Depois de denunciarem por anos a vergonhosa situação da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) — assim como de toda a educação pública — professores, alunos e funcionários iniciaram na segunda semana de setembro um combativo movimento de repúdio ao abandono da Universidade, impulsionado, principalmente, pelo início da gerência fascista de Sérgio Cabral. Em menos de dois dias, os professores decretaram greve por tempo indeterminado e a reitoria foi ocupada por mais de quinhentos estudantes.
Estudantes da UERJ sustentam com combatividade a ocupação da reitoria
Em assembléia realizada na terça-feira (9), professores da UERJ, com os salários congelados há oito anos, decidiram começar uma greve no início da semana seguinte, para cobrar do gerente estadual Sérgio Cabral Filho, as promessas que fez à comunidade universitária, antes mesmo de ser eleito. De acordo com os professores, a paralisação é por tempo indeterminado.
O grêmio estudantil do Colégio de Aplicação da UERJ (CAP-UERJ), ainda na assembléia de professores, declarou apoio incondicional à Greve anunciada pelos profissionais.
Reitoria ocupada
No dia seguinte às assembléias de professores e funcionários que decidiram pela greve, estudantes reuniram-se em outras duas assembléias — uma pela manhã e outra à noite — para determinar se apoiariam ou não o movimento dos profissionais. Ao final da segunda assembléia, por larga diferença, decidiu-se pelo apoio à greve.
Em seguida, alguns estudantes independentes propuseram a ocupação da reitoria da UERJ e a criação de uma pauta de reivindicações. Os militantes ligados à partidos como o Psol e PSTU — todos com adesivos de candidatos — não pouparam esforços no sentido de contrariar a idéia, menosprezando o poder da massa de estudantes e exaltando a todo momento os mecanismos de repressão do Estado.
— Gente, a grande preocupação que a gente tem que ter agora, é que o mandato que defere a reintegração de posse, ele autoriza, através de força policial, que sejam retirados de dentro da reitoria, não só a galera do DCE, mas qualquer outra pessoa. Isso permite que eles venham aqui a noite, porque é medida de urgência. Então nós temos que pensar melhor se é isso mesmo que nós queremos — disse um estudante de direito ligado ao Psol.
De nada adiantou, pois minutos depois, os mais de 500 estudantes presentes na assembléia, revoltados com a atual situação da universidade, desceram as rampas da UERJ cantando palavras de ordem e caminhando em direção à reitoria. No acesso à sala da direção, eles decidiram ocupar o local e ali permanecer até que suas reivindicações fossem atendidas.
O prefeito do campus, Ivanir Machado, e em seguida a sub-reitora de graduação, Lena Medeiros chegaram ao local para negociar com os estudantes. Demonstrando arrogância e desprezo, os diretores rapidamente foram enxotados pelos estudantes, que gritavam "daqui não saio, daqui ninguém me tira. Educação não é mercadoria" Para o dia seguinte foi marcada uma reunião com a vice-reitora Maria Cristina Maioli.
Para se organizar melhor os estudantes se dividiram em várias comissões. Eram elas: comunicação, estrutura, cultura, segurança e de negociação. Era obrigatória a participação de todos.
Eduardo Andrade do Nascimento, 26 anos, estudante de pedagogia, disse que motivos não faltam para a ocupação.
— O maior problema da UERJ tem sido a falta de professores. Esse ano muita gente não conseguiu se matricular nas matérias porque não existem professores para ministrar as aulas. E esse problema está diretamente relacionado aos baixos salários pagos aos professores, o que está fazendo muitos deles desistirem de trabalhar aqui. Ou seja, a tendência, caso a greve não obtenha sucesso, é a situação piorar. Por isso apoiamos a greve. Além de tudo isso, a faculdade não tem dormitório para os estudantes. As bolsas assistenciais são completamente defasadas. Nós queríamos que elas tivessem um valor de, no mínimo, um salário, mas nossa principal reivindicação é que a UERJ se torne um espaço democrático para os estudantes, queremos paridade no conselho universitário, e voto universal — protesta o estudante.
