A história, como ciência, nos fornece dados de como a humanidade ao longo do tempo se movimenta, e, principalmente, se transforma.

Caveira Zapatista, gravura de José Guadalupe Posada
A história não se repete apenas como farsa, como já disse Marx há tempos. Mas isso não significa que o passado esteja distante e inútil para entender o presente.
A história revolucionária no México nos traz bons exemplos de como se gestou e desenvolveu a crise do Estado Moderno na América Latina. A história da Revolução Mexicana, em resumo e no que nos interessa aqui, é mais ou menos assim:
Havia um ditador militar que administrou o país ao longo de 30 anos para as empresas estrangeiras. Garantiu a estabilidade, em parte através de sua figura paternal, e, na maioria das vezes, à base de muita repressão.
Quando chegou o século XX, Porfirio Díaz já fazia 30 anos no governo, com 80 anos e símbolo de uma era envelhecida, sem condições mais para gerenciar em favor dos negócios gringos e dos coronéis (terratenientes, no México).
Nesse ínterim surge uma figura com ares modernizantes, um latifundiário do norte, de discurso liberal. Seu nome era Francisco Madero. Esse latifundiário conquista apoio e se candidata a presidente.
Prevendo que perderia as eleições para Madero, o ditador manda prender seu oponente, frauda as eleições e consegue mais uma vez se reeleger. Madero foge para a fronteira gringa e redige um manifesto, em que convoca o povo mexicano às armas para derrubar a tirania. Como precisa do máximo apoio, inclui algumas demandas populares em seu programa, como distribuição de terras e direitos para os trabalhadores.
Inicialmente não há adesões, mas pouco tempo depois começam a brotar inúmeros grupos armados que atacam o exército federal, em uma onda rebelde crescente. A insurgência popular acaba forçando a renúncia de Porfirio Díaz, que foge para Paris. Madero é eleito presidente e entra triunfante na capital.
No plano de Madero a história acabaria aí, com pequenas reformas do corpo político, algumas regras mais liberais e o fim da reeleição presidencial, que perpetuou Díaz por 30 anos.
Mas, diferente do que imaginou Madero, o povo que se armou contra o ditador não pretendia se desarmar em nome de remendos na ordem social. Exigia mudanças sociais profundas, e não estava disposto a entregar as armas sem que o programa democrático fosse efetivamente aplicado.
Dentre os que não aceitaram depor as armas estava o lendário Emiliano Zapata, líder do movimento camponês do Sul, que exigia uma Revolução Agrária e terra para quem nela trabalha.
Madero também se enganou com os elementos porfiristas que permaneceram no Estado, particularmente no exército. Em 1913 sofreu um golpe e foi assassinado por forças conservadoras que anularam as pouquíssimas reformas conduzidas pelo seu breve governo.
A guerra civil continuou, forças progressistas e democráticas contra conservadores se enfrentaram, por vezes em grupos, uns contra os outros, sem identidade de classe clara, ao longo dos 10 anos seguintes, até que um governo, talvez o primeiro governo populista latino-americano, conseguisse derrotar as organizações populares e desarmá-las, alcançando gradativamente estabilidade política. Para alcançar essa estabilidade precisaram ceder diversas coisas, e desse processo nasceu a mais avançada constituição da época, a primeira a considerar a terra sob uma perspectiva social, a reconhecer as 8h de trabalho diário, liberdade de expressão e liberdades em geral, a separação da Igreja e do Estado, etc.
Embora o processo revolucionário mexicano seja de fundamental importância, as palavras que a história conferiu ao ditador Porfirio Díaz quando soube da convocação de Madero às armas são particularmente interessantes: “Madero está tirando o tigre da jaula, quero ver como vão colocar ele de volta”.
Sob diversos aspectos vivemos uma situação parecida. A briga entre os grupos de poder que controlam o Estado brasileiro por aumentar o seu quinhão, usam as demandas populares e os anseios democráticos da população, acreditando poder controlar a situação. Apenas descortinam cada vez mais o que de fato é o velho e podre Estado brasileiro: um balcão de negócios, um espaço para a rapinagem, para o saque e instrumento de repressão política e social contra os mais pobres e trabalhadores.
Eles, como Madero, não estão contando com o grande Tigre que está saindo da jaula. O povo brasileiro não vai mais aceitar, seja o governo que for, que suas reivindicações não sejam atendidas.
O Tigre já está esmigalhando os amestradores profissionais do PT. Depois que estiver fora da jaula, os próximos serão os palhaços e a própria lona que cobre o grande circo da palhaçada eleitoral.
Grandes tempos, tempos de Tigres soltos...