Centenas de Manifestantes se reúnem em manifestação contra governo golpista. Foto: Taba Benedicto/Estadão
Manifestações em repúdio ao governo do fascista Bolsonaro e do Alto Comando das Forças Armadas tomaram as ruas de várias capitais do país reunindo centenas de pessoas no último domingo, 31 de maio. Os protestos espontâneos, convocados em sua maioria por torcidas organizadas de futebol, ocorrem após semanas seguidas de provocações de grupelhos de extrema-direita que, seguindo os acenos do chefe do Palácio do Planalto, têm se reunido para pedir “intervenção militar com Bolsonaro no poder”.
As torcidas organizadas de diferentes agremiações, muitas delas adversárias, uniram-se contra o avanço do golpe militar, dando mostras de que a solidariedade de classe fala mais do que a rivalidade.
Faixas, cartazes e palavras de ordem repudiaram os ataques contrarrevolucionários aos direitos do povo, encabeçados principalmente por Bolsonaro como presidente, e exigiam a queda do governo de Bolsonaro e dos generais que o sustentam.
Vídeos e relatos mostraram a clara conivência das polícias com os grupelhos pró-Bolsonaro durante os protestos, o que não impediu que as manifestações antifascistas se impusessem contra os grupelhos golpistas. Foram registrados confrontos em várias cidades.
Manifestantes resistem contra repressão da PM em São Paulo durante ato em repúdio a Bolsonaro. Foto: Reuters
Protestos repudiam projeto golpista de Bolsonaro/generais
Em São Paulo, a grande manifestação foi convocada por diversas torcidas organizadas de diferentes times de futebol, dentre elas a Gaviões da Fiel, do Corinthians, além de torcidas do Santos, São Paulo e Palmeiras.
O ato foi contundente. A massa de manifestantes marchou com ímpeto para enfrentar os grupelhos fascistas e golpistas em geral. Às centenas, de punhos erguidos, eles tomaram a avenida Paulista, centro da capital, no sentido do bairro da Consolação. Palavras de ordem antifascistas e de denúncia contra o governo golpista encabeçado por Bolsonaro foram entoadas, dentre elas: Doutor, eu não me engano, o Bolsonaro é miliciano! e outras mais, defendendo os direitos democráticos.
No mesmo local estava programada uma reunião de golpistas bolsonaristas que, em menor número, exibiram bandeiras, dentre as quais uma do Estados Unidos (USA) e também outras de grupos neonazistas ucranianos.
Segundo relatos de canais militares, um grupelho liderado pelo Major do Exército, Costa e Silva, ex-candidato ao governo do estado, chegou a ser encurralado pela expressiva manifestação contra o golpismo.
O grupo bolsonarista foi escoltado e protegido pela Polícia Militar (PM) que, inclusive, fez proteção pessoal a uma apoiadora de Bolsonaro que ameaçou torcedores com um taco de beisebol, sem sequer ser autuada.
Apoiadora de Bolsonaro ameaça torcedor com bastão e é retirada sem ser autuada, em São Paulo. Foto: Banco de dados AND
Durante a marcha, a PM atacou a manifestação com bombas de gás e de efeito moral no ponto próximo ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), ao que os manifestantes responderam atirando rojões, pedras, paus, latas e garrafas, além de erguer barricadas em chamas utilizando caçambas de lixo, objetos e grades, que bloquearam a avenida.
Também foram registrados enfrentamentos entre os manifestantes antifascistas e os bolsonaristas próximo à estação Trianon do Masp. Na confusão, um homem, que embrulhava-se numa bandeira neonazista ucraniana, foi esfaqueado. A bandeira que ele empunhava representa a organização paramilitar ucraniana “Setor Direito” (no original, Pravyy Sektor), que reivindica o “legado histórico” do Exército Insurgente Ucraniano que lutou ao lado de Hitler e dos fascistas na Segunda Guerra Mundial, especialmente contra a União Soviética.
No Rio de Janeiro a manifestação antifascista aconteceu em Copacabana, zona sul da cidade, região onde golpistas têm se reunido aos domingos para apoiar um golpe de Estado aberto dirigido por Bolsonaro.
Membros de torcidas organizadas do Flamengo, “Fla Antifa” e “Democracia Rubro-negra” reuniram dezenas de pessoas em repúdio à ofensiva dos golpistas. Faixas e cartazes estampavam palavras de ordem como: Bolsonaro genocida!, Militares assassinos, pátria racista! e Ditadura nunca acabou!
Durante a manifestação, um vídeo gravado pelo deputado Daniel Silveira/PSL, que participava da reunião pró-Bolsonaro, revelou a cumplicidade da polícia para com o grupo. Nas imagens, Daniel Silveira pede aos policiais militares que queimem uma das bandeiras das torcidas organizadas, ao que pôde-se ouvir a resposta do policial, chamado pelo deputado de “capitão”: “”Meus amigos tá ali (sic), já mandei eles ir lá queimar aquela bandeira ali (sic)”.
Torcedores em manifestação de repúdio ao governo golpista no Rio de Janeiro. Foto: Banco de dados AND
A PM chegou a fazer um cordão de isolamento para proteger os bolsonaristas e há relatos de que um dos torcedores teria sido detido arbitrariamente pelos policiais.
Ao final do protesto, a PM atacou os manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo, momento este em que podia-se ouvir dos prédios gritos de protesto contra o governo golpista.
Vídeos registrados nas redes sociais mostram manifestantes de torcidas respondendo às provocações de militantes de extrema-direita que, auxiliados pela polícia, foram obrigados a se retirar. Novas manifestações já foram convocadas por torcidas organizadas para o do 07/06.
Em Belo Horizonte, membros de torcidas organizadas do Atlético Mineiro, Cruzeiro e América Mineiro uniram-se em manifestações contra Bolsonaro e seu governo sustentado pelos generais, na praça da Bandeira, rechaçando um grupo de extrema-direita que se concentrou no local.
Em Porto Alegre, centenas de manifestantes se concentraram no centro para protestar contra os atos da extrema-direita, dia 31/05. Uma semana antes (24/05), outra manifestação convocada por organizações antifascistas já havia impedido que uma carreata em apoio ao golpe bolsonarista cruzasse a rua Bento Martins, no centro da cidade.
Desta vez, o grupo pró-Bolsonaro que reuniu poucas dezenas de pessoas, não passando de 50, encerrou a manifestação com 20 minutos de antecedência, sob a proteção da Brigada Militar, seguindo em direção à localidade conhecida como Parcão, onde armou tendas, criando um “Acampamento Jair Bolsonaro”.
Durante a dispersão, um bolsonarista que ameaçou torcedores afirmando ser militar e estar armado foi derrubado após levar uma rasteira e acabou fugindo ao ser confrontado pelos antifascistas.
A retirada forçada do grupelho pró-fascista foi comemorada aos sons de bumbo com uma marcha pelas ruas da cidade. Em alguns prédios, simpatizantes saíram às janelas para aplaudir e bater panelas em apoio à manifestação.
Grupo de extrema-direita é repudiado nas ruas de Porto Alegre por manifestação antifascista. Foto:Jefferson Botega/Agencia RBS
Um governo golpista que atenta contra os direitos democráticos
Como analisa o AND, desde 2014 o Brasil vive um golpe de Estado militar contrarrevolucionário desatado para prevenir um novo levante de massas, após os círculos dominantes no aparelho de Estado (especialmente o Alto Comando militar) verem um “perigo de Revolução” diante dos Levantes Populares de 2013-14 e da grave crise econômica pela qual passava (e ainda passa) o país.
O Alto Comando militar desatou e coordenou todo processo de ofensiva contrarrevolucionária, como golpe militar, a princípio desatado como Operação “Lava Jato”, isto é, como operação policial com cobertura e apoio dos generais para “moralizar” as instituições, aplacar o sentimento de descrédito popular para elas e centralizar mais Poder político no Executivo, de modo a aplicar as medidas econômicas para maior exploração das massas com o mínimo de “legitimidade”. Ao mesmo tempo e além disso, tal ofensiva contrarrevolucionária, através de coações, chantagens e ameaças veladas de intervenção militar, também impulsionava a militarização da sociedade cada vez maior e novas leis penais para reprimir criminalmente os levantes e novas rebeliões de massas.
Durante todo o processo, até as eleições de 2018, o Alto Comando manteve-se à escondida para não levantar uma ampla frente de resistência e de repúdio aos militares, por ter sido traumático o golpe de 1964 e as décadas de regime correspondente.
Com a eleição de Bolsonaro numa eleição tutelada e conduzida indiretamente por pronunciamento dos chefes militares, especialmente do então comandante do Exército Villas-Boas, os generais compuseram com ele, porém com diferenças. O primeiro, com o plano de desatar um golpe de Estado aberto e dissolver completamente o regime de velha democracia, substituindo pelo fascismo aberto, enquanto os altos mandos militares propugnam, de preferência, um regime com cara de democracia, porém com restrição de direitos democráticos e maior centralização de Poder, de modo que o parlamento e o judiciário sejam assessorias do governo, preferencialmente civil, porém subordinado aos ditames dos generais. Os generais estão dispostos a instalar um regime abertamente fascista apenas numa circunstância extrema. Dentro do governo golpista, há, portanto, disputa sobre qual caminho seguir.
Por isso, setores dos movimentos populares e revolucionários pontuam a necessidade de apontar tanto contra o fascista Bolsonaro e sua extrema-direita, como também contra os altos chefes militares, no governo e fora dele, assim como seus asseclas. Ambas as forças políticas, brigando entre si, convergem no projeto de concluir o golpe de Estado, porém divergem na forma de fazê-lo.
Pontuam ainda que a única democracia possível é a nova democracia, após destruir o capitalismo burocrático (semifeudal e serviçal do imperialismo) com a Revolução Democrática, Agrária e Anti-imperialista. Já o regime “democrático”, a velha democracia que o país experimenta hoje, não é democracia de fato, pois assenta-se na negação frequente dos direitos democráticos fundamentais para as amplas massas populares, especialmente das favelas e do campo – restrição que tende a ser cada vez maior, para compensar a crise do capitalismo burocrático que se torna, por sua vez, mais profunda a cada dia.