PMs participaram na tortura de camponeses no RS, aponta investigação

PMs participaram na tortura de camponeses no RS, aponta investigação

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Policiais Militares estão sendo investigados por participar na tortura de mais de 200 camponeses submetidos à relações semifeudais na colheita da uva das vinícolas latifundiárias Aurora, Cooperativa Garibaldi e Salton, em Bento Gonçalves, na serra gaúcha. O caso envolvendo o chamado “trabalho análogo à escravidão” foi denunciado pela primeira vez no dia 22 de fevereiro, após dois trabalhadores fugirem. 

Em depoimentos prestados após o resgate, homens relataram que foram espancados e ameaçados por PMs. Segundo os relatos, policiais tinham um acordo com o proprietário do alojamento onde os camponeses eram mantidos em condições precárias durante a colheita da safra de uva. 

De acordo com um dos camponeses, um suposto PM, identificado como “sargento” teria dito que “quem reclamasse ou filmasse as condições da pousada seria morto”. Testemunhas que socorreram trabalhadores que fugiram do alojamento contam que eles imploraram para que não fosse acionada a PM porque tinham receio de represália.

Vinícolas latifundiárias culpam programas sociais por trabalho escravo

O Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves (CIC-BG), associação que representa as vinícolas envolvidas no caso, manifestou-se responsabilizando programas sociais pelas condições servis impostas aos camponeses.

Em nota, a entidade refere-se a programas sociais do governo federal, como o Auxílio Brasil, e afirma que “há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade”. Além disso, a entidade também afirma que o motivo da situação servil dos camponeses é a “falta de mão de obra e a necessidade de investir em projetos e iniciativas”.

Vereador reacionário “sugere” que latifundiários não contratem baianos

O vereador de Caxias do Sul (RS) Sandro Fantinel (Patriota), ao abordar o caso dos trabalhadores resgatados em situação servil em sessão ordinária, no plenário da Câmara de Caxias do Sul, “sugeriu” para as vinícolas latifundiárias da região dar a preferência a “trabalhadores argentinos”, que seriam “limpos, trabalhadores, corretos”. Ele também afirmou que “com os baianos, que a única cultura que têm é viver na praia tocando tambor, era normal que fosse ter esse tipo de problema”. Ele chamou o caso de “exagerado e midiático”.

Tanto a associação de vinícolas, como o vereador racista, não gastaram nenhuma palavra para se referir sobre aqueles que impõem e são beneficiados por tal regime de exploração semifeudal, ou seja, os latifundiários e o sistema econômico do velho Estado brasileiro.

Caso expõe regime de “barracão” e repercute nacionalmente

O caso dos 207 camponeses encontrados em situação “análoga à escravidão” na serra gaúcha rápidamente ganhou repercussão nacional. Isto se dá porque o povo brasileiro, que também sofre a opressão do velho Estado latifundiário-burocrático, que lhes impõem fome e miséria, prontamente se solidarizou com os camponeses em situação servil. 

Tão familiar quanto a exploração, é a violência policial sofrida pelas massas populares, que neste caso era usado como forma de garantir o  velho regime de “barracão”, ao qual está preso uma grande parcela do campesinato pobre do país. O sistema é exemplificado na fala de um trabalhador oprimido pelas vinícolas ao monopólio de imprensa G1: “Não tem como a pessoa ir para casa, porque eles prendem a gente de uma forma que ou a gente fica ou, se não quiser ficar, vai morrer. Se a gente quiser sair, quebrar o contrato, sai sem direito a nada, nem os dias trabalhados, sem passagem, sem nada. Então, a gente é forçado a ficar”. Os camponeses também denunciaram que eram indicados a comprarem comida em uma loja que praticava preços elevados, como um saco de feijão por R$22, para mantê-los endividados com a empresa latifundiária.

O artigo “Latifúndio e servidão: irmãos siameses”, publicado por AND atesta que, nos casos de regime de barracão, “o semiproletário do campo, levado à fazenda como assalariado devido a um longo processo de expropriação pelo latifúndio feudal-burguês, é convertido rapidamente em servo. Ele, aparentemente assalariado, é obrigado a comprar com o senhor os bens de consumo a preços hiperinflacionados, forma através da qual o senhor, na prática, toma-lhe o ‘salário’ que lhe pagou. Na prática, o camponês pobre sem nenhuma terra trabalha na terra do senhor, entregando-lhe a renda-dinheiro, trabalho gratuito, torna-se preso à terra”.

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