UNASUL, OEA e CAN: crônica da frustrada integração latino-americana

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UNASUL, OEA e CAN: crônica da frustrada integração latino-americana

A iminente instalação de 7 bases militares ianques ao longo do território colombiano, a consolidação do golpista Roberto Micheletti no governo hondurenho, as atuais relações internacionais tensas entre os governos da Venezuela, Colômbia, Chile, Equador, Peru e Bolívia, diante do olhar impotente e inútil da União das Nações da América do Sul (UNASUL), da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Comunidade Andina das Nações (CAN), demonstram com exemplos atuais que as tentativas de consolidar acordos de integração regional entre os países latino-americanos são um absoluto fracasso.

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Estes fatos nos levam a perguntar, por que falham as tentativas de integração latino-americana? Sem dúvida, a resposta pode nos induzir a concentrar numa longa lista de fatores que merecem um trabalho exaustivo e de maior alcance que este pequeno artigo. Não obstante, queremos nos concentrar em alguns pontos que estão interligados, para tentar dar respostas preliminares a esta problemática que tem uma longa trama estruturada no processo histórico latino-americano, porém preserva uma grande importância para a compreensão da conjuntura político e econômico atual da região, que aqui exporemos momentaneamente.

Um primeiro ponto é que os fatos demonstram que os processos da integração regional na América Latina, não vão além de uma soma simples de Estados mal-sucedidos, países com economias fracas, nos quais se desenvolve um capitalismo burocrático, com características particulares em cada país. Uma simples reunião numérica dos países que nunca concluíram o salto qualitativo na conformação de uma linha eficaz de coordenação entre Estados, que inspire um forte respaldo pelos cidadãos latino-americanos.

A interferência do imperialismo, em especial da superpotência imperialista do USA nas decisões individuais ou coletivas destes países, viria a ser um segundo ponto, que também permite explicar as falhas constantes nas tentativas da integração regional.

A debilidade ideológica que estes processos costumam ter como base, com uma referência constante aos supostos sonhos de Bolívar, Martí, Sandino ou Haya de la Torre, não passam de uma evidente demagogia que acaba não sendo explicada, muito menos compreendida.

Como o quarto e último ponto que trataremos aqui, está o caráter repressivo e funcional aos interesses geopolíticos e econômicos do imperialismo, de como geralmente são selados estes acordos de integração regional.

Integração regional ou capitalismo burocrático?

As ameaças de integrações regionais, expressadas no Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), no Mercado Comum da América Central, na Comunidade do Caribe, no Pacto Andino, a CAN, a flamejante — embora agonizante — UNASUL e inclusive a OEA têm sido somente uma série de frustrações consecutivas, um após a outra.

Estes Estados não conseguem constituir mecanismos de integração similares àqueles consolidados pelos países do Norte, nucleados na União Européia, porque no caso latino-americano, trata-se de acordos entre os países que em maior ou menor escala são dominados pelo imperialismo, caracterizados pela inviabilidade permanente de seus processos nacionais.

Em se tratando da falta de autonomia e de independência econômica destes Estados, eles não contam com infra-estrutura industrial para processar suas matérias-primas, ou, quando a tem, ela existe somente para exibir a franquia de transnacionais, que se dedicam a tais atividades industriais. Na maior parte das vezes, trata-se de Estados dedicados a atividades mono-exportadoras de matérias-primas e extrativas, das quais derivam a exploração primária dos recursos naturais às mesmas companhias transnacionais.

Por outro lado, estes Estados não têm capacidade de auto-abastecer de alimentos a seus próprios habitantes, muito menos de planejar a dieta nutritiva de seus cidadãos, aquilo que os organismos multilaterais como a FAO[1], concordaram em chamar de segurança alimentar e soberania alimentar, pois são incapazes de manter uma produção que forneça de alimentos seus próprios mercados internos. Assim como são incapazes de definir quais são os alimentos que serão produzidos em cada país, porque a produção nutritiva, alimentícia, é definida pelos interesses das potências imperialistas, enquanto a atividade mono-produtora e mono-exportadora transforma estes países em verdadeiras repúblicas bananeiras.

Desta forma, estes países são regidos por potências imperialistas em aliança com latifundiários, bem como por burocratas com imprestáveis poses nacionalistas. Neste caso, quando se reúnem, os representantes dos Estados de araque não tem capacidade para definir seriamente acordos de integração regional, isto porque estão à frente de Estados cujos líderes hipotecaram os destinos de seus países às potências imperialistas e monopólios transnacionais.

Essa falta de autoridade pode ser apreciada nas últimas reuniões da UNASUL, onde debaixo dos narizes de cada um destes Estados de araque, a Colômbia — Estado fantoche do império ianque garantiu já a presença de 7 bases militares do USA, com que será possível monitorar militarmente toda a região da América do Sul, dado o caráter geograficamente estratégico que tem o país. Nem o esperneio de Chávez, nem os ares de pseudo-neutralidade da diplomacia da maioria dos países da América do Sul pode parar esta situação, óbvio, descontando os cúmplices abertos da invasão ianque na América do Sul, como o genocida Alan García do Peru.

