No dia 14 de janeiro, policiais militares realizaram, sob ordem do judiciário, um despejo contra o povo Gamela que vive na comunidade Morro D’Água, em Baixa Grande do Ribeiro, estado do Piauí.
O despejo teve início às 16h da tarde enquanto os indígenas trabalhavam na roça. Após a expulsão, os agentes da reação queimaram casas. No dia 17, agentes da reação voltaram a ameaçar os indígenas no local. Apenas em 19/01, o judiciário do Piauí suspendeu a ordem de despejo. Um outro ataque onde casas foram incendiadas já havia acontecido em 2020 por iniciativa de latifundiários que praticam a grilagem de terras indígenas na região.
Entre os expulsos está o líder indígena Adaildo José Alves da Silva e sua família, de 11 pessoas. Segundo Adaildo, "a demarcação da nossa terra já foi reivindicada, mas aqui onde a gente vive é grileiro que compra terra de grileiro. Eles nos ameaçam de morte e como temos pouco estudo e conhecimento da lei, eles se aproveitam disso”. O suposto autor do pedido de posse é o latifundiário e grileiro Bauer Souto Santos.
O assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) Regional Nordeste, Daniel Maranhão Ribeiro, faz importante denúncia em entrevista ao Cimi, no que diz respeito aos despejos realizados em meio a pandemia. Segundo Daniel, “cabe ressaltar também que todos os processos de ações possessórias foram suspensos durante a pandemia, assim como recursos referentes a essas ações de acordo com a decisão no Recurso Extraordinário 1.017.365 proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF)”.
Casa é incendiada em meio a despejo ilegal. Foto: Reprodução
Matopiba: Latifundiários grilam terras do povo
Outra denúncia realizada pelo assessor é sobre como o avanço da chamada “fronteira agrícola” de Matopiba – acrônimo das iniciais dos Estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, afeta o povo gamela.
Esta área que o latifúndio busca explorar compreende 73 milhões de hectares de cerrado que abarcam 337 municípios, 35 terras indígenas, 745 assentamentos de camponeses e várias comunidades tradicionais como quilombolas, geraizeiros, quebradeiras de coco, além de 46 unidades de conservação do segundo maior bioma brasileiro, considerado a savana mais rica em biodiversidade do mundo.
Por ser uma região de vasta extensão de terras planas, torna-se ideal para o cultivo de soja e outras commodities e este cultivo vem crescendo exponencialmente nos últimos anos graças aos incentivos dados pelo velho Estado ao latifúndio.
Durante o processo de grilagem, o latifúndio manda seus capangas até as terras já ocupadas pelas massas da região e intimidam fazendo georreferenciamento via GPS, ou colocando placas alegando que as terras pertencem a eles, ou invadindo as áreas. Invasões promovidas por pistoleiros. Ao final com certidão de matrícula falsa movem processos na justiça a fim de expulsar com apoio do velho Estado os trabalhadores de suas terras.
Há também a prática chamada “grilagem verde”, quando o latifúndio alega que toda uma extensão de terra pertence a ele e ao delimitar, como exigido por lei, a área de proteção o faz indicando o local onde há comunidades.