PR: Avá-Guarani conquistam 3 mil hectares em meio à guerra declarada pelo latifúndio

Acordo de R$ 240 milhões com Itaipu é resposta a 43 anos de resistência, mas não devolve territórios sagrados submersos.
Assembleia reunida após falas e assinaturas. Foto: Richard Wera Mirim/ CGY]

PR: Avá-Guarani conquistam 3 mil hectares em meio à guerra declarada pelo latifúndio

Acordo de R$ 240 milhões com Itaipu é resposta a 43 anos de resistência, mas não devolve territórios sagrados submersos.

A homologação do recente acordo de R$ 240 milhões para compra de 3 mil hectares aos Avá-Guarani no Oeste do Paraná é uma importante vitória, mas que é conquistada sob um solo vermelho de sangue e uma demarcação longe de ser suficiente. Assinado na última segunda-feira (24/3) durante a Assembleia Geral da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), o pacto surge como uma resposta tardia ao alagamento de 19 Tekoha, do território Guarani, durante a construção da Hidrelétrica de Itaipu. O crime que expulsou milhares de pessoas de suas casas e submergiu locais sagrados.

A CGY é hoje a principal articulação Guarani no Sul e Sudeste desde 2006 e nessa semana leva sua importante Assembleia para a Tekoha Aty Mirim, reunindo mais de 1000 lideranças indígenas para tratar de inúmeros assuntos, sendo o centro deles sua histórica e necessária luta pela terra. Durante a assinatura do acordo, o Cacique Celso Japoty Alves, do Tekoha Ocoy, desnudou a contradição do acordo que é apresentado, entre a alegria da conquista e o conhecimento da insuficiência do acordo:

“Não foi fácil negociar esse pequeno hectare […] Não é doação, é restauração mínima que ele poderia fazer. Meu sonho não é 3000 hectares, mas que todo território seja demarcado. Não queremos que na próxima assinatura seja assinada no nosso sangue.”

O Cacique Celso, em sua breve fala de cinco minutos, expôs com clareza a realidade que permeia a conquista do recente acordo de compra de terras. Ele destacou que tal acordo não foi fruto de negociações pacíficas, mas sim conquistado através da luta e do sangue derramado pelos povos indígenas. Denunciou também o genocídio contínuo contra os Avá-Guarani, evidenciado pela sequência de ataques violentos que marcaram o início deste ano, deixando indígenas baleados na região.

O cacique enfatizou que a área adquirida representa apenas uma fração ínfima do território ancestral dos Avá-Guarani. Apesar da aparente vitória, ele denunciou o caráter perverso do modelo estatal que paga vultosas quantias ao latifúndio por terras que já pertenciam historicamente aos povos originários. O valor de R$ 240 milhões destinado à compra dessas áreas levanta questões profundas sobre a lógica que sustenta esse sistema. Enquanto os Avá-Guarani resistem há séculos à colonização e ao esbulho territorial, o Estado enriquece latifundiários em processos que não confrontam a histórica apropriação criminosa das terras indígenas.

A construção da hidrelétrica de Itaipu, concluída em 1982, é um marco desse processo de violência colonial. Com a inundação de 135 mil hectares e a remoção forçada de 40 mil pessoas, entre indígenas e não indígenas, os danos aos Avá-Guarani transcendem os impactos materiais. Lugares sagrados como as Sete Quedas foram submersos, e cemitérios ancestrais permanecem sob o reservatório da usina. A destruição espiritual e cultural é irreparável, como expressaram os próprios Avá-Guarani em carta:

O impacto que a Itaipu cometeu em nosso Tekoha Ymã […] teve proporções que vão muito além dos danos físicos e materiais. […] Construir a Usina em cima de nossa Itaipu, e ainda usar o nome para batizar a usina, alagar as Sete Quedas e os nossos cemitérios foi um crime, uma violência sem precedentes.”

Os Avá-Guarani definem o recente acordo como um “ato simbólico” que reflete a história de opressão e resistência em que foi forjado. Trata-se de uma pequena parcela de terra insuficiente para garantir uma vida digna aos indígenas e incapaz de enfrentar o saque histórico promovido pelo latifúndio. O Estado, ao invés de reparar os crimes históricos, perpetua sua conivência com o latifúndio ao recompensar criminosos com cifras milionárias por pedaços mínimos das terras roubadas.

Essa realidade escancara o caráter semicolonial do Estado brasileiro, cuja política serve aos interesses do latifúndio e das classes dominantes enquanto oprime os povos originários. A luta dos Avá-Guarani é um exemplo vivo da resistência popular contra esse sistema opressor, reafirmando que somente pela organização e pela luta será possível conquistar verdadeiras transformações.

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