Ainda mais ridículo resultou a demagogia de toda a falsa diplomacia empregada pela OEA para restaurar o governo hondurenho a Manuel Zelaya, porque todas as missões realizadas pelo secretário geral da OEA, o chileno José Miguel Insulza, são uma enganação ao povo hondurenho, visto que o golpe de Micheletti demonstra a ausência de uma comunidade internacional que estivesse disposta a preservar de maneira eficaz as inúmeras vezes cinicamente pontificada democracia surgida do sufrágio eleitoral.

Integração regional e o imperialismo

Em cada um desses espaços internacionais se respira um forte ar medíocre e falso, onde é notória a impossibilidade de construir uma união de países da América Latina com determinado grau de influência ou coercitividade sobre os países membros, porque nenhum destes Estados definem os próprios destinos de seus países. Por isso se revelam cínicas as afirmações de Álvaro Uribe da Colômbia e Roberto Micheletti de Honduras, gerentes entreguistas do imperialismo ianque, que apelam com cinismo absoluto ao discurso da soberania para cercear uma força interventora da OEA e da UNASUL.

Um dado necessário de anotar é que enganações soberanas de Uribe e de Micheletti às vezes são desnecessárias, diante da proibição de intervenção auto-imposta por alguns gerentes destes países, que se definem por abraçar a política de fazer vista grossa perante as tremendas agressões imperialistas ianques, seja frente a iminente entrada das tropas do USA em território colombiano ou mantendo um silêncio inaudito diante da permissividade do governo peruano para o abastecimento da IV Frota do USA nos portos de Callao e de Salaverry.

Debilidade ideológica

A construção ideológica destes processos de integração latino-americana se baseia somente na retórica de figuras que em algum momento da história levantaram a integração latino-americana ou a defesa diante a agressão imperialista ianque, como Martí, Sandino ou Bolívar, apenas na teoria, para reforçar projetos dos militaristas e não para responder as legítimas aspirações emancipatórias do povo latino-americano, respondendo somente a um projeto personalista como o de Hugo Chávez na Venezuela.

De fato, personagens como Chávez podem manter a confusões ideológicas, que mais do que uma compreensão profunda do processo histórico da América Latina são uma pretensão individualista de se perpetuar na gerência de seu país, assim como Evo Morales, que, monitorado por seu mentor ideológico Álvaro García Linera, prefere levantar a bandeira étnica a problemas de classe, assim como encobre com o problema racional a essência da contradição entre nações oprimidas e pilhagem imperialista.

É ilusão esperar que Estados postiços ou falidos, onde se desenvolve um capitalismo burocrático, tenham a capacidade de se comportar de acordo com o ideal kantiano da formação racional de uma comunidade de nações que projetam suas ações para um quimérico imperativo categórico.

São essas as razões pelas quais uma das maiores tentativas de integração regional sem a presença do USA, como é o UNASUL, com apenas um ano da existência, já permite observar que é uma organização inútil, destinada a morte. Uma maneira de transformar-se numa organização que sirva somente para agarrar os movimentos táticos e estratégicos da geopolítica ianque.

A Aliança Bolivariana para os povos de Nossa América (ALBA) permanece como uma voz camufladamente contestatória, já que é apenas um mecanismo de negociação do atual gerente venezuelano nos mercados internacionais, instrumento inofensivo para o imperialismo, que já se deu ao luxo de gerar um golpe a um de seus aliados — Honduras, dentro da nova doutrina Obama, que estranhamente é defendida agora com veemência por Fidel Castro[2].

Acordos da integração regional e repressão

Podemos estar seguros de que estes acordos de integração regional serviram unicamente para chegar à definição de medidas de repressão violenta contra os povos latino-americanos ou para consagrar acordos entreguistas e vendepátrias a favor das potências imperialistas ou transnacionais.

Contudo, recordemos a OEA em sua história negra, quando manteve silêncio, cúmplice na invasão de Granada em 1983, ou prosseguindo com uma fraca reação perante as invasões do Panamá em 1989, igualmente como faz agora frente ao golpe de Estado de Micheletti em Honduras, assim como consagrou golpes de Estado como do ano 2002 na Venezuela que durou apenas 3 dias.

Hoje em dia, quando é tratada a instalação de 7 bases militares no território colombiano, dentro da estrutura de uma falsa democracia, tanto a UNASUL como a OEA preferem manter uma atitude ambígua e ambivalente, mas ao fim e ao cabo permissiva, exceto algumas reclamações inofensivas como as de Morales e de Chávez. É evidente que todos os acordos para garantir a paz, a segurança e a estabilidade da região apontam para impedir que revoluções democráticas de novo tipo triunfem em qualquer um dos países da América Latina, que é a única razão de ser destas falsas comunidades das nações.

Então, na obtusa visão destes gerentes de Estados títeres, a presença militar ianque não é um perigo para os interesses latino-americanos. Nesta época, quase todos mantêm a compostura e não gritam aos quatro ventos sua inclinação para interesses imperialistas como antes, salvo raras exceções, como Alvaro Uribe, Felipe Calderón e Alan García que hoje assumem o papel mais vil da reação latino-americana, embora no fundo não se diferenciem muito uns dos outros, porque todos são cortados pela mesma tesoura.

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[1] Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, FAO, por suas siglas em inglês.

[2] Vide o artigo "Fidel: Derecha racista buscar 'sacar del juego' a Obama" em: www.telesurtv.net/noticias/afondo/especiales/reflexiones-fidel/nota.php?ckl=56462&cc=

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