MG: A resistência camponesa em Januária contra a monocultura de eucalipto

MG: A resistência camponesa em Januária contra a monocultura de eucalipto

Plenária realizada pelos habitantes da região. Foto: Reprodução

Entre os dias 18 e 20 de outubro de 2019, ocorreu, no distrito de São Joaquim, município de Januária, Norte de Minas Gerais, o II Encontro das Comunidades Veredeiras do Norte de Minas Gerais [1], realizado pela Associação Central das Comunidades Veredeiras, evento que contou com o apoio da Articulação Rosalino e do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (CAA). Cerca de 250 pessoas representando dezenas de comunidades camponesas e remanescentes de quilombolas, entidades sindicais, movimentos populares, intelectuais, estudantes, professores e pesquisadores de diferentes cidades da região como Manga, Matias Cardoso, Itacarambi, Pedras de Maria da Cruz, Grão Mogol, Porteirinha, Riacho dos Machados, Bonito de Minas e o povo indígena Xacriabá de São João das Missões estiveram presentes no evento.

O centro das atividades – que se deram, principalmente, por meio de plenárias, grupos de discussão e riquíssimas atividades artísticas – foi o debate acerca da luta pela defesa da posse de suas terras e pelos direitos elementares das comunidades camponesas que habitam o distrito de São Joaquim e localidades próximas. Localizadas a mais de 100 quilômetros da sede do município de Januária, tais povoados são historicamente acossadas pelo latifúndio na região, particularmente pelos monopólios voltados ao plantio latifundista homogêneo de eucalipto, há décadas responsáveis por crimes como grilagens de terras públicas e graves danos ao meio natural.

Veredas na região de Januária. Foto: Reprodução

A disposição de luta demonstrada pelos camponeses durante o Encontro remonta a sua forte tradição de resistência, em décadas de luta contra o latifúndio de velho e novo tipos. Na década de 1980, os posseiros e pequenos proprietários desta região foram violentamente ameaçados, tiveram os seus direitos violados e foram expulsos de suas terras [i]. Para implantar a monocultura do eucalipto, dois monopólios do setor siderúrgico florestal a PLANTAR E A METALUR (hoje RIMA) [ii] grilaram áreas de mais de 20 mil alqueires de cerrados e veredas [iii] (aproximadamente 100.000 hectares), terras ricas em nascentes, córregos e lagoas que formam importantes rios da região como os córregos do Alegre e do Pindaibal que alimentam o rio Pandeiros e os córregos Capoeirão, Capivara e Gentio que formam o rio Pardo, dois rios que são importantes afluentes do São Francisco.

Tais comunidades camponesas lutam ainda por direitos historicamente negados pelo velho Estado, desde sempre controlado pelas poderosas oligarquias latifundistas da região de Januária (importante centro histórico da organização econômica, política e militar do latifúndio). Dentre os direitos historicamente negados a tais comunidades estão o acesso à água, as péssimas condições das estradas e a quase inexistência de políticas voltadas à assistência técnica, créditos e incentivo à produção e ao escoamento de seus produtos. Tais comunidades rurais denunciam ainda que, apesar de estarem próximos às margens do Rio Pandeiros e seus afluentes, um dos maiores mananciais d’água e de concentração de biodiversidade em todo o Norte de Minas – conhecido como “Pantanal de Minas Gerais” – enfrentam enormes dificuldades para ter acesso à água. Esses camponeses ainda são permanentemente perseguidos por órgãos ambientais como o IEF – Instituto Estadual de Florestas, IBAMA –  Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis e o ICMBIO – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, que criminalizam formas de produção tradicionais de tais comunidades, estritamente relacionadas ao extrativismo de plantas e frutas silvestres, a pesca nas lagoas, a caça e ao plantio nas vazante de rios, imprescindíveis à sobrevivência de tais comunidades rurais e a manutenção de seus costumes, tradições e religiosidade.

Rio Pandeiros, no Norte de Minas. Foto: Reprodução     

Há décadas tais comunidades lutam pela regularização de suas terras; pela devolução das terras griladas para o plantio de eucalipto por empresas como a PLANTAR E A METALUR (hoje RIMA) e exigem a restauração e recuperação das veredas e chapadas. Em breve, publicaremos mais notícias, artigos e entrevistas relacionados ao processo histórico de expulsão das comunidades camponesas, o incremento da concentração fundiária e a aguerrida resistência camponesa na microrregião de Januária, localizada no ponto de confluência entre o Alto Médio e o Médio São Francisco [iv].    


Notas

[1] https://www.facebook.com/articulacaorosalino/

[i] https://conflitosambientaismg.lcc.ufmg.br/noticias/comunidades-tradicionais-dos-gerais-e-de-veredas-do-distrito-de-sao-joaquim-municipio-de-januaria-norte-de-minas-retomam-seu-territorio-tradicional/ 

[ii] http://www.rima.com.br/htmls/inst_historia.php 

[iii] A vereda é um importante ecossistema ribeirinho do bioma Cerrado. Considerada como área de terras úmidas, possui uma grande importância socioambiental na região norte de Minas Gerais. Esta importância deve-se ao fato de que a região apresenta déficit hídrico na maioria dos meses do ano. As veredas são em muitos casos as únicas fontes de água para a maioria das comunidades rurais durante os meses de estiagem. Fonte: ALENCAR-SILVA, Thiago; MAILLARD, Philippe. Delimitação, caracterização e tipologia das veredas do Parque Estadual Veredas do Peruaçu. Revista Geografias, 2011, 24-39. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/geografias/article/view/13317 

[iv] A grande dimensão territorial da bacia do rio São Francisco, estimada em 639.217 km², motivou a sua divisão por regiões, para fins de planejamento e para facilitar a localização das suas muitas e diversas populações e ambiências naturais. A divisão se fez de acordo com o sentido do curso do rio e com a variação de altitudes. Assim, a sua parte inicial, tomando como referência a área montanhosa onde o rio nasce, na Serra da Canastra, a 1280 m de altitude, ganhou a denominação de Alto São Francisco. Estendendo-se até a cidade de Pirapora, no centro-norte de Minas Gerais, a região perfaz uma área de 111.804 km².Escoando no sentido sul-norte, no trecho seguinte o rio atravessa todo o oeste da Bahia, até o ponto onde se formou o lago represado de Sobradinho, no município de Remanso. Nessa região, a bacia é denominada Médio São Francisco. É a maior da quatro divisões, alcançando 339.763 km2.

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