Bertolt Brecht (1898-1956) foi um escritor comunista alemão, cujo natalício completou 124 anos no dia 10 de fevereiro.
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Aqueles que se sentaram em cadeiras de ouro para escrever
serão interrogados
pelos que teceram seus vestidos.
Não serão por seus pensamentos sublimes
que analizarão seus livros, senão
por qualquer frase casual que transpareça
alguma característica de quem os teciam os vestidos;
e esta frase será lida com interesse porque pudera nela conter
os traços de antepassados famosos.
Literaturas inteiras,
escritas em seletas expressões,
serão investigadas para encontrar indícios
de que também viveram rebeldes onde havia opressão.
Invocações de súplica a seres ultraterrenos
provarão que seres terrenos se impunham sobre seres
terrenos.
A música exótica das palavras dará somente notícia
de que não havia comida para muitos.
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Porém, por sua vez, serão exaltados
os que no assoalho sentavam-se para escrever,
os que se uniram aos de baixo,
os que se uniram aos combatentes.
E os que informaram dos sofrimentos dos de baixo,
os que informaram dos feitos dos combatentes,
com arte, na nobre linguagem
antes reservada
à glorificação dos reis.
Suas descrições de situações de luto, seus
chamamentos,
ainda levarão a impressão digital
dos de baixo. Porque a estes foram transmitidos, e estes,
em suas camisas suadas, as repassaram
por através dos cordões policialescos
a seus irmãos.
Sim, um tempo virá
em que estes sábios e amáveis,
cheios de ira e de esperança,
que se sentaram no assoalho para escrever
e estavam rodeados de povo e combatentes,
serão publicamente exaltados.
Bertolt Brecht em seu escritório, em 1937. Foto: Reprodução