabalhadores e às contra-reformas da gerência Luiz Inácio. As lutas localizadas são importantes e devem ser mantidas, como forma de acumular força e intensificar a propaganda da Greve Geral e a campanha de denúncias contra os ataques aos direitos do trabalhador.

E quais foram as conquistas dos trabalhadores nesta greve?

— Após a greve, a Prosegur se comprometeu em suspender a cobrança dos descontos das diferenças nos salários dos funcionários da tesouraria; ficaram suspensas as compensações de horas extras; foi liberada a utilização de blusas de frio na tesouraria; foi liberada a utilização dos sanitários para os funcionários da tesouraria; a empresa se comprometeu a não pressionar pela venda de férias e a não exigir jornada de trabalho superior a 12 horas nos dias de pico e 10 horas nos dias normais.

A empresa também se comprometeu a pagar as horas paradas e não fazer retaliações contra os funcionários.

O sindicato entende que deve ser cumprida a CLT, que estabelece jornada diária de 8 horas trabalhadas e no máximo 2 horas extras. Também entendemos que estas são conquistas importantes de uma luta, mas para abolirmos totalmente as relações de exploração, devemos desenvolver uma luta cada vez maior, unir os trabalhadores e desenvolver uma luta classista. Como dizemos sempre, em tempos de crise quem luta mais perde menos. Nossa luta não é somente para garantir direitos, lutamos por uma democracia verdadeira, diferente desta farsa onde o trabalhador luta hoje pensando somente em garantir o dia de amanhã. Mas consideramos que lutas como esta greve são uma escola e apontam o caminho para luta.

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