Clareza e objetividade também não faltaram à carta feita pela comissão de comunicação da ocupação para realçar a posição dos estudantes e responder às mentiras do monopólio da imprensa.
"Os estudantes reivindicam o cumprimento da constituição do Estado, que prevê o repasse de 6% do orçamento líquido para a Universidade, o que nunca foi cumprido, a prestação de contas sobre as verbas para o restaurante universitário, o "bandejão", em todas as unidades, a construção do alojamento, a implantação do transporte intercampi da Universidade (Maracanã, São Gonçalo, Caxias, Friburgo, Resende e Cap), a reforma e repasse do Centro Cultural da UERJ (antigo prédio dos estudantes), e concurso para professores e funcionários técnico-administrativos.
…A atual reitoria, representada por Ricardo Vieiralves e Christina Maioli, ao invés de atender aos interesses dos estudantes, toma uma posição covarde, de não negociar, e atende aos interesses do governador, que no início de sua gestão chamou a UERJ de ‘jóia da coroa’, e agora a trata como o tronco do escravo."
Consolidada a ocupação, os estudantes realizaram uma nova assembléia, decidindo pela ampla maioria que, dentro da ocupação, as pessoas ligadas a qualquer partido eleitoreiro não poderiam usar adesivos ou bandeiras de candidatos. Eles foram obrigados a retirar os adesivos que usavam no exato momento em que a decisão foi tomada.
Na segunda-feira, dia 15, a ocupação recebeu a visita ilustre do cartunista Latuff, que presenteou os estudantes com bonitos desenhos. Nas paredes, diversos murais com imagens selecionadas a dedo, desenhos, recorte de jornais e etc. O ambiente era sempre limpo e a comida distribuída coletivamente. A comissão de estrutura, acompanhada de um agente de segurança da UERJ, inventariou todas as máquinas e móveis da reitoria.
No domingo (21), o fornecimento de energia elétrica foi interrompido e logo os oportunistas se manifestaram no sentido de aterrorizar os estudantes com a mentira de que o fato era o anúncio de uma suposta invasão policial. Mesmo assim, todos resistiram sem medo e às escuras por três dias, quando a luz foi religada.
Não satisfeitos, os mesmos pelegos, membros da comissão de negociação, em assembléia realizada na segunda-feira (29), comunicaram — sem nenhum tipo de discussão prévia — que a reitoria havia feito uma carta de acordo e que todos seriam obrigados a aceitar.
A estudante de pedagogia Bárbara Gonçalves, disse que os oportunistas desprezaram o movimento de ocupação, erguido de maneira brilhante pelos estudantes.
— O tempo todo a comissão de negociação passou por cima da assembléia. E o pessoal independente percebia que eles sempre cediam às exigências da reitoria. Dessa vez, a reitoria propôs um documento de acordo e disse que ou nós aceitamos essa minuta, ou amanhã eles não negociariam mais. Os oportunistas já chegaram à assembléia com o acordo fechado e levaram um rebanho de pessoas de fora da UERJ para aprovar. As assembléias estavam dando média de 60 pessoas. Essa última teve 100 pessoas. Foi um verdadeiro rodo nos estudantes que estavam integralmente comprometidos com a ocupação, desde o primeiro dia — relatou a estudante.
Mesmo assim, o resultado da assembléia foi apertado, com 41 votos a favor da desocupação e 35 contra e com seis abstenções, ficou decidido que os estudantes teriam que sair da reitoria. Alguns, percebendo que estavam sendo ludibriados pelo discurso burocrático dos oportunistas, decidiram não acatar a decisão da assembléia e permanecer na reitoria.
Uma estudante chegou a dizer em alto e bom som que "o que os oportunistas querem é acabar com a ocupação para verem-se livres para panfletar santinhos de candidatos na praça Saens Peña".
E assim acabou a ocupação da reitoria da UERJ, revelando o potencial de organização e de mobilização dos estudantes e escancarando a forma burocrática e maliciosa com que os oportunistas diluem as lutas populares; tarefa cada vez mais difícil, frente ao iminente desenvolvimento das massas rumo a Revolução.