Provocações golpistas eclodem após derrota eleitoral de Bolsonaro

Provocações golpistas eclodem após derrota eleitoral de Bolsonaro

Rodovia Dom Pedro, na altura do km 55, na região de Atibaia, no interior de São Paulo, em 1 de novembro. Foto: Reprodução/Luis Moura/WPP /Estadão Conteúdo

Seguindo a diretriz do candidato à reeleição derrotado, dezenas de milhares de pessoas, dentre provocadores e eleitores de Jair Bolsonaro, fecharam rodovias por todo o país desde o fim da apuração dos votos, em 30 de outubro. O ápice da mobilização da extrema-direita ocorreu entre a noite de 31/10 e a tarde de 01/11, quando 26 estados registraram bloqueios (apenas o Amapá ficou de fora). Na noite de 31/10 eram 321 bloqueios ativos, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Mesmo após o candidato derrotado pronunciar-se, por duas vezes, pedindo o fim dos cortes de rodovias, as mobilizações seguiram (embora perdendo força). No dia 02/11, feriado, manifestações em frente a quartéis ocorreram em 20 estados e no Distrito Federal e somaram-se ao quadro de agitação e provocações golpistas.

Os apoiadores de Jair Bolsonaro questionam o resultado das eleições e promoveram as manifestações exigindo “intervenção federal”, “intervenção militar”, “anulação das eleições”, “prisão de ministros do STF”, dentre outras pautas insufladas à exaustão por Jair Bolsonaro ao longo dos últimos anos. Investigações estão sendo conduzidas pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Polícia Federal (PF) sobre a participação ou omissão do diretor da PRF e também sobre financiamento de grandes empresários bolsonaristas. Além disso, a permissividade dos generais do Alto Comando é um elemento presente da atual situação.

OS BLOQUEIOS

Ocorridos em mais de 300 pontos, os bloqueios à rodovias tiveram início na cidade de Palhoça, em Santa Catarina. Na noite de 30/10, caminhoneiros e outros apoiadores de Bolsonaro trancaram a BR 101 bem em frente às lojas Havan (do empresário bolsonarista e sonegador de impostos Luciano Hang). Logo, bloqueios semelhantes se espalharam por todo o país.

No dia 02/11, durante o bloqueio da rodovia Washington Luís, em Mirassol (interior de SP), um carro atropelou um grupo de manifestantes, atingindo pelo menos nove pessoas. O motorista foi alvo de tentativa de agressão por parte dos manifestantes e o carro foi depredado.

Também no dia 02/11, manifestações ocorreram em frente a quartéis e prédios militares de todo o país. Em SP, mais de 30 mil apoiadores de Bolsonaro pediram intervenção militar em frente  ao Comando Militar do Sudeste. No mesmo dia, milhares protestaram no RJ, na Avenida Presidente Vargas, em frente ao Comando Militar do Leste. No RJ,  manifestações também ocorreram na Vila Militar, em Deodoro.

DIRETOR DE POLÍCIA É CONIVENTE

O atual diretor da PRF que está sendo investigado por estimular (direta ou indiretamente) as manifestações da extrema-direita, Silvinei Vasques, foi nomeado por Jair Bolsonaro em abril de 2021. Próximo de Flávio Bolsonaro, Silvinei Vasques foi responsável por conduzir operações da PRF (“blitzes”) em transportes coletivos no dia da eleição, sobretudo no Nordeste, onde Bolsonaro tinha menor margem de votos.

A PRF, sob o comando de Silvinei, está sendo investigada por não atuar para impedir os bloqueios, mesmo sabendo dos preparativos, e inclusive por atuar em apoio aos provocadores. O MPF solicitou à PF que apure ações irregulares ou omissões de Silvinei. A jornalista Malu Gaspar divulgou reportagem em que afirma que ouviu integrantes da PRF que garantem que a cúpula do órgão fez “corpo mole”, não se programando para a crise com antecedência, mesmo após o setor de inteligência da corporação ter identificado a mobilização prevista para ocorrer após as eleições no caso de derrota de Jair Bolsonaro – fato sabido por todos, inclusive pelo ACFA. “A lentidão contrasta com o aparato de peso observado em rodovias de todo o país, em especial no Nordeste, durante a votação no último domingo”, afirma a reportagem.

No ápice dos bloqueios, Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), determinou que a PRF e as Polícias Militares (estaduais) atuassem para a imediata desobstrução de vias ocupadas ilegalmente (o que não foi cumprido na totalidade). A decisão, que foi confirmada pela maioria dos ministros do STF no dia seguinte, determinava também que, no caso de descumprimento da decisão, o diretor da PRF deveria pagar multa de R$ 100 mil por hora e ser afastado do cargo e preso em flagrante por desobediência.

FINANCIAMENTO DE MILIONÁRIOS  BOLSONARISTAS

Diferentemente de outros protestos que fecham rodovias, cujas pautas são sempre reivindicativas (seja de caminhoneiros, seja de trabalhadores do campo ou da cidade, tratam-se sempre de lutas por direitos), desta vez, os manifestantes exigem a permanência do ultrarreacionário Bolsonaro no governo, intervenção federal, intervenção militar e outras pautas políticas da extrema-direita derrotada eleitoralmente. Convocados a partir de redes sociais desde o primeiro turno da farsa eleitoral, os bloqueios de rodovias foram estimulados por centros de agitação bolsonaristas (perfis em redes sociais, influenciadores digitais, políticos reacionários e grandes empresários bolsonaristas). A PF conduz investigações em todas os estados para identificar possíveis financiamentos aos bloqueios de rodovias. Dentre as suspeitas investigadas, está a coordenação a partir de grupos de grandes empresários.

Além disso, nas redes sociais crescem denúncias de que caminhoneiros estão sendo obrigados por seus patrões a irem para as rodovias. Em muitos casos, os caminhoneiros afirmam que votaram no PT. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTTL) afirma que há grupos armados que estão ameaçando e forçando trabalhadores a bloquearem as rodovias.

Em 2021, foi comprovada a existência de uma rede de financiamento promovida por grandes empresários bolsonaristas (como Luciano Hang) à atuação da extrema-direita. O beneficiado era o blogueiro Allan dos Santos e a organização financeira contava com participação do próprio Eduardo Bolsonaro.

O QUE SABIA O ALTO COMANDO?

Antes do pleito, o próprio Alto Comando das Forças Armadas já estava ciente das mobilizações: reportagem do monopólio Gazeta do Povo afirmou que militares da ativa e da reserva expressavam preocupação de que “uma eventual derrota de Bolsonaro nas urnas” levasse a manifestações de ruas em protestos contra o TSE o STF. A reportagem afirma expressamente que existia (desde antes do pleito) “a preocupação de que as forças auxiliares de segurança pública possam ser insuficientes para eventualmente conter e apaziguar possíveis conflitos”. Nesta hipótese, as Forças Armadas seriam responsáveis por conduzir operações de “Garantia da Lei e da Ordem” (GLO).

Um dos setores mais importantes no atual bloqueio – em parte chantageados, em parte instigados pelos agentes infiltrados do bolsonarismo –, os caminhoneiros são alvo de constante vigilância, chantagem e infiltração de espiões militares. Desde a grande greve dos caminhoneiros ocorrida em 2018, os altos comandantes das Forças Armadas já demonstraram grande preocupação e, mais que isso, passaram a acompanhar atentamente e promover a espionagem  permanente das mobilizações dos caminhoneiros. Toda a maquinaria de inteligência e infiltração de agentes  é operada e centralizada pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que tem à frente o general Augusto Heleno.

AS DUAS DECLARAÇÕES DE BOLSONARO

À primeira fala de Bolsonaro no contexto de sua derrota eleitoral, no próprio Palácio da Alvorada, sucedeu-se a segunda declaração, feita em redes sociais. O ultrarreacionário, após afirmar ter cumprido o objetivo de “dar um recado” e destacar a formação de “líderes de direita [extrema]”, pediu o fim dos cortes de rodovia.

Leia também: Editorial semanal – O ‘terceiro turno’ e as provocações golpistas

O Editorial semanal O ‘terceiro turno’ e as provocações golpistas afirma que “concluída a eleição, a crise política do país dá um salto: os distúrbios bolsonaristas, por meio de bloqueios das rodovias após o resultado do pleito, refluindo logo ou em mais dias, anuncia a nova forma que a crise se revestirá. Bolsonaro fez silêncio absoluto, só se pronunciando depois de 48 horas. Laconicamente declarou que os bloqueios ‘são frutos da indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral’, referindo-se a supostas irregularidades do TSE. Dado seu isolamento na maioria das classes dominantes, emendou que superou as dificuldades ‘mesmo enfrentando todo o sistema’. Bolsonaro concluiu arvorando-se ter levantado os valores da ‘direita’ (extrema-direita), de ‘deus, pátria, família e liberdade’, não reconhecendo formalmente sua derrota, enquanto seguiam as manifestações de choramingas de derrotados por todo o país.”

Além disso, o Editorial de AND aponta que “essas provocações foram preparadas ao longo de muito tempo”, e destaca que “Bolsonaro fez afagos à PRF como promessas, dentre efetivadas ou não, de reajuste salarial e reestruturação de carreira, ademais de expandir a área de sua intervenção além das rodovias, ampliando sua função policial de repressão. Simultaneamente, toda a cautela de Bolsonaro e da PRF em não se chocarem com os interesses imediatos dos caminhoneiros durante os últimos quatro anos não tinha apenas fins eleitoreiros, mas também preparativos de suas provocações golpistas. Nesse período houve ainda a persistente infiltração de agentes de inteligência entre os caminhoneiros, sob coordenação do Gabinete de Segurança Institucional (encabeçado pelo general Heleno), tanto para controlar perigos de greves indesejadas, como para manipulá-las. Os agentes rodoviários federais não apenas não liberaram as vias, como incentivaram os cortes de rodovia, inclusive tomando parte deles, segundo vários relatos.”

Sobre a atuação dos altos mandos das Forças Armadas, afirma que “a atitude, até aqui, é um apaziguamento com as provocações da extrema-direita”.

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