PA: Escoamento de produção do latifúndio interdita BR-230 e paciente é carregada a pé por dois km

PA: Escoamento de produção do latifúndio interdita BR-230 e paciente é carregada a pé por dois km

Enfermeira empurra paciente com Covid-19 em meio à longo congestionamento de caminhões transportando soja do latifúndio da região. Foto: Reprodução.

No dia 12 de fevereiro, trabalhadores da saúde tiveram que empurrar pelo acostamento da BR uma paciente diabética com Covid-19 que utilizava cilindro de oxigênio em uma maca por cerca de 2 km. No momento do transporte, a estrada, na altura do km 30 da Transamazônica (BR-230), estava totalmente interditada com caminhões que iam atravessar em balsas para entrega da soja do agronegócio na outra margem onde fica o porto de Miritituba em Itaituba. Caminhoneiros que estavam aguardando gravaram o momento.

Inicialmente a equipe conta com ajuda de outros trabalhadores para retirada da maca da ambulância e chegada no acostamento. Nos vídeos podemos ver que a enfermeira Rebeka e o motorista Wadson transportaram a paciente pelo acostamento da BR para alcançar uma outra ambulância mais próxima do embarque na balsa. Durante o percurso foi registrado uma queda na oxigenação, porém não houve piora e foi possível seguir. Em outro momento, sem gravação, os caminhoneiros abrem espaço para passagem da ambulância, que alcança a paciente e segue até o hospital. A paciente foi internada por volta das 8:30 do dia 12/02. De acordo com boletim de saúde da unidade, tem estado de saúde estável.

Em um vídeo compartilhado nas redes sociais é possível ver a situação do congestionamento e a maca da paciente sendo empurrada por trabalhador de saúde.

Em nota ao monopólio de imprensa, a Secretaria de Saúde do Estado do Pará afirmou que não tem responsabilidade sobre o transporte de pacientes. Enquanto a Secretaria Municipal de Saúde de Rurópolis relatou que os trabalhadores agiram sozinhos e tomou conhecimento da situação por meio da imprensa. Já a Secretaria Municipal de Itaituba prestou solidariedade aos trabalhadores, porém também disse que não sabia do fato.

A equipe estava transferindo a paciente de Rurópolis, distante cerca de 1.170 Km de Belém, para o Hospital Regional do Tapajós em Itaituba, distante cerca de 150 quilômetros. O hospital municipal de Rurópolis, assim como as unidades básicas de saúde exclusivas para Covid-19, sendo uma na zona urbana e outra na altura do km 70 não possuem suporte para casos graves. Enquanto o Hospital Regional de Itaituba estava em obras desde 2012. Ele foi concluído às pressas em julho de 2020 para atendimento inicial apenas de Covid-19 e opera com funcionamento reduzido.

A população da região Oeste do Pará vivencia um novo período de agravamento da pandemia devido ao considerado tripé da morte: SUS em precárias condições, intenso fluxo de soja na região e a circulação de uma nova cepa da Covid-19. Diversas cidades, até mesmo Santarém, decretaram toque de recolher a noite.

PORTOS DA AMAZÔNIA VIRAM NOVA ROTA DAS COMMODITIES DO LATIFÚNDIO.

O monopólio de imprensa trata o fato como heroísmo, porém, na realidade, expõe nacionalmente as precárias condições do SUS na Amazônia e o modo como o agronegócio prejudica diretamente a vida do camponês da Amazônia, que ainda precisa lidar com a pistolagem e a grilagem diariamente em suas terras.

A cidade de Santarém já conta com um grande porto para exportação de soja do agronegócio. O porto da Cargil, em funcionamento desde 2003, desde sua liberação pelo velho Estado em 1999, camponeses e trabalhadores organizaram diversos atos contra sua instalação. Não foram realizados estudos sobre o impacto ambiental do porto na região, nem mesmo pelos órgãos legais.

Os estudos de impacto ambiental financiados e gerenciados pela Cargill iniciaram apenas em 2008, sendo concluídos em 2010. Em 2011 o Ministério Público do Pará denunciou diversas fraudes nos Estudos de Impacto Ambiental. Apesar disso, em 2015 a Cargill concluiu a obra de ampliação do mesmo porto que atualmente possui capacidade para exportar 5 milhões de toneladas de soja por ano e segue funcionando normalmente apesar da gravidade da pandemia na Amazônia.

O AND também vem denunciando outras ações de expansão da Cargil na região. Em 2018 foi anunciado a compra de um terreno com cerca de 400 hectares para formação de outro porto de soja, buscando aumentar a exportação pela região. 

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Em entrevista para a revista Amazônia Latitude, um pescador que preferiu não se identificar devido represálias do agronegócio, denuncia diversos impactos ambientais provocados apenas pela Cargill, além da ampla utilização de trabalhadores de outros Estados, situação bem diferente da afirmada pela empresa na década de 2000. 

Ele diz: “Depois que a Cargill veio para cá, essa praia acabou, sumiu. As pessoas deveriam estudar bem o impacto que uma empresa dessas traz para a cidade, né? Porque de benefício mesmo para nossa região ela não trouxe nada. Até, principalmente, os funcionários dali: a maioria é de fora, não tem funcionário da região. Os funcionários da região são só aqueles para abrir portão, fechar portão, mas de alto escalão aí dentro não tem. Vem tudo de fora”.

A expansão também avança para o porto de Miritituba, distrito de Itaituba, onde estão sendo realizadas as construções e licenciamento ambiental de 5 ETCs: ETC Bunge/Unitapajós, ETC Cargill, ETC Hidrovias do Brasil (HBSA), ETC Cianport e ETC Rio Tapajós Logística.

Há também previsão para construção de outras ETC no distrito de Santarenzinho em Rurópolis. A cidade é uma das diversas fundadas na Amazônia pelo Programa de Integração Nacional durante o regime militar fascista. Fundada em 1974, em um caótico processo, se localiza no entroncamento da Transamazônica com a Santarém – Cuiabá apresentando logística favorável aos interesses do latifúndio. Apenas na ETC de Rurópolis o agronegócio estima alcançar cerca de 14,3 milhões de toneladas de soja por ano.

As Estações de Transbordo de Carga (ETCs), assim chamados os enormes silos, vem se tornando uma alternativa ao transporte de soja pelo porto de Santos (SP), os navios seguem pela hidrovia Tapajós-Amazonas até os portos de Santarém, Barcarena, Belém e Santana (AP), mais próximos do oceano e onde é possível a atracação de navios de maior porte.

Associado a isso em 2020, apesar da pandemia e da grave crise financeira do capitalismo burocrático, foi concluído o asfaltamento da Santarém (Cuiabá) no trecho entre Sinop (MT), distante cerca de 480 km de Cuiabá, e o distrito de Miritituba-Itaituba (PA), distante cerca de 1.300 km de Belém. Desde então o fluxo de caminhões de soja vem crescendo rapidamente e caoticamente.

O agronegócio tem planos mais danosos aos povos da região com a construção de mais um grande projeto na Amazônia. A Ferrogrão pode atingir uma extensão total de 1.142 km para ampliar a exportação de soja e milho e a importação de agrotóxicos pelos portos da Amazônia. Inicialmente serão construídos 933 km no trecho paralelo ao da BR Santarém-Cuiabá com orçamento previsto em R$ 12,6 bilhões e com recursos do velho Estado.

O AND vem noticiando não somente os danos de mais um grande projeto como também a resistência organizada dos camponeses, trabalhadores e povos indígenas contra o latifúndio e o Velho Estado na região.

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O ato organizado em agosto de 2020 contou com cerca de 200 indígenas Kayapós, com pinturas de guerra que interditaram por mais de 24h a Santarém Cuiabá na altura do km 302. 

Foram utilizadas barricadas de pneus e pedaços de madeira na ponte sobre o Rio Disparada. Em frente as barricadas havia uma faixa com a frase: “Em defesa da Amazônia. Sem ouvir indígenas, não terá concessão e Ferrogrão. Não aceitaremos”.

A justiça burguesa mais uma vez atuou firme da defesa dos interesses do latifúndio, ainda pela manhã a juíza federal Sandra Maria Correia da Silva, da comarca de Itaituba, determinou a retirada do bloqueio pela Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF) e estipulou multa diária de R$ 10 mil aos povos indígenas Kayapós em caso de descumprimento. Contudo a interdição seguiu até as 11 horas da manhã do dia 18/08, denunciando o traçado da ferrogrão que no projeto original passa a apenas 50 Km das Terras Indígenas (TIs) Baú e Mekragnotire, onde vive o povo Kayapó Mekragnotire

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