A Transposição do Rio São Francisco mudou completamente o panorama da luta camponesa na porção setentrional do Nordeste. Terras que antes eram imprestáveis para a agricultura por falta de água, tornaram-se objeto de cobiça do dito “agronegócio”, objeto de disputa entre camponeses e latifundiários. Isto porque a perenização dos rios receptores, agora permite a realização da agricultura irrigada em determinadas manchas de solo, condição quase impossível antes da Transposição.
A luta pela água nos estados atendidos pela Transposição, Pernambuco, Paraíba, Ceará e Rio Grande do Norte, já representa uma fatia importante dos conflitos no campo. Segundo o Relatório Conflitos no Campo 2023, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), a região Nordeste concentra o maior número de conflitos por água.
O fato é que a Transposição propiciou o aumento da fertilidade dos solos das áreas ribeirinhas dos rios receptores que foram perenizados, como revela a geógrafa Maria de Melo em sua pesquisa sobre a Transposição no rio Paraíba, realizada em 2019, e isto despertou a cobiça destas terras pelo latifúndio.
Agora é do interesse do latifúndio se apossar dessas terras e expulsar as famílias camponesas que secularmente habitam as áreas ribeirinhas destes rios. Os camponeses entendem estes riscos e já levantaram a bandeira da titulação de suas posses como algo fundamental e necessário, travando luta para arrancar este direito do velho Estado.
A água aduzida pelo eixo leste da Transposição, por exemplo, segue pelo leito do rio Paraíba até o açude Epitácio Pessoa, que abastece Campina Grande e outros municípios da região. Se fosse uma obra para garantir segurança hídrica principalmente para o abastecimento público, como se alega, é evidente que a água deveria ser conduzida através de adutoras, não de canais ou no leito do rio, como concluiu Maria de Melo em sua pesquisa. A opção por aduzir estas águas em canais ou em leitos de rios, cortando manchas de solo férteis é, no mínimo, bastante suspeita.
É necessário revelar quem são os reais beneficiários da Transposição do São Francisco
Se levarmos em conta que as grandes empreiteiras lucraram bilhões de reais num Projeto em que já foram gastos mais de R$ 14 bilhões, será revelado seu primeiro beneficiário: grandes empreiteiras que usam recursos do estado para o seu crescimento.
O falecido geógrafo Aziz Ab’Saber, já levantava essa suspeita, além do engenheiro João Suassuna, dois grandes conhecedores do São Francisco. Para João Suassuna, em uma entrevista dada em 2019, a Transposição visava beneficiar o dito agronegócio da região e as grandes empreiteiras. Já o povo, segundo ele, não teria acesso a uma única gota de água. Aziz Ab’Saber, por sua vez, em uma artigo publicado, revelou que tudo levava a crer que os reais beneficiários da Transposição seriam os fazendeiros locais e as grandes empreiteiras.