UPP: Toque de recolher ameaça comerciantes

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UPP: Toque de recolher ameaça comerciantes

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Com informações da Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência
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PMs da UPP do morro do Cantagalo reprimem festa de aniversário em plena
noite de sábado, às 22h

No dia 25 de maio, a reportagem de AND foi aos morros do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho, na zona Sul do Rio de Janeiro, atendendo ao chamado de moradores e comerciantes, apreensivos com o anúncio de uma operação da Secretaria de Ordem Pública nas favelas. Segundo a líder comunitária Deize Carvalho, a operação choque de ordem teria sido solicitada pela Unidade de Polícia Pacificadora que existe no local e tem o objetivo de reprimir comerciantes e impor um toque de recolher às 22h. A ação não aconteceu, mas os moradores seguem em vigília para resistir, caso a prefeitura vá às favelas.

— Os moradores de Copacabana e Ipanema fizeram reclamações na prefeitura dizendo que o barulho da comunidade está importunando eles. Eles solicitaram uma providência e a prefeitura anunciou um choque de ordem no Cantagalo e no Pavão-Pavãozinho. Eles vieram aqui e disseram que essa noite, ou senão outro dia, eles viriam de surpresa para fechar os bares. Por isso nós estamos aqui nessa apreensão, esperando eles chegarem a qualquer momento. O grande problema é que a determinação deles é que os bares fechem à meia-noite. Eles não querem só que se respeite a lei do silêncio. Isso é um absurdo. Porque eles também não fecham os bares de Ipanema? A lei é de um jeito para o pobre e de outro para o rico — protesta Deize.

Ela disse ainda que as opções de lazer fora da favela são inacessíveis aos pobres. Segundo Deize, além disso, a maioria dos moradores se sente mais a vontade dentro da favela na companhia de amigos e vizinhos. 

— O morador de favela trabalha a semana inteira, às vezes de segunda a sábado. Chega no fim de semana, a pessoa tem que ter direito a um lazer. Quem vive aqui não tem dinheiro para ir em um bar no asfalto. As coisas são muito caras e a pessoa ainda gasta com transporte. Por isso nós ficamos dentro da comunidade, com nossos vizinhos, batendo papo, contando como foi a semana. É um costume dentro de qualquer favela. As pessoas são muito amigas, convivem muito próximas, sempre precisam de ajuda umas das outras. Nós gostamos de nos divertir também. A vida do povo é muito dura para ainda sermos privados do nosso lazer por reclamação de quem nem mora aqui. Pergunta para os vizinhos daqui se eles estão incomodados — reclama Deize.

— E mesmo sem choque de ordem, os comerciantes já estão sendo reprimidos. Vira e mexe, os policiais da UPP entram nos bares e, por mais baixo que esteja o som, eles mandam desligar. E coitado do comerciante que bater boca. Apanha, é humilhado. Eles tocam o terror — conta.

No dia 17 de maio, o Ministério Público foi aos morros Pavão-Pavãozinho e Cantagalo ouvir os relatos de moradores revoltados com a onda de agressões, torturas e intimidações de PMs da UPP contra a população. Na ocasião, o subprocurador-geral de justiça de direitos humanos e terceiro setor do Rio de Janeiro, Leonardo Chaves, ouviu atentamente às denúncias de várias pessoas e prometeu tomar providências para que a população seja tratada com respeito.

— Essa visita do doutor Leonardo Chaves aconteceu por causa da truculência dos policiais da UPP, da maneira como eles abordam as pessoas, andam sempre de arma na mão, hostilizam as pessoas de idade, eles não respeitam ninguém. Depois da vinda dele aqui, melhorou. Pouco, mas melhorou. A gente espera que permaneça assim, só que essa calmaria sempre é provisória. Quando o capitão Nogueira saiu do comando daqui por conta do mesmo problema, nós tivemos um período calmo, mas depois os abusos voltaram a acontecer com frequência. Queremos saber quando isso vai acabar de uma vez. Custa alguma coisa tratar o povo com dignidade? Eu fico revoltada, porque moro há 41 anos aqui e desde então sou tratada com preconceito porque sou pobre — conta Deize, que teve o filho espancado até a morte por agentes do Degase dentro de um presídio para menores de 18 anos, em 2006.

No dia 10 de julho será realizada no fórum do Rio de Janeiro a audiência de instrução e julgamento de outro filho de Deize, um estudante de 15 anos. Como noticiou AND n° 89, o jovem foi preso por desobediência e desacato à autoridade por policiais da UPP do Pavão-Pavãozinho/Cantagalo. Alvo das mesmas acusações, a filha de Deize, Lorraine Carvalho, de 19 anos, também terá que comparecer a audiência no dia 24 do mesmo mês. Não é de hoje que Deize e sua família são alvo de perseguição de PMs da UPP. Mesmo assim, a líder comunitária não abandonou sua corajosa luta contra os desmando da polícia nos morros do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho.

Já no dia 16 de julho acontecerá a audiência de instrução e julgamento dos policiais militares acusados do assassinato do jovem André de Lima Cardoso Ferreira em 12 de junho de 2011 no Pavão-Pavãozinho. O assassinato de André foi a primeira execução sumária registrado nas favelas do Rio de Janeiro militarizadas pelo Estado reacionário.

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