Na manhã do dia 9 de novembro, aproximadamente 150 pescadores, ribeirinhos, camponeses e indígenas Xipaya e Kuruaya dos municípios de Altamira, Senador José Porfírio, Brasil Novo, Anapu e Vitória do Xingu fecharam o quilômetro 27 da BR-230 (Transamazônica) em protesto contra a empresa Norte Energia, responsável pela usina hidrelétrica de Belo Monte (PA), que controla o nível de água na Volta Grande do Xingu, trecho de cerca de 100 km do rio Xingu.
Indígenas, camponeses e ribeirinhos se unem em protesto exigindo liberação de água. Foto: Lilo Clareto/Xingu Vivo
O protesto, que se estendeu até o dia 12/11, exigia a liberação de água suficiente para possibilitar a realização da piracema na Volta Grande do Xingu. Segundo manifestantes, o baixo nível de água em tal trecho impediu a realização desse fenômeno natural nos últimos três anos, fato que vem desencadeando não somente um rápido despovoamento de peixes no local como também uma crise na segurança alimentar e na renda dos que vivem da pesca. O baixo nível de água também compromete a navegação no rio Xingu, prejudicando o fluxo de mobilidade das comunidades locais que já se encontram, além disso, sem acesso à água potável e à energia elétrica.
Tal situação se dá desde maio de 2016, início do funcionamento da Belo Monte, quando as águas antes destinadas às comunidades locais passaram a ser desviadas para as turbinas da hidrelétrica. Entretanto, o problema tomou uma proporção ainda maior este ano devido a pandemia de Covid-19.
Faixa erguida por população conclama: “Água para a Volta Grande! Piracema 2020”. Foto: Ana Barbosa/Xingu Vivo
O ‘hidrograma de consenso’ da Norte Energia
O volume de água demandado pela Norte Energia para movimentar Belo Monte chega a reduzir em 80% a vazão normal da Volta Grande do Xingu. Esse esquema que a empresa queria impor desde novembro de 2019 foi chamado de “hidrograma de consenso”. Devido à total inviabilidade de tal proposta, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) emitiu um despacho, no início de 2020, no qual estipula um hidrograma alternativo que não comporta a reprodução da vida da fauna e das atividades que garantem a subsistência das comunidades locais – afirmam manifestantes. Tramita no judiciário processo em que a Norte Energia perdeu em primeira instância, mas recorreu no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em Brasília.
Protesto contra empresa Norte Energia se estende por três dias. Foto:Mauro Suzuki/Xingu Vivo
Estresse hídrico provocado pela Belo Monte afeta comunidades locais
Ainda neste ano, o rio Xingu enfrentou uma das piores secas das últimas cinco décadas. Em outubro, o volume de água do rio sofreu uma redução de aproximadamente 40% em comparação ao mesmo mês do ano de 2019. Em decorrência disso, muitos igarapés tributários secaram, ocasionando uma mortandade de peixes e provocando uma perda expressiva das roças dos camponeses de Volta Grande do Xingu.
Conforme denunciado pelos camponeses, o estresse hídrico causado pela Belo Monte tem gerado não apenas a morte da fauna e da flora em torno do Xingu, mas também tem afetado a produção de alimentos e a atividade econômica das famílias que vivem da agricultura.
A região de Volta Grande Xingu abarca 23 comunidades e demais etnias indígenas (Kuruaya, Xipaya e Yudjá/Juruna), sendo que duas ainda lutam pela demarcação de suas terras. Essas populações que ali habitam são as que mais sofrem com o atual cenário de calamidade do Xingu provocado pela usina hidrelétrica de Belo Monte.