Trocando e fazendo arte para o povo

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Trocando e fazendo arte para o povo

Escambo define troca sem o uso do dinheiro: um produto por outro. É o que estão fazendo grupos de artistas brasileiros, que se reuniram para “trocar arte”. Um movimento que reúne principalmente grupos de teatro de rua, além de músicos, poetas e artistas ligados a folguedos populares, o Escambo é palco para artistas dividirem suas experiências, somando algo novo, enriquecedor, entre si e o povo que assiste.

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— O movimento Escambo começou há dezenove anos em Janduís, no Rio Grande do Norte. A cidade estava passando por um situação de calamidade por falta de água. Assim artistas, principalmente de teatro de rua, de várias partes do estado e alguns do Ceará, se encontraram na cidade durante uma semana, oferecendo seus espetáculos em troca de água para a população — conta Filippo Rodrigo, um dos articuladores do Escambo.

— Eles ‘rodaram o chapéu’ pelas cidades vizinhas, dali do sertão, e conseguiram latas d’água e carros pipa que serviram para abastecer a cidade durante o tempo que estiveram lá, e ao mesmo tempo, chamar atenção para a situação que ela vivia. Depois desse grande movimento os artistas viram que naquele momento era importante estarem juntos, fazendo arte voltada para o povo e com o povo, porque afinal de contas nós também somos povo — acrescenta.

Animados com o resultado em Janduís, o grupo se encontrou novamente em Carnaúba dos Dantas, também no Rio Grande do Norte, e o que era um movimento com cerca de cinquenta pessoas, passou para cem. A partir daí o movimento passou a crescer constantemente.

— Hoje temos mais de sessenta grupos fazendo parte do movimento, e uma média de setecentas pessoas. São grupos principalmente do Rio Grande do Norte e Ceará, mas também tem gente de Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Rio Grande do Sul, Maranhão, Pará, Manaus e dois grupos da Argentina (um de Rosário e outro de Buenos Aires) ambos voltados para o teatro de rua — relata entusiasmado.

Filippo começou a participar do Escambo ainda menino. É filho de Júnior Santos, um dos fundadores.

— Fui tomando gosto, me apaixonando e aprendendo com ele. Não temos um dono e nem sede, e sim articuladores. A nossa sede é a sede de cada grupo participante — explica Filippo, que tem 28 anos de idade, e faz parte do Bando La Trupe, um grupo de teatro de rua e música, um dos componentes do Escambo.

— Também não somos institucionalizados, porque não queremos, e nem financiamos os grupos. Pelo contrário, são eles que financiam o movimento. Se organizam nesse sentido. Eles têm suas ações independentes, trabalhando normalmente em suas cidades. São grupos de teatro de rua, capoeira, música, dança, poesia — acrescenta.

— Todas as ações do movimento são feitas nas praças e ruas. Mas cada Escambo tem a sua particularidade, a sua forma de se organizar. Costumamos dar autonomia ao grupo da cidade onde o movimento estiver acontecendo, porque não temos uma fórmula de bolo pronta — continua.

Os Escambos acontecem de uma a mais vezes por ano, segundo Filippo, de acordo com as possibilidades. Este ano já aconteceram três.

— Normalmente ficamos hospedados em escolas públicas, que durante o período do Escambo na cidade são transformadas em espaço artístico, pedagógico e cultural, onde oferecemos oficinas. Além disso, o movimento deixa um marco por onde passa. Temos uma parceria com o grupo Grafite, de Fortaleza, para fazer painéis em muros das cidades, com a temática do Escambo — conta.

— Além desses grandes eventos reunindo praticamente todos os grupos que compõem o movimento, chamamos de Escambo qualquer ato de troca feita entre nós. Por exemplo, se um grupo daqui vai para São Paulo, a convite de um grupo de lá que também faz parte do movimento, para fazer apresentações, oficinas, cursos, e volta para Natal com a vinda dos paulistanos marcada, está acontecendo um Escambo — explica Filippo.

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Em busca da dramaturgia própria

— No começo das nossas atividades de artes cênicas nas ruas, éramos muito influenciados pelo teatro pedagógico e questionador de Bertolt Brecht. Ele foi e ainda é um grande objeto de estudo do movimento Escambo, assim como alguns autores brasileiros e elementos dos folguedos populares, principalmente do nordeste brasileiro — conta Filippo.

— Eles entram em nossos espetáculos através do teatro de bonecos, do pastoril, maracatus, bois de reis, e mais, nos dando uma grande vivência e uma dinâmica diferente aos nossos espetáculos, nos influenciando de forma positiva, e trocando experiências conosco — diz.

Contudo o grupo acabou por perceber que buscava a construção de novos dramaturgos, começando uma linha de pesquisas e diálogos nesse sentido.

— Ao longo desses anos de existência a nossa dramaturgia foi pesquisada, destrinchada para que um grupo lá do sertão, por exemplo, ao invés de usar dramaturgos estrangeiros, ou até mesmo brasileiros, fale ele mesmo o que está querendo dizer. Assim, além de descobrir e desenvolver um novo talento, poderá ter um campo maior para se expressar — fala com convicção.

— Hoje a maioria dos espetáculos do movimento são produção própria dos grupos ou de companheiros próximos, assim como as composições musicais, específicas para cada espetáculo. O Escambo tem também uma linha de pesquisa feita nas academias, por conta dos nossos componentes que fizeram ou estão fazendo teses e dissertações de mestrado sobre o movimento — finaliza.

O contato com movimento Escambo é: www.bandolatrupe.blogspot.com. O grupo vem preparando sua própria página na internet que deverá ser lançada em breve.

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