O Slam das Gurias completou seis anos de trajetória em Curitiba como espaço de resistência e expressão cultural para mulheres e pessoas trans no Paraná. Fundado em março de 2019, o coletivo surgiu durante as manifestações do 8 de março (Dia Internacional da Mulher Trabalhadora) e consolidou-se como a única competição de poesia falada com recorte de gênero no estado, parte do circuito mundial de slams.
Mais que uma competição de poesia, o Slam das Gurias é uma foma das participantes falarem de revoltas e desejos por transformação. “Não competimos entre nós, e sim nos unimos contra o sistema e as opressões”, afirmam as organizadoras.
A característica autobiográfica da poesia marginal, gênero predominante nas apresentações, permite que as participantes – em sua maioria mulheres periféricas de Curitiba – compartilhem histórias pessoais que refletem contradições sociais mais amplas.
“O slam das gurias tem uma enorme importância dentro e fora do movimento slam no Paraná. Além de garantir vagas de pessoas trans e mulheres na etapa estadual da competição, também acaba sendo um local onde muitos começam a participar e se desenvolver na cena”, explicam as organizadoras.
Valorização do trabalho artístico
Uma das principais bandeiras do coletivo é a luta por melhores salários no trabalho artístico e contra a precarização das condições de trabalho. “Lutamos contra a terrível exploração do trabalho artístico, principalmente de artistas de rua e periféricos. Por isso, para além da tradicional competição, realizamos edições especiais e buscamos diferentes formas de pagar nossas artistas”, destacam as integrantes do Slam das Gurias.
O coletivo tem conquistado editais municipais e estaduais, além de parcerias com pequenos comerciantes, sempre priorizando a remuneração das artistas e incentivando que elas cobrem pelos seus trabalhos.
Em 2025, o Slam das Gurias alcançou uma importante conquista: a aprovação em um edital cultural que permite realizar edições mensais nas Casas da Leitura de diversos bairros de Curitiba.
A primeira edição de 2025 ocorreu na Casa da Leitura Hilda Hilst, no bairro Cajuru, e a segunda na Casa da Leitura Walmor Marcellino, no Sítio Cercado. A próxima edição está marcada para 24 de maio, na Casa da Leitura Laura Santos, no Tatuquara.
Intimidação policial
A segunda edição do ano, organizada na Casa da Leitura Walmor Marcellino, chocou com os desafios enfrentados pelos movimentos culturais periféricos. Localizado em frente a um módulo da Guarda Municipal, o evento sofreu intimidação velada desde o início.
Segundo relato das organizadoras, durante a montagem do evento, um guarda abordou o grupo questionando se iriam “tocar pancadão”, em tom preconceituoso contra a cultura periférica. Após esclarecimento de que se tratava de um evento literário, o guarda recuou, mas a intimidação prosseguiu.
Durante toda a realização do slam, três a quatro viaturas permaneceram estacionadas em frente ao local, com guardas de braços cruzados observando as participantes. O clima de tensão atingiu seu ápice durante a apresentação de uma poeta travesti, quando uma viatura passou lentamente ao lado.
“O clima no nosso evento nunca foi tão desconfortável e um espaço que deveria ser de acolhimento se tornou de opressão velada”, relatou uma das organizadoras.
Um espaço de cultura e resistência
Apesar dos desafios, o Slam das Gurias segue como um importante espaço de formação e descoberta de novos talentos. “Temos exemplos de poetas que recitaram pela primeira vez em nosso slam e hoje são grandes artistas trabalhadoras da cultura, fazendo música, performances e cobrando pelos seus trabalhos de forma profissional”, contam as organizadoras.
O movimento slam, que surgiu na década de 1980 em Chicago (EUA) e chegou ao Brasil em 2008, encontrou na periferia brasileira terreno fértil para se desenvolver. Segundo dados do Slam Br (campeonato brasileiro), o país conta atualmente com 210 grupos de slams espalhados pelo território nacional.
Para as organizadoras do Slam das Gurias, mais que uma competição poética, o movimento representa um espaço de acolhimento e escuta para denúncias, principalmente relacionadas à violência e opressão, transformando-se num território de fortalecimento coletivo e resistência cultural.
A próxima edição está marcada para 24 de maio, na Casa da Leitura Laura Santos, no Tatuquara, horário de início às 14 horas.