“Desejo ao primeiro-ministro indiano, @narendramodi, um terceiro mandato de muito êxito na promoção do desenvolvimento sustentável, no combate às desigualdades e no fortalecimento da cooperação entre nossos países. Brasil e Índia são aliados no enfrentamento das injustiças da ordem internacional e no combate à fome e à pobreza”, disse o presidente brasileiro em sua rede social X no dia 4 de junho, data que selou o fim do longo processo eleitoral indiano e a reeleição do primeiro-ministro fascista Narendra Modi. Aos olhos atentos, os elogios chamam atenção: o regime de Modi é conhecido justamente pela repressão sem igual a jornalistas, ativistas, camponeses e revolucionários, além da manutenção de uma economia responsável por manter mais de 50% do povo indiano na miséria.
Aproximadamente 850 milhões indianos (60% da população de 1,417 bilhão) vivem com menos de três dólares por dia. Isso significa uma vida de miséria absoluta. O desemprego é outro problema grave que afeta o povo indiano: dentre os jovens de 20 a 24 anos, a porcentagem da falta de emprego chega a 42%. Esses problemas são mantidos apesar do bem conhecido “crescimento econômico” da Índia. No último ano, o PIB indiano cresceu 8%, mas não houve melhoras na vida do povo, uma vez que os “ganhos econômicos” podem refletir um crescimento na indústria indiana, com lucros e rendimentos vultosos à grande burguesia e investidores imperialistas, mas sem estar atrelado à melhoria da qualidade de vida geral. Na pandemia, quando Modi já era primeiro-ministro, o número de pobres na Índia aumentou em cerca de 75 milhões, segundo o pesquisador sênior da Pew Research Center, Rakesh Kochnar. Ao mesmo tempo, a fortuna de bilionários como Mukesh Ambani, do conglomerado Reliance Industries (com fortuna de 80 bilhões de dólares) e Gautami Adani, do Adani Group (que acumula 55 bilhões de dólares), aumentou. Ambani lucrou 15 bilhões de dólares de 2020 para 2021, enquanto Adani acumulou 42 bilhões.
Esse cenário de desigualdade é acompanhado e aprofundado pela submissão da Índia aos interesses do capital imperialista. Longe de desafiar as “injustiças da ordem internacional”, a última gestão do regime indiano aumentou a participação do capital norte-americano no país asiático com acordos de tarifas e megaprojetos. Um deles, assinado logo após o último G20, prometeu aliviar a taxa de importação aos produtos agrícolas norte-americanos, o que prejudica o comércio dos produtos produzidos localmente pelos camponeses indianos.
Para controlar as constantes rebeliões que tem no país por conta desse cenário calamitoso de miséria e entrega das riquezas naturais, Modi lidera o país com uma política de chumbo. Os camponeses Advasi da Índia sofrem com a repressão movida pelas empresas multinacionais e pelas tropas do próprio Estado indiano. São várias as lideranças Advasi presas, como Sarju Tekam, e as organizações que denunciam os assassinatos e execuções de camponeses, a exemplo da Campanha Contra a Repressão de Estado (CASR, em inglês) e o Fórum Contra a Corporativização e Militarização. A Lei de Prevenção a Atividades Ilegais, também conhecida como lei antiterrorismo, aprovada por Modi em 2014, também é usada para processar e prender esses camponeses, junto de ativistas, intelectuais e jornalistas defensores do povo. É o caso, por exemplo, de Prabir Purkayastha, jornalista progressista e editor do portal Newsclick, perseguido por Modi há anos e que ficou preso mais recentemente entre outubro de 2023 e maio de 2024. Ou do professor da Universidade de Delhi, G.N. Saibaba, também solto esse ano após anos de encarceramento marcados pela negação até mesmo de atendimento médico mesmo nas condições de paralisia de 90% do corpo do intelectual. Há ainda o banimento generalizado de organizações populares, como a Frente Popular, lançada à ilegalidade no país em 2022.
Na fronteira com a Índia, organizações e ativistas da Caxemira, região ocupada ilegalmente pelo regime indiano, precisam enfrentar a mão sanguinária da repressão de Modi quando se posicionam pela independência de seu país. No ano passado, o jornalista Fahad Shah, editor do jornal Kashmir Walla, que ficou preso quase dois anos, denunciou na data de sua soltura as violações que passou nos presídios indianos. Ele chegou a ser obrigado a ficar 20 dias em uma solitária de 1,8 por 1,8m. Já no próprio território indiano, Modi coordena a repressão contra a Revolução dirigida pelo Partido Comunista da Índia (Maoista). Esse ano, a polícia indiana executou 29 pessoas, dentre elas guerrilheiros do Exército Guerrilheiro Popular de Libertação (EGPL) e camponeses desarmados, no dia 16 de abril, no âmbito da nova operação de guerra contrarrevolucionária intitulada Kagaar.
É realmente uma tarefa impossível encontrar os indícios de “combate às desigualdades”, “enfrentamento das injustiças da ordem internacional” e “combate à fome e à pobreza” ressaltadas por Luiz Inácio como qualidades do governo de Modi. O que o governo indiano promoveu até aqui, e promoverá pelos próximos anos de mandato, é justamente o oposto. Não à toa, os resultados de Modi foram muito abaixo de sua meta pessoal. Dos cerca de 978 milhões de indianos aptos a votar, aproximadamente de 336 milhões (quase um terço do eleitorado) não votaram, no que foi o aspecto mais expressivo do pleito. A taxa de participação caiu dos 67,4% registrados em 2019 para 66,3% esse ano. O BJP, partido de Modi, esperava ganhar 400 das 543 cadeiras no parlamento, mas só levou 240, 63 a menos do que o número de parlamentares eleitos em 2019. Dentre os estados onde Modi mais perdeu apoio, se destaca Uttar Pradesh (com uma queda de 62 assentos para 33), região governada pelo BJP e vítima das arbitrariedades da agremiação fascista, que vão desde a repressão policial até políticas chauvinistas do chamado “fascismo bramânico-hindutva” de Modi, como a destruição de mesquitas. Dessa forma, o BJP não conquistou a maioria no parlamento indiano, e terá que depender da aliança com partidos regionais que darão, em média, uma margem frágil de 51% dos assentos para Modi governar.