Na madrugada de 22 de maio, o povo Guarani Kaiowá realizou uma retomada de território na fazenda Taquaperi, no município de Coronel Sapucaia, Mato Grosso do Sul (MS), fronteira com o Paraguai. No local, um dia antes, o jovem indígena Alex Ricarte Vasques Lopes, de 18 anos, foi assassinado pelo latifúndio, de acordo com as denúncias de lideranças indígenas. A ação evidencia que os povos indígenas não deixarão de responder aos crimes contra o povo.
Guarani Kaiowá retomam território em resposta a covarde assassinato de jovem guerreiro. Foto: Reprodução
O covarde assassinato do jovem guerreiro
Em 21/05, Alex Lopes junto a outros dois jovens indígenas da Tekoha Kurusu Amba deslocaram-se da Terra Indígena (TI) Taquaperi para coletar lenha devido às baixas temperaturas que assolavam o sul do MS. De acordo com o Comitê de apoio a luta dos povos indígenas (Calpi), “na coleta de madeira os indígenas foram surpreendidos com disparos de arma de fogo vindo da fazenda Taquaperi vitimando Alex que foi alvejado por pelo menos cinco tiros e veio a óbito na fazenda”.
Segundo relatos dos indígenas, o corpo do jovem foi abandonado em território paraguaio localizado a menos de 10 km dos limites da TI. Alex Lopes é o quarto membro da família a ser assassinado pelo latifúndio desde 2007 em Coronel Sapucaia.
O assassinato foi cometido enquanto acontecia a Aty Guasu, Grande Assembleia dos povos Guarani e Kaiowá, realizada entre os dias 17 e 21/05 na TI Guaimbé, reunião na qual estavam presentes diversas lideranças indígenas.
O retomada Jopara
Antes do raiar do dia seguinte ao assassinato, os Guarani Kaiowá organizaram uma grandiosa retomada do latifúndio onde ocorreu o crime. O local foi denominado Tekoha Jopara.
Durante a tarde do dia 22/05, após a retomada, o Departamento de Operações de Fronteira (DOF), agindo à serviço do latifúndio, iniciou um cerco policial bloqueando com viaturas a rodovia MS-286, via de acesso Tekoha Jopara, TI Taquapri e outros territórios indígenas.
Em 23/05, drones e viaturas circulavam no local e latifundiários se reuniam junto à barreira policial. Porém, a resistência dos indígenas seguia e o povo ainda permanecia acampado.
No mesmo dia, em carta emitida pela Grande Assembleia Kaiowá e Guarani da Aty Guasu, os indígenas se pronunciaram: “Alex não é um caso isolado e não podemos deixar que assim seja definido. A morte de Alex é mais um ataque contra nosso território e a vida de nosso povo. Não foi apenas uma família, a de Alex, que se levantou contra seu assassinato, mas sim toda uma comunidade. Isso não se daria caso a comunidade não tivesse em sua alma a noção de que lhes foi infringido um ataque coletivo, mais um de tantos. Não é mesmo?”. Os indígenas disseram ainda que para um Kaiowá como o jovem Alex, viver é lutar e exigiram justiça diante dos ataques e covardes assassinatos ocorridos.
Histórico da área
Atualmente na TI Taquaperi vivem cerca de 3,3 mil indígenas em uma área demarcada de 1,7 mil hectares. A TI, também denominada Reserva Indígena Taquaperi, está situada na região sul de MS, e tem seu território cortado pela rodovia MS-289 que dá acesso à Capitán Bado, cidade paraguaia. A reserva foi criada em 1928 pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) para confinar os povos e avançar com a chamada “colonização”, ou seja, roubo dos territórios indígenas. Desde sua criação, a área já sofreu redução de cerca de 30%.
A área de confinamento pouco comporta as necessidades dos povos que ali residem, assim os indígenas vem retomando seus territórios tradicionais invadidos e que hoje estão nas mãos do latifúndio.
A resistência dos povos indígenas se dá frente a inúmeros ataques promovidos pelo latifúndio que resultaram em ao menos quatro assassinatos no município. Em apenas dois anos, três lideranças do Tekoha Kurusu Amba foram assassinadas: Xurite Lopes, em 2007; Ortiz Lopes, em 2007; e Oswaldo Lopes, em 2009. De acordo com os indígenas, desde 2013 mais de 30 ataques contra os povos foram realizados por paramilitares na região.
Outro crime semelhante ao recente ataque, também denunciado pelos Guarani Kaiowá, foi o assassinato do jovem Denilson Barbosa, ocorrido em Caarapó em 2013, ação que impulsionou retomadas naquela ocasião. Os mandantes e executores deste crime até hoje seguem impunes.
Na carta emitida pela Aty Guasu, as lideranças afirmam que a “justiça” serve aos interesses do latifúndio. Evidenciando ainda o selo de classe do velho Estado, sustentado pelo latifúndio, os indígenas declararam que este é um “AgroEstado” e que a demarcação paralisada e ameaçada, os números de assassinatos e violações contra os povos e todas as manifestações públicas do latifúndio – inclusive criminosas e violentas – demonstram isso.
Chamado aos democratas
Em carta emitida pelo Calpi, sob as palavras de ordem Fim do cerco policial sobre o território de retomada Tekoha Jopara!, Punição imediata aos assassinos de Alex Lopes!, Abaixo o marco temporal! Avançar as retomadas! e Guerreiro Alex Lopes: Presente na luta!, o Comitê conclamando estudantes, professores e entidades democráticas, afirma que “as rebeliões indígenas em face do assassinato de seus irmãos e irmãs brada para que as massas se juntem aos Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul em apoio à luta pela retomada dos territórios tradicionais, avanço pela autodemarcação e o direito à autodeterminação, e a punição de seus carrascos”.
Jovem indígena Alex Ricarte Vasques Lopes, de 18 anos, foi assassinado pelo latifúndio no dia 21/05. Foto: Reprodução