Depois de horas de amarga espera, o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), finalmente rompeu o silêncio. Um comunicado do grupo, seguido de declarações de solidariedade de organizações de todo o Oriente Médio, confirmou a morte do destacado líder e comandante, Yahya Sinwar, de armas nas mãos, na linha de frente de um combate no Sul da Faixa de Gaza.
A reação do Hamas foi potente. Confirmou que a morte de Sinwar, nas condições que foi, minou o que Israel poderia extrair do assassinato.
Primeiro, porque o saldo militar é quase nulo. O Hamas seguirá com as ações de guerra, executadas pelas Brigadas Al-Qassam, dirigidas pelo experimentando e inabalável comandante do Estado-Maior da organização militar, Mohammed Deif.
Segundo, porque o saldo político que Israel poderia construir após a morte foi obliterado pelas fotos e vídeos que o próprio Estado sionista diz ser os últimos momentos de Sinwar: registros de um combatente, armado e equipado, que lutou até os últimos suspiros contra o inimigo, mesmo que isso significasse usar uma barra de ferro para atingir um drone israelense com o único braço que lhe restava.
A vitória política dessas cenas é dos palestinos que lutam ao lado de Sinwar, não dos comandantes de Israel que mataram o comandante palestino de longe, pela operação de um veículo não-tripulado.
Um ponto que se abre, contudo, é sobre a sucessão de Sinwar: qual nome será escolhido para dirigir o Hamas nessa fase crítica da Resistência Nacional Palestina? Quais posições o dirigente defende?
Khaled Mashal: Defensor da luta armada e da destruição de Israel
Muitas análises apontam que o posto será assumido por Khaled Mashal, um nome importante do partido que foi eleito interinamente chefe do Birô Político do Hamas entre julho de 2024 e agosto de 2024 e, novamente, em outubro de 2024.
O histórico do líder é rico. Foi membro fundador do Birô político do Hamas. Dirigiu importantes vitórias políticas da organização, como a troca de mil prisioneiros palestinos pelo soldado sionista Gilad Shalit, em 2011 – acordo que libertou Sinwar da prisão.
Em janeiro de 2024, afirmou que a paz depende da destruição de Israel e uma Palestina livre do “Rio ao Mar”, sem dois Estados. É um sinal que Mashal aproveita o atual momento da situação política na Palestina e no mundo para avançar com as exigências, uma vez que em 2006 a exigência do líder para uma trégua de longo prazo era o retorno de todos os refugiados palestinos e que Israel retornasse para as fronteiras de 1967.
Mashal também sempre condenou a política da Autoridade Palestina (AP) de colaborar com Israel. Muitas vezes se recusou a seguir diretivas da AP e do seu então presidente, Yasser Arafat, sobre os momentos de cessar-fogo com o Estado sionista.
Por outro lado, sempre considerou a luta armada como um “desenvolvimento natural”. “[A Segunda Intifada] nos ensinou que deveríamos avançar das formas normais de confrontação popular para operações com bombas e rifles”.
Em outubro de 2023, Mashal defendeu a Operação Dilúvio de Al-Aqsa como “um ato inteligente de resistência legítima”, e que as consequências foram calculadas pelo Hamas. Em agosto de 2024, defendeu que operações de martírio deveriam novamente ser realizadas contra Israel.
É certo que toda organização tem membros que defendem diferentes posições, e podem ser reunidos em duas linhas que refletem questões fundamentais, como o curso da luta armada.
Mas outro elemento importante na situação são as massas. Atualmente, o povo palestino apoia a luta armada em níveis que não eram observados há anos. Isso influencia as posições das organizações, e favorece a continuação da luta armada por libertação.
Um elemento de cálculo é, também, a posição e unidade das outras organizações da Resistência Nacional Palestina. Atualmente, há dezenas de grupos, desde os maiores, como a Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP) e Jihad Islâmica Palestina (JIP), até brigadas mais locais, como as de alguns campos de refugiados da Cisjordânia, que tomam parte na guerra. E a unidade desses grupos reside justamente na defesa da luta armada e na destruição total de Israel, para a proclamação de uma Palestina livre com Jerusalém como capital.
O último prego na chance de um revés na posição do Hamas pós-assassinato de Sinwar é a particularidade da situação do mundo hoje, em que o apoio à luta armada atingiu até mesmo as manifestações nas universidades norte-americanas e europeias.
Não há dúvidas: o mundo não esteve tão fértil para o deflagrar de uma luta armada revolucionária pela defesa de uma causa justa. E os palestinos aproveitam isso.