Por 4 a 3, o crime foi desqualificado para culposo e vai para a Justiça Militar
Mães e familiares de vitimas de violência do Estado protestam em frente ao TJRJ antes do juri
Ocorreu na tarde de quinta-feira, 22 de novembro, novo júri popular para julgar três (sargento Washington Luiz de Oliveira Avelino, cabo Marcos Duarte Ramalho e soldado Paulo Marco Rodrigues Emilio) dos cinco policiais militares acusados pelo assassinato de quatro jovens ocorrido há 15 anos no Morro do Borel, zona norte do Rio de Janeiro, que foram registrados como auto de resistência. Os três policiais foram absolvidos da acusação por crime hediondo por 4 a 3, sendo aceita a tese da legítima defesa putativa pelo júri. O crime foi desqualificado para culposo, quando não há a intenção de matar e agora a Justiça Militar decidirá sobre o possível arquivamento do caso.
Carlos Alberto (21), pintor e pedreiro; Calor Magno (18), estudante; Everson Silote, taxista, 23 anos; e Thiago Silva (19), mecânico, foram executados com vários tiros durante uma operação do 6º Batalhão de Polícia Militar (BPM), no dia 16 de abril de 2003. Nos 13 anos da chacina, um texto foi publicado pela Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência (https://www.facebook.com/redecontraviolenciarj/), relatando que cada um deles recebeu de cinco a doze tiros da PMRJ, pela frente e pelas costas. O taxista chegou a ter o braço quebrado e peritos atestaram emboscada. (https://www.facebook.com/redecontraviolenciarj/photos/a.531898333519437/1102500466459218/?type=1&theater).
Ainda pela manhã um protesto foi organizado pela Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência (https://www.facebook.com/redecontraviolenciarj/ ) em frente ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Familiares das vítimas da chacina do Borel e outros familiares vítimas de violência do Estado, juntamente com apoiadores, compareceram para exigir justiça. Em entrevista à Rede TVT (https://www.youtube.com/watch?v=KzchcUQxugs), Maria Dalva da Costa Correia, integrante da Rede e mãe de Thiago Silva, disse que no momento não há nenhum policial envolvido na chacina preso, e que o sargento Washington Luiz de Oliveira Avelino, protegido por um recurso no Supremo Tribunal de Justiça, seria julgado pela primeira vez naquela tarde. A ativista diz que luta para “que não mais aconteça e para que não se esqueça”.
Afilhada e prima de Thiago, Beatriz Costa Reis, 20 anos, conta em entrevista para a Ponte que ele deixou uma filha, sua xodó, Gabriela, e que ela tem poucas lembranças dele porque era muito criança quando da sua morte, mas que sua mãe e seu pai sempre lembram muito dele, principalmente quando fazem pudim, porque ele gostava muito. Em festas de família seu nome também sempre é lembrado.
“Eu tô aqui hoje por sede de justiça. Depois de tantos anos, fazerem outro julgamento, passar por tudo de novo, eu espero que o resultado faça eu e minha família comemorar bastante”, conta na entrada para o II Tribunal do júri.
‘Eu não quero que meu filho seja esquecido’, diz Sebastiana Silote
Mãe e tia de Thiago Silote exibem sua foto em manifestação
Sebastiana do Carmo Gonçalves Silote, a “Tiana” para os familiares e amigos, tem 59 anos e trabalhou mais de 30 como cabeleireira. Ela foi uma das testemunhas de acusação no júri e estava acompanhada de sua irmã Lúcia Helena Gonçalves. Teve quatro filhos, e Everson Silote era o mais velho deles. “Ele era nosso dengo, e a gente era o dengo dele também. Ele era muito bom, ele tirava a roupa pra te dar, sabia?”, disse, emocionada, em entrevista para a Ponte.
Ela afirma ainda que seu filho ia completar 27 anos na semana em que foi assassinado, e que até hoje nada foi resolvido em relação ao seu caso e que nenhum suporte para a família por parte do Estado foi oferecido, visto que Thiago era pai de duas crianças, uma de 5 e outra de 3 quando foi assassinado.
“Não deram um nada pros meus netos, ele é que sustentava a casa com o trabalho dele. O mais velho tá com 20 anos e o caçula 18 anos. Eu continuo pensando nos estudos deles, pra eles estudarem, terem uma casa pra eles. A mãe deles foi ameaçada e teve que ir embora do Borel”, conta.
É regra e não exceção
A Chacina do Borel e todo o seu histórico de impunidade e omissões por parte dos órgãos estatais responsáveis, em que a maioria das vítimas são pessoas pobres e negras, segue não sendo uma exceção à regra. Em cinco meses de intervenção militar no Rio, as chacinas aumentaram 80% e as mortes em chacinas (três pessoas mortas ou mais) subiram 128%, de acordo com o relatório “Vozes sobre a intervenção” (https://pedlowski.files.wordpress.com/2018/08/relat_observ_6-meses_vozes-da-intervencao.pdf ), que pretendeu fazer um balanço dos seis meses da intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro, decretada pelo governo de Michel Temer (MDB), em março deste ano.