Prisão arbitrária, repressão contra moradores e invasões a domicílios marcaram mais um dia de operação policial contra a favela da Cidade de Deus (CDD), zona oeste do Rio de Janeiro, na manhã do dia 19 de janeiro. A operação ocorreu uma semana após a Polícia Militar (PM) sitiar a comunidade em um outro dia de incursões, no último dia 12 de janeiro.
A operação foi comandada pelo Batalhão de Ações com Cães (BAC) e seguiu os moldes de outras operações policiais que têm ocorrido de forma constante no Rio de Janeiro desde o início do ano em favelas como Jacarezinho e Manguinhos, ambas na zona norte.
Os moradores da CDD denunciaram diversas violações nas redes sociais no dia de hoje. Um morador da comunidade foi arbitrariamente detido em meio a protestos de outros residentes que denunciavam que o jovem carregado à força pelos policiais era um trabalhador. A resposta da PM foi reprimir a massa com sprays de pimenta e avançar com o caveirão sob o povo. Vídeos gravados por moradores e publicados na rede social X, antigo Twitter, registraram o momento.
Moradores também relataram invasões a domicílios em diversas partes da comunidade. Em depoimento ao AND, um morador, que preferiu não se identificar, denunciou que teve a sua casa invadida às 6 horas da manhã por policiais. Os militares reacionários foram flagrados por vizinhos abrindo a sua casa com uma “chave mestra”, equipamento feito para abrir qualquer tipo de fechadura. Denúncias como essas são recorrentes nas favelas do RJ. O morador denunciou a ilegalidade da situação: “é um ataque aos nossos direitos básicos enquanto cidadãos. Dizem que nós vivemos em um país democrático, mas as próprias autoridades não seguem as leis e invadem a casa dos outros”, afirmou, em um áudio enviado à Redação de AND e disponível abaixo.
Ano se inicia com operações policiais por toda a cidade
Após um ano de 2023 marcado por uma rotina quase diária de operações policiais contra os moradores do Complexo da Maré, o ano de 2024 se inicia em um ritmo similar para as favelas cariocas. Desde o dia 1° de janeiro, o Jacarezinho, zona norte, sofreu pelo menos 16 dias consecutivos de cerco e invasão policial. As operações ceifaram a vida de 2 moradores e outros 4 ficaram feridos. A favela do Manguinhos foi palco de uma operação no dia 18/01. Nesta, uma operação prendeu três moradores da comunidade e foi respondida com um protesto no qual os moradores ergueram uma barricada contra a ação covarde. A PM, como sempre, revidou com ameaças e intimidações.
As ações dos moradores a cada operação deixam claro que o povo carioca não suporta mais as invasões e violações de direitos nas favelas. O governo do estado, no entanto, sob o comando do terrorista Cláudio Castro, já deixou claro que o ano de 2024 será uma réplica do que foram os últimos anos de sua gestão, marcados por 3 das 5 maiores chacinas do estado do RJ.
O governo federal também não fala do assunto, e finge que não há, no país, moradores tendo seus direitos mais básicos sendo violados cotidianamente. Mesmo que o governo não possa interferir diariamente, Luiz Inácio nunca tocou no assunto das operações nos últimos encontros com Cláudio Castro, marcados na verdade por trocas de elogios. No ano passado, Luiz Inácio revoltou-se quando moradores do RJ vaiaram o governador em um evento que ambos estavam. Nas últimas semanas, Lula voltou a falar com Castro. Ambos trataram sobre as enchentes no RJ e ações a serem feitas, na velha lógica de fazer da tragédia um palco para capital eleitoral. Sobre as operações, nada foi dito.
Tudo isso se contrasta com o prometido pelo governo durante as eleições. Em 2022, em comício de campanha feito no Complexo do Alemão, disse: “Nós precisamos acabar com essa história de que o Estado só participa na comunidade quando manda polícia. Não é possível que a gente só apareça em páginas policiais, com violência, com mortes, com chacina”.
Fica a questão: o que tem feito Luiz Inácio para impedir a violência policial, e o que ele tem feito senão reforçar a lógica das operações policiais? Foi Luiz Inácio que participou e permitiu o incremento da militarização da cidade ao decretar Garantia da Lei e da Ordem (GLO), enviando tropas do Exército Brasileiro para a cidade no contexto das operações contra o Complexo da Maré, após intensa campanha sensacionalista midiática que noticiou os fajutos “treinamentos militares” mal-executados por grupos paramilitares narcotraficantes no Complexo da Maré. No mesmo período, a Força Nacional só não foi enviada às favelas após uma exigência de que o Ministério da Justiça de Lula se comprometesse formalmente com a garantia de que as tropas respeitassem alguns direitos básicos expressos Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635. Até mesmo para ongs internacionais próximas das posições do governo, como a Human Rights Watch