Camponeses realizam ações de boicote à farsa eleitoral, Jaru/Rondônia, 2014
Após as últimas eleições, em que 56 milhões de pessoas aptas a votar simplesmente deram de ombros e não votaram ou votaram nulo/branco (apesar de toda a chantagem e ameaças de punição do Tribunal Superior Eleitoral, de outras instituições desse podre Estado e acompanhada da cruzada dos monopólios de imprensa), reedita-se a farsa eleitoral. O pleito municipal, tal qual um circo, já monta a lona e prepara o espetáculo da mentira e engodo. Sobre um terreno caótico e em chamas, a farsa eleitoral conta ainda com toda a propaganda da falsa esquerda oportunista eleitoreira, de embelezamento dessa democracia reacionária.
Alguns, desavergonhados como o Pecedobê, simplesmente eludem o caráter de classe do Estado e descaradamente difundem seu revisionismo, semeando nas pessoas que, afinal, o poder é mesmo entregue ao vencedor a depender do resultado das urnas, mostrando-nos sua essência oportunista, qualquer coisa de cínica.
Ao contrário do verdadeiro show de mentiras das campanhas eleitorais, as ações revolucionárias de massas conformarão – elas sim – uma irresistível propaganda da Revolução.
Há outros, mais cautelosos com seu oportunismo, que justificam que é preciso usar o pleito para “propaganda revolucionária”. Seria cômico, não fosse trágico, que os setores que dizem usá-las como meio de propaganda para “denunciar às massas o próprio caráter farsante da democracia burguesa” tenham que tentar convencer as massas a votar hoje na intenção de, um dia, “convencê-las” do que elas já estão hoje convencidas. Essa tautologia, querem apresentar por dialética. São a “tropa de choque” do legalismo e do respeito à sacrossanta ordem institucional “democrática”.
Um Lenin engessado para oportunistas recalcitrantes e empedernidos
Os “nossos” oportunistas e revisionistas convertem a importante obra do chefe do proletariado, o grande Lenin, Esquerdismo, a doença infantil do comunismo, em instrumento de malabarismo para chafurdarem no cretinismo parlamentar e na podre estratégia de “acumulação fria”.
Em seus afãs eleitoreiros, eles tentam transformar Lenin num escudo conservador, ignorando o contexto em que escrevera a obra: em 1920, antes do surgimento do fascismo como fenômeno relevante, quando o sufrágio ainda era exclusividade masculino e o parlamento burguês ainda parecia, às massas, ser a única saída às autocracias em crise, inclusive na Europa; contexto em que, após o desmascaramento e bancarrota do revisionismo da II Internacional e o triunfo da Revolução Bolchevique, gerou-se tentações simplistas sobre a tomada do poder, em que o “esquerdismo” tomava relevância especial. Contexto no qual o imperialismo, como capital monopolista em decomposição, não tinha mais que 20 anos, o grau de reacionarização do Estado burguês e de destruição dos laços entre este e as massas populares eram infinitamente inferiores aos atuais. Contexto dentro do qual a única estratégia possível era a da insurreição armada precedida por um longo “acúmulo pacífico de forças”, única possível pelo ainda baixo desgaste das formas burguesas de dominação “democrática”, dentro da qual a tática eleitoral poderia, em determinados períodos e situações, ser condizente e útil – porém, transitoriamente, a depender do desenvolvimento das condições.
É naquele contexto, especificamente naquele, que Lenin critica por “esquerdistas” as táticas de boicote que, em geral, partiam de premissas corretas, mas erradas no caso concreto porque iam muito além da consciência das grandes massas populares ainda não experimentadas o suficiente na dominação contrarrevolucionária parlamentar e, por isso, inaptas a apoiar as ações revolucionárias das massas avançadas. Lenin aponta que nestas condições, táticas de assalto imediato ao poder só afastariam a vanguarda proletária do grosso das massas e fracassariam. Ele também aponta ser o “esquerdismo” uma reação subjetivista e unilateral de luta contra o direitismo, devendo por isso ser combatido, porém sem esquecer-se de que aquele é o perigo principal.
