Protesto contra mineração em Moatize em 2018. Foto: DW
Centenas de trabalhadores da cidade de Moatize, província de Tete, centro de Moçambique, estão em greve e têm protestado há mais de duas semanas contra a mineradora Vale. O protesto rechaça a venda, amparada pelo velho Estado moçambicano, dos ativos da empresa brasileira para a empresa indiana Vulcan Resources. Largados ao acaso após o processo, os trabalhadores exigem esclarecimento sobre a venda da empresa e sua situação trabalhista.
A mina de carvão, que pertencia à Vale desde 2007, teve suas operações iniciadas em 2011. No final de abril de 2022, em uma negociação que contou com participação e aval do governo moçambicano, a mineradora vendeu a mina de Moatize por 270 milhões de dólares à empresa indiana Vulcan Resources, que faz parte do conglomerado Jindal Group e já opera minerações na província de Tete.
Trabalhadores demandam explicação
Não avisados e isolados de todo o processo de negociação, os trabalhadores da mina até então controlada pela Vale demandam explicações sobre a venda e sobre sua situação trabalhista com a nova empresa. Os trabalhadores denunciam que não conheceram ninguém da empresa indiana, assim como não conhecem as novas exigências e condições trabalhistas que serão inseridos, se é que todos serão inseridos.
Os trabalhadores em luta condenam, ainda, o silêncio do governo oportunista de Filipe Nyusi, presidente desde 2015 pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), que apesar de ter participado das negociações, nada disse aos trabalhadores. A Frelimo é a organização que levou a cabo a guerra de independência de Moçambique do jugo do colonialismo português, alcançando êxito em junho de 1975. Formada como uma frente de classes revolucionárias (proletariado, campesinato, pequena burguesia urbana e médios proprietários rurais e urbanos, a burguesia genuinamente nacional, e até mesmo setores latifundiários e de grandes burgueses) que aglutinava-se em torno do nacionalismo revolucionário, foi fortemente influenciada pelo marxismo e pela revolução russa e chinesa e iniciou a luta armada em 1965. Porém, dada a ausência da direção proletária, pela inexistência de um partido revolucionário do proletariado, foi conduzida de um regime de democracia popular a um regime burocrático-latifundiário, assentado sobre uma economia de capitalismo burocrático, após a morte de Samora Machel, unindo-se à toda histeria anticomunista com o fim da União Soviética social-imperialista.
Operários denunciam a Vale
Eles também denunciam o abandono cabal dos mineradores pela Vale, uma vez que a empresa brasileira não encerrou os contratos e, como consequência, não cumpriu com nenhuma exigência deste encerramento. Em fúria contra a situação, um representante trabalhista afirmou ao monopólio de imprensa DW, em condição de anonimato: “E mesmo a empresa Vale, que é dona desta mina, nunca nos despediu, nunca veio dizer nada com relação a esta venda. Então, nós como trabalhadores, achamos que não é correto. Parece que querem nos vender como venderam as máquinas, a terra e como venderam o carvão. Nós não somos carvão”.
Contra os ataques, os trabalhadores declararam greve nas operações da mina desde o dia 09 de maio e protestam diariamente na busca por uma participação na negociação. “O problema é que ninguém veio negociar nada conosco e nós estamos no direito de negociar se queremos ou não ficar com o novo patronato, e não sermos obrigados a fazer algo que não queremos”, afirmou um trabalhador ao monopólio de imprensa VOA Português.
Apesar do pronunciamento da Vulcan Resources de que busca iniciar contato com os trabalhadores e continuar a exploração de carvão em Moatize, os mineiros continuam em luta contra o abandono e incerteza das condições trabalhistas.
Vale promoveu terror contra camponeses
Desde 2009, ano em que a empresa assassina Vale já fazia os preparativos para iniciar a mineração em Moatize, a mineradora promove uma total destruição das condições de vida dos camponeses da região. Segundo uma matéria da revista Outras Palavras, a Vale retirou mais de três mil famílias de camponeses de suas terras originais e reassentou-as em regiões com solos pobres, falta de acesso a rios e mercados e com graves problemas de infraestrutura, como falta de saneamento básico, eletricidade e segurança nas estruturas das casas.
Além de expulsar os camponeses de suas terras, a Vale destruiu diversos rios da região, seja pela poluição, aterro ou redirecionamento dos rios para o funcionamento da mina. Os oleiros da região também foram vítimas da empresa, uma vez que além de perderem o acesso aos rios, passaram a viver sob constantes nuvens de poluição.
Como forma de conter as justas rebeliões populares contra os crimes cometidos pela empresa, a Vale, em conluio com o velho Estado moçambicano, reprimiu diversos protestos das massas da região. Somente no ano passado, as forças da Unidade de Intervenção Rápida (UIR) e da Polícia da República de Moçambique (PRM) conduziram detenções de manifestantes e reprimiram manifestações com o uso de emboscadas, gás lacrimogêneo e balas de borracha. Vasco, um trabalhador da comunidade Primeiro de Maio, foi baleado dentro de sua casa por um policial da UIR após ser acusado de “agitador”.
Como resultado de suas atrocidades contra o povo, a Vale S.A. foi sentenciada em 2021 pela Justiça de Moçambique a pagar uma indenização de 14 milhões e 400 mil de meticais (moeda moçambicana) para 48 camponeses de Moatize (cerca de 1 milhão de reais). A Vale em Moçambique atua como intermediária, ou sócio menor, do capital financeiro imperialista. É uma empresa capitalista monopolista da fração compradora da grande burguesia brasileira, com vínculos diretos com o capital monopolista imperialista principalmente ianque.
Por sua vez, a Vale, já conhecida tanto pelos crimes contra os moradores das regiões em que atua, quanto por negligenciar suas dívidas com as massas (assim como faz no Brasil), busca transferir a culpa dos crimes para o governo reacionário por sua falta de fiscalização. Nesta disputa, o povo fica à deriva enquanto o velho Estado moçambicano e a terrorista Vale, aliados somente quando os interessa, se mostram, ambos, inimigos do povo.