O Novo Ensino Médio (NEM) tem agravado a evasão nas escolas de ensino público do município de Montes Claros (MG), principalmente nas Escolas de Modelo de Tempo Integral (EMTI) das regiões periféricas da cidade. É o que concluiu a reportagem realizada pelo Comitê de Apoio de Montes Claros (MG) entre as escolas públicas que adotaram o Novo Ensino Médio na cidade. A reportagem de AND comparou o nível de evasão entre escolas onde o Ensino Médio funciona em tempo integral e com 6° horário. As escolas analisadas são situadas na periferia, em bairros proletários e escolas centrais localizadas em bairros da pequena-burguesia.
Na reportagem, a evasão escolar foi considerada em seu sentido estrito e em um sentido amplo, no qual se engloba os pedidos de transferência de Escolas de Modelo de Tempo Integral (EMTI) para escolas de 6 horários em turno matutino ou vespertino ou escolas com ensino noturno regular. O Comitê de Apoio esteve presente em quatro EMTI localizadas em bairros de periferia, quatro escolas cujo modelo é de 6° horário e duas de modelo regular noturno.
Evasão e abandono
Em uma escola localizada em determinada região da cidade onde há muita concorrência de vagas e um nível de pobreza menor por parte das famílias, as turmas de Ensino Integral têm se mantido relativamente cheias. Apesar disso, os números sobre evasão na escola revelam um aumento significativo desde a implementação do Novo Ensino Médio: nos anos de 2020 e 2021, os pedidos de transferência de alunos do 1° ano para escolas de modelo de 6° horário somaram 13, incluindo-se transferências para outras cidades. Já em 2022, primeiro ano de implementação do NEM, foram 35 solicitações de transferência sem contar as transferências para outras cidades.
A razão disto? O chamado “ensino integral” não serve para aprofundar a formação dos alunos, com ensino regular no primeiro turno e técnico no segundo, ou aprofundamento científico no tempo extra. Essa realidade absurda é extremamente agravada sob o NEM, que substitui as poucas disciplinas técnicas e científicas restantes por currículos esvaziados de quaisquer conteúdos científicos. Muitos pais se queixam do cansaço extremo gerado nos filhos pelo excesso de tempo ocioso na escola, o que, em comparação com o ensino verdadeiramente técnico, não tem resultado em nada senão em perda de tempo. Já em escolas de periferia com nível de pobreza das famílias mais agudo, ao levar em conta escolas localizadas em dois extremos da cidade, foi observado que os estudantes estão simplesmente abandonando a escola.
Como parte da reportagem, o Comitê de Apoio acompanhou o trabalho de mobilização da Frente de Luta Contra o Novo Ensino Médio em Montes Claros, organizada na cidade no mês de março/abril. Nas panfletagens em portas de escolas, os integrantes da Frente se depararam com apenas 25 ou 30 estudantes saindo da escola no horário de término das aulas (16h30). O fato, que desperta curiosidade ao início, dadas as largas dimensões da escola, foi explicado simplificadamente por um dos funcionários da escola: no total, o 1º e 2º anos do Ensino Médio nesta escola têm somente 35 alunos frequentes. O agravamento do índice de evasão no Novo Ensino Médio é visível quando se compara com as turmas de 3º ano, que funcionam ainda no modelo regular. Nelas, o número de alunos e a frequência nas aulas são maiores.
Ninguém suporta o Novo Ensino Médio
A reportagem do Comitê de Apoio conversou também com a administração e estudantes da referida escola. Em entrevista, o vice-diretor afirmou que: “não aguentamos mais este Novo Ensino Médio, especialmente o integral”. Ao questionar às jovens estudantes o que elas achavam do NEM, a resposta foi simples e contundente: “é muito cansativo”. As estudantes acrescentaram ainda que, apesar do cansaço a mais, não estavam aprendendo nada extra.
Após sugestão do próprio vice-diretor, a reportagem de AND encaminhou-se até a sala dos professores para entrevistas os profissionais. Uma professora de matemática que inicialmente afirmou não ser a favor da revogação, mas sim de uma reformulação, convenceu-se da necessidade de revogar o projeto após ser apresentada à matéria de AND Nem aceitar, nem ajustar: revogar o NEM já!. A professora mostrou-se abisamada ao ouvir os nomes das disciplinas que hoje compõem os itinerários formativos do Novo Ensino Médio e concluiu que a sua defesa, na verdade, é de um Ensino Médio Integral que seja verdadeiramente técnico e com isso, garanta a permanência dos alunos mais pobres nas escolas e com perspectivas de emprego.
Um outro professor, defensor de longa data do Ensino Integral, afirmou que o Novo Ensino Médio não é o “Ensino Integral”, uma vez que não preenche o dia dos estudantes com atividades úteis para o seu aprendizado. O professor afirmou que não se pode exigir que os alunos fiquem o dia inteiro sentados na cadeira e achem a escola boa.
Em uma nova entrevista, a diretora da escola afirmou que:
— “Os meninos não estão suportando. Não estou vendo expectativa nenhuma com este projeto. Não há estrutura para o tempo integral. Só o que o governo oferece é comida. Não há, no Ensino Integral, estrutura, por exemplo, com banheiros para que eles ao menos tomem um banho na hora do intervalo de almoço Há eixos formativos, mas, no propedêutico*, os alunos só ficam sonhando, porque não oferece futuro para eles”.
A diretora relatou ainda que na escola há laboratório, mas ainda muito deficiente. Segundo ela, boa parte pede transferência da escola para fazer cursos técnicos ou cursos do Trilhas do Futuro, que são cursos oferecidos por organizações empresariais (PPPs – Parcerias Público Privadas) e oferecem auxílio financeiro para os estudantes que os cursam. Outros pedem transferências para as escolas próximas que funcionam com o Novo Ensino Médio no modelo de 6º horário.
Sobre a evasão, ela relata que o ritmo de transferências/abandono estava tão intenso que precisou solicitar à Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais (SEE-MG) a abertura de uma turma de 1º ano do Ensino Médio regular noturno, o que garantiu alunos suficientes para impedir o fechamento de uma turma. Sim, abandono. Porque uma boa parte não está nem ao menos frequentando as aulas.
Em conversa com o diretor de outra escola próxima, cujo modelo é EMTI, ele relatou não saber como fará, já que tem lá uma turma que começou com 36 alunos e hoje está com somente 6. Neste bairro as famílias são muito pobres.
O agravamento do índice de evasão no Novo Ensino Médio é visível quando se compara com as turmas de 3º ano, que funcionam ainda no modelo regular. Nelas, o número de alunos e a frequência nas aulas são maiores.
Ataque ao movimento estudantil
Além de dificultar a formação escolar e técnica, o NEM significa ainda um ataque direto à mobilização estudantil. Em entrevista ao Comitê de Apoio, um integrante da Frente de Luta afirmou que a panfletagem em frente às escolas tem sido amplamente dificultada pela evasão escolar. Assim como o Ensino Remoto e o EaD, o NEM ocorre como um ataque direto ao movimento estudantil pelo esvaziamento completo das escolas.
O trabalho do Comitê de Apoio ao Jornal A Nova Democracia revelou o que já está explícito para todos: o Novo Ensino Médio é um fracasso e um grande prejuízo para as classes mais empobrecidas, e somente a mobilização estudantil será capaz de revogar essa criminosa política.