Porém, vejamos o que mais Lenin diz sobre o caráter da participação no parlamento naquele contexto histórico, em tese da Internacional Comunista, de 1920: “O Parlamento não pode ser para os comunistas, atualmente, e em caso algum, o teatro de uma luta por reformas e pela melhoria das condições de vida da classe operária, como outrora. O centro de gravidade da vida política deslocou-se do Parlamento e de forma definitiva”. “Por consequência, não se pode pôr a questão da utilização das instituições do Estado burguês senão com o objetivo da sua destruição”.
Recordemos que Lenin repisara que em outras condições “se é possível e até obrigatório” abandonar a participação na eleição e no parlamento. Eis que nossos eleitoreiros dão uma aula de dogmatismo para justificar sua defesa do reformismo de fato.
O contexto da atual farsa eleitoral
A participação eleitoral é, para o revisionismo, questão de princípio, na prática. Lenin é enfático: boicotar ou participar da farsa eleitoral é um problema tático e deve ser tomado de acordo com as condições concretas. Quais são as condições concretas?
O mundo de hoje marcha em uma situação revolucionária de desenvolvimento desigual. Dentro dele, no Brasil – como país dominado e oprimido pelo imperialismo, principalmente ianque (Estados Unidos, USA) – esta situação revolucionária se alterna entre ora estacionária, ora em desenvolvimento (o caso de hoje), porém já muito acentuada. A base mesma é a crise geral de decomposição do capitalismo burocrático, agravada a cada crise cíclica de superprodução, sem plena recuperação mesmo nos marcos do capitalismo por sê-lo deformado, burocrático, em meio a uma crise geral do imperialismo, a cada dia sem precedentes, acompanhada de acentuada reacionarização do Estado. Isto é, restrição gradual e permanente de direitos democráticos, trabalhistas e individuais, militarização de toda a sociedade e do Poder político, de forma evidente ou mascarada.
Situação de desgaste sem igual do regime de democracia burguesa, no mundo e especialmente no país, após pelo menos 120 anos de experiência das massas na dominação “democrática”, sobretudo após o último ciclo iniciado em 1988, com arremedos de república democrática, em realidade, atada à essência latifundiária e oligárquica nunca superada.
Situação na qual as eleições são a forma principal de política contrainsurgente do imperialismo em todo o mundo, política impulsionada desde os anos 1980 com o início da ofensiva contrarrevolucionária geral, que combina com a desmoralização em massa das mesmas. Contudo, em meio à crise geral tão grave, as eleições são, mais do que nunca, chave para manter a velha ordem. Situação em meio à ofensiva estratégica da Revolução Proletária Mundial expressa em todas essas condições objetivas, em uma Nova Grande Onda de tormentosas lutas de massas que necessitam ser mais impulsionadas e sob direção proletária.
Ademais de seus protestos cotidianos, ainda atomizados, mas cada vez mais cruentos, as massas não só rejeitam a farsa eleitoral e seu sistema político quando não votam: nos dão, diuturnamente, outras manifestações, como a ausência completa de credibilidade mesmo quando votam, por exemplo, vendendo seu voto. Claro que nisso não há consciência revolucionária, mas por ser uma contestação há nelas um “broto de consciência” – como dissera Lenin, referindo-se aos operários que destruíam suas máquinas no início do capitalismo – do que realmente é essa velha democracia. Outro sintoma é o crescimento do fascismo entre as massas como desprezo à velha ordem política.
Baseando-se em Lenin, é possível dizer que “os de cima”, no Brasil, já não podem governar como antes, fato que os obriga a pôr em marcha um golpe de Estado militar contrarrevolucionário preventivo; e os “de baixo” já não aceitam, como demonstraram nos sucessivos boicotes eleitorais, nos Levantes de 2013-2014 e nas centenas de protestos e revoltas país afora, embora espontâneos, carecendo de organização classista e de uma direção sólida para as amplas massas. Este é o fator subjetivo, que depende da ação consciente dos revolucionários proletários, cuja forma de acúmulo de forças para a Revolução, pelo atual nível de consciência das massas, só pode ser obtido no turbilhão mais indomável da luta de classes, cujo boicote à farsa eleitoral é um importante impulsionador. Ao contrário do verdadeiro show de mentiras das campanhas eleitorais, as ações revolucionárias de massas, dirigidas pela autêntica vanguarda proletária, convergindo com todo o instinto de classe e nível de consciência das grandes massas oprimidas, conformarão – elas sim – uma irresistível propaganda da Revolução que arrastará, em torno de si, milhares e logo milhões.