Comitê de Apoio ao AND – Norte de Minas Gerais
Uma equipe da Redação de AND esteve no Acampamento Terra Prometida logo após o ataque de pistoleiros do dia 8 de março (noticiado em AND 206) para apurar um pouco mais sobre a tentativa de massacre, na cidade de Capitão Enéas. Os camponeses, demonstrando decisão, reafirmaram-se na luta pela terra e deram mais detalhes do crime.
Mais detalhes do crime
No último dia 8 de março, por volta das 16h, ocorreu um covarde ataque de pistoleiros contra o Acampamento Terra Prometida, organizado pela Frente Nacional de Lutas Campo e Cidade (FNL), no município de Capitão Enéas, Norte de Minas Gerais. O dirigente estadual da FNL, Tiago Coimbra, foi alvejado com tiros nas duas pernas, tórax, cabeça e encontra-se hospitalizado em estado grave. Apesar da aguerrida resistência dos camponeses que ainda se encontram acampados na sede do latifúndio, outras pessoas foram torturadas e muitas estão feridas.
O mandante de mais este crime premeditado contra a luta pela terra, segundo denunciam os camponeses, é Leonardo Andrade que, junto ao seu irmão Bernardo Alexandre de Andrade e Júlio César Cardozo Torquato (tido como seu “amigo”), teve pedido de prisão decretado e encontra-se foragido.
Os camponeses dizem que há indícios de participação da Polícia Militar. Segundo eles, a PM agiu como cúmplice do crime premeditado e encomendado pelo latifúndio e que buscavam chegar no local do crime após o “serviço” já ter sido concluído.
Cerca de 30 pistoleiros teriam participado do atentado, recebendo a quantia de 400 reais cada. Tudo indica que o objetivo central do crime encomendado era assassinar as lideranças do acampamento e da FNL, sendo o Tiago Coimbra alvo principal.
Segundo apontam as próprias investigações da Polícia Civil que resultaram em seu pedido de prisão preventiva, Leonardo Andrade negociou e orquestrou o ataque junto a outros latifundiários e chefes de pistolagem da região na sede da Sociedade Rural (organização política dos latifundiários da região), cuja sede está localizada no Parque de Exposições da cidade de Montes Claros.
A proporção deste último ataque e a forma como foi orquestrado comprovam cabalmente as denúncias do movimento camponês combativo na região de que os latifundiários organizam uma campanha de terror no objetivo de deter o irrefreável avanço da luta pela terra e por territórios de camponeses, quilombolas e indígenas.
Camponeses relatam
AND: Como foi que os pistoleiros chegaram?
Joaquim: Quando a gente chegou em casa, o baú (caminhão) desceu, aproximou já soltando tiro… De repente veio o carro vermelho (do advogado Robson Lima) de lá prá cá, vem já abordando a gente, já soltando fogo. Nós corremos, juntamos embaixo da cama. Atiraram nas telhas, nas paredes. Aí arrastaram a gente, amarraram e deram socos e coronhadas de 12 (calibre) na cabeça da gente. Desmaiamos. Trouxeram a gente aqui pra fazenda, pisaram no meu pescoço como se estivessem matando galinha… Eu, minha esposa e meu filho, todos amarrados pelas pernas e braços, dizendo “cês vai morrer”, “cês vai morrer”…. Aí chegou o advogado do Léo Andrade (latifundiário).
AND: Como o Tiago foi alvejado?
Josefina: À tarde, por volta de 16h, Tiago saiu com outro companheiro para ver se tinha algum movimento de pessoas estranhas nas estrada e antes de chegar no Peri-Peri toparam com o caminhão baú. Aí eles voltaram rapidamente, mas não deu tempo de chegar aqui para avisar o pessoal. Em seguida chegou o caminhão baú e, quando o Tiago chegou na cancela, eles desceram e já foram disparando contra ele. Nós saímos correndo da sede.
AND: Como foi a participação da Andreia Beatriz Silva no ataque?
João: Nosso companheiro Tiago levou tiro na perna, no peito e na cabeça. O bandido viu que não tinha matado ele e levou para a Andréia terminar de fazer o serviço. Antes de encontrar com a Andréia, a polícia vinha e já encontrou o carro abandonado, que ele já tinha fugido e deixado Tiago no carro. A Andreia queria a cabeça do Tiago, ela estava louca querendo a cabeça dele, ia torturar até acabar de matar ele….
AND: A senhora acha que eles queriam matar alguém em especial?
Maria: Eles entraram sem piedade e era para matar, porque se encontra principalmente a direção toda reunida, acho que eles tinham matado, tinha feito igual fez com o Tiago… Eles queriam cinco pessoas.
AND: É verdade que vocês avisaram a Polícia Militar antes do ataque?
Geralda: A gente ficou sabendo do que ia acontecer por um ex-cunhado meu. Um amigo dele ficou sabendo. Ele tentou avisar a gente um dia antes, mas não conseguiu. No outro dia, por volta de 13h30, ele avisou antecipado pra gente tomar providências. Minha irmã e o Tiago saíram para avisar os policiais, fizeram o boletim de ocorrência e eles falaram que iam trazer reforço, a patrulha rural… Mas não mandaram.
Grilagens de terras, super-exploração e abusos sexuais
A Fazenda Norte América é mais um latifúndio improdutivo no norte de Minas Gerais formado pela expulsão dos posseiros durante o regime militar-fascista. Para manter a fachada de fazenda “produtiva”, Leonardo Andrade criava algumas cabeças de gado e cavalos de raça. Para realizar este serviço, utilizava da força de trabalho de uma família de camponeses pobres, impondo relações semifeudais de produção, além de um pequeno grupo permanente de pistolagem.
O marido, sua esposa e seus dois filhos adolescentes eram obrigados a trabalhar das três horas da manhã até às sete horas da noite. O vaqueiro recebia um salário por mês, sua esposa recebia 400 reais e o seu filho adolescente recebia 200 reais. Nenhum tinha carteira de trabalho assinada e os dois jovens não podiam estudar.
Além disso, a prática de abusos sexuais contra adolescentes e crimes de pedofilia contra filhas de camponeses na região por Leonardo Andrade e sua quadrilha na Fazenda Norte América era frequente. Vídeos destas práticas abomináveis circulam na internet e a Polícia Federal, o Ministério Público Estadual e a Secretaria Estadual de Direitos Humanos possuem cópias das imagens e depoimentos de vítimas.
Uma ampla campanha pela prisão de Leonardo Andrade e a desapropriação imediata da Fazenda Norte América já está em curso. Os camponeses e militantes da FNL contam com o apoio da Liga dos Camponeses Pobres do Norte de Minas e Sul da Bahia, do Comitê de Apoio a Luta pela Terra em Montes Claros dentre outros movimentos populares e entidades sindicais da região.
Leonardo Andrade
Pistoleira Andreia
Armas confiscadas da Fazenda Norte América