Depois de crescer por cinco meses de forma ininterrupta, o número de militares reacionários no governo de Luiz Inácio tornou-se somente 6,4% menor do que a porcentagem no último mês do governo Bolsonaro, revelou um levantamento recente feito pelo jornal monopolista O Globo a partir do Portal da Transparência. Em novembro de 2023, data mais recente disponível no portal, 2.760 militares da ativa ocupavam diversos postos no governo federal, contra 2.938 presentes no governo Bolsonaro em dezembro de 2022. É um número elevadíssimo, sobretudo frente às ações das Forças Armadas reacionárias nos últimos anos, que escancararam os planos golpistas e de tutela à Nação executados pela cúpula militar.
A taxa vai diretamente contra o que o governo afirmou que faria em janeiro de 2023. “O Palácio do Planalto estava repleto de bolsonaristas, de militares, e estamos vendo se conseguimos corrigir para colocar funcionários de carreira, de preferência civis”, prometeu Luiz Inácio em uma entrevista naquele mês.
Nos meses seguintes, para dar ares de combate e de quem mantinha a palavra, o governo começou a demitir alguns militares, principalmente aqueles notadamente envolvidos em casos de corrupção, na bolsonarada do 8/1 ou com a extrema-direita. A demissão nunca atingiu níveis altos, e o menor número de militares da ativa no governo foi 2.557. Desse ponto, voltou a crescer para nunca mais cair.
Alguns dos que foram demitidos foram substituídos por outros militares. Foi o caso do general Gonçalves Dias, ex-ministro do GSI que pediu demissão após a divulgação de um vídeo que o registrou auxiliando os galinhas verdes a deixarem o prédio do palácio presidencial no 8 de janeiro de 2023. Em menos de um mês depois da demissão, Dias foi substituído por outro general, Marcos Amaro, que logo após assumir o cargo deixou claro sua concordância com as posições (clássicas dos generais enlameados no golpismo) de que os militares deveriam sim ocupar postos políticos e que nunca houve intenções golpistas por parte das Forças Armadas.
Governo capitula frente aos militares
A aceitação plena da gestão Lula sobre a presença de militares no governo é só uma das expressões de capitulação de Luiz Inácio frente à pressão do Alto Comando das Forças Armadas (ACFA) para que não se interfira no golpe militar preventivo contrarrevolucionário em curso e sua manifestação na tutela militar sobre a Nação. Outras expressões foram a onda de investimentos na caserna, por meio do PAC, de investimentos diretos na defesa e de dinheiro para “projetos estratégicos”, e também as concessões do governo em temas sensíveis aos militares.
Um deles foi a reinstalação da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos. Os militares sempre buscaram minar toda e qualquer iniciativa ou campanha, pela institucionalidade ou pelo movimento popular, de investigar os crimes da caserna durante o regime militar. O governo Lula prometeu reabrir a comissão ainda em 2023, mas acabou adiando os planos devido à pressão militar intermediada pelo ministro da Defesa, José Múcio.
Outra expressão, muito próxima ao problema atual da presença de militares no governo, é a falta de apoio do PT a uma PEC que buscava “restringir” a atuação dos militares nos cargos governamentais. Inicialmente, a proposta buscava proibir militares da ativa de ocuparem qualquer cargo no Congresso Nacional ou nos ministérios. É claro que os militares desgostaram, e novamente o lobista dos militares no governo agiu: Múcio se reuniu, no período da votação da PEC, com o líder do PT no Senado, Jacques Wagner, que por sua vez tratou de mudar o texto para que permitisse a permanência de militares reacionários nos ministérios. Para justificar, Wagner afirmou (em uma admissão de que a mudança foi baseada no medo do enfrentamento) que: “se você radicalizar, aí os militares da oposição vão para cima”, declarou ao Globo.
De novembro para cá, o governo só se abriu ainda mais aos militares. José Múcio afirmou que a relação de Lula com a caserna está “pacificada”, e no dia 8/1 Lula apertou as mãos dos comandantes no evento “Democracia Inabalada”. Nas condições do País, e à nível da suposição, pode-se dizer que Múcio quis referir-se a uma paz específica: aquela das baionetas; e que no evento de Lula, os generais tinham seu próprio entendimento sobre o primeiro ano da presidência de Luiz Inácio, com um nome mais apropriado à realidade do governo: “Tutela Inabalada”.