As forças policiais de Rondônia iniciaram o ano de 2021 perpetrando violações e intimidações contra camponeses nas terras da antiga Fazenda Santa Elina, em Corumbiara (RO).
No dia 2 de janeiro, cinco viaturas com 25 agentes da Polícia Militar, Polícia Ambiental e Força Nacional, fizeram abordagens intimidatórias em linhas e comércios da Área Zé Bentão e na entrada do Acampamento Manoel Ribeiro.
Segundo relatos de moradores, durante as batidas, os policiais perguntaram informações sobre o Acampamento Manoel Ribeiro, se alguém conhecia alguns dos dirigentes e se sabiam da existência de armas no local, revelando o flagrante propósito persecutório e de tentativa de criminalização do Acampamento e dos camponeses em luta pela terra.
Neste mesmo dia, um camponês foi arbitrariamente preso por trafegar com sua arma de caça numa estrada local.
Durante a tarde do dia 17/01, pistoleiros do latifúndio Nossa Senhora tentaram novamente intimidar camponeses do Acampamento. As famílias, por sua vez, seguem firmes, organizadas e decididas a lutar pelo direito a um pedaço de terra para viver e trabalhar, ainda mais neste momento de crise econômica e política que o Brasil enfrenta, em meio a um recorde de casos e mortes em decorrência da Covid-19.
Camponeses resistem a ataque covarde de policiais e pistoleiros a mando de latifundiários. Janeiro de 2021. Foto: Reprodução.
Camponeses registraram o momento da aproximação de pistoleiros ao Acampamento. Ao fundo da imagem pode-se ver o veículo transportando os “guaxebas” encapuzados. Acampados denunciaram, também, que pistoleiros encapuzados e fortemente armados têm circulado pela fazenda e se aproximado do Acampamento, usando várias caminhonetes, carros, motos e burros.
Em um dia inteiro de resistência, famílias do Acampamento Manoel Ribeiro defenderam-se com firmeza aos ataques da polícia e do latifúndio, em 18/01.
Segundo relato das famílias, na manhã do dia 18/01, dois homens do latifúndio Nossa Senhora, portando armas curtas na cintura, estando um deles encapuzado, se deslocaram em direção ao Acampamento em uma caminhonete (bandeirante branca) e se aproximaram de uma das porteiras da área ocupada.
Ao perceberem que os camponeses não se intimidaram, disseram que desejavam apenas conversar e que queriam que os trabalhadores desocupassem a área, alegando que precisavam retirar parte do gado do latifundiário.
Frente à intimidação, reunidos, os camponeses se mantiveram firmes e se recusaram a sair do local.
Na tarde do mesmo dia, por volta das 15 horas, as famílias avistaram sete viaturas policiais chegando à sede do latifúndio. Depois, junto com caminhonetes do fazendeiro, os policiais se dirigiram ao Acampamento Manoel Ribeiro com o objetivo de expulsar os camponeses da Fazenda Nossa Senhora.
Participaram do ataque viaturas da polícia militar e outras escuras camufladas, de tropa especial, mas que os camponeses não conseguiram identificar.
Cerca de 30 policiais portando escudos e em formação de ataque confrontaram as famílias acampadas em uma odiosa operação ilegal.
Respondendo ao avanço das forças de repressão que ameaçavam invadir parte da área ocupada, os camponeses ergueram barricadas em chamas e lançaram fogos de artifício.
A todo o momento os camponeses denunciavam o caráter criminoso da operação feita sem qualquer mandado, como se já não fosse absurda por sua própria natureza antipovo. Lutar não é crime!, Nem que a coisa engrossa, essa terra é nossa!, Se o camponês não planta, a cidade não almoça nem janta!, 1, 2, 3, 4, 5, mil, avança a Liga por todo o Brasil!, Pistoleiros do latifúndio!, Estas terras não tem documento. O fazendeiro grilou tudo!, Estas terras são da antiga Santa Elina! Estas terras são do povo!, bradavam os trabalhadores, em meio a canções de luta.
Em seguida, os policiais e as viaturas bloquearam a principal estrada que corta as Áreas Revolucionárias vizinhas e que dá acesso ao Acampamento. Foram identificados veículos do batalhão de choque da PM e da polícia ambiental.
Organizadas, as famílias empunharam bandeiras vermelhas, entoaram canções de luta, palavras de ordem e ergueram suas ferramentas de trabalho.
Diante da vibrante resistência, após cerca de meia hora, as viaturas suspenderam o bloqueio, se dirigiram para a sede da fazenda Nossa Senhora Aparecida, onde fizeram uma parada, e se retiraram para a cidade de Chupinguaia.
Os policiais retiraram bandeiras e placas indicando a entrada do Acampamento Manoel Ribeiro – mais uma ação ilegal, pois elas estavam colocadas em propriedades particulares de camponeses. Na manhã seguinte, as bandeiras já voltaram a tremular, recolocadas nos mesmos lugares pelos camponeses.
Seguindo a escalada da violência reacionária do latifúndio e do velho Estado contra o Acampamento Manoel Ribeiro, os camponeses relataram uma movimentação atípica no latifúndio Nossa Senhora, entre 18h e 20h do dia 20/01: uma viatura policial entrou na sede; 4 caminhonetes, carros e motos ficaram rondando pela estrada principal que dá acesso à Chupinguaia (Linha MC01) e nas estradas dentro do latifúndio; e um drone sobrevoou próximo ao Acampamento. Acampados denunciaram que, em seguida, pistoleiros dispararam com arma de grosso calibre contra um posto de segurança do Acampamento.
Articulação de latifundiários locais
As suspeitas por parte dos trabalhadores de que outros latifundiários da região estão apoiando o latifúndio Nossa Senhora Aparecida aumentam.
Segundo denúncias de camponeses das áreas vizinhas, desde os 3 dias que antecederam os ataques, a sede da fazenda Nossa Senhora tem apresentado movimentação atípica de diferentes carros e caminhonetes.
A rápida e constante entrada e saída de veículos relatada pelos moradores seria resultado de uma possível reunião dos latifundiários locais, um dos quais é o ladrão de terras Antenor Duarte, conhecido por ser um dos mandantes do crime hediondo ocorrido em 1995 conhecido como “Massacre de Corumbiara”.
Acerto de contas histórico
O Acampamento está localizado em Chupinguaia, município com grande concentração de terras. Desde 16 de agosto passado quase 200 famílias estão tomando o restante da antiga fazenda Santa Elina. É parte do acerto de contas histórico com o latifúndio e o velho Estado terroristas que assassinaram 14 camponeses em 1995 e até hoje seguem impunes.
Em nota assinada em 31/01 pela Assembleia Popular do Acampamento Manoel Ribeiro, Comitê de Defesa da Revolução Agrária do Acampamento Manoel Ribeiro (CDRA) e Liga dos Camponeses Pobres de Rondônia e Amazônia Ocidental (LCP).
Os camponeses em luta afirmam que, apesar dos ataques do latifúndio em conluio com o velho Estado, onde existe opressão, existe resistência. E dizem: “Longe de se amedrontarem, as famílias elevam sua organização e preparação, conscientes da justeza de sua luta, ainda mais agora em meio a maior crise econômica e política da história, agravada pela pandemia de Covid-19”.
Os camponeses clamam o apoio ativo de todos camponeses, trabalhadores, pequenos e médios comerciantes e democratas, e seguem reafirmando: “Queremos viver em paz, mas se nos oferecerem guerra, terão guerra! Nós não sairemos de nossas terras! Estamos unidos e organizados! Se moverem aparato de guerra contra nós, para tentar nos tirar da terra, tenham certeza que resistiremos com unhas, dentes e da forma que pudermos”.
“Essas terras estão regadas com sangue dos camponeses que heroicamente resistiram e lutaram por elas em 1995 e dos povos indígenas chacinados por latifundiários e seu velho Estado. E se for necessário, juntaremos nosso sangue ao desses heróis. Assim como os combatentes de Santa Elina em 1995, hoje 25 anos depois gritamos com firmeza: Nem que a coisa engrossa, essa terra é nossa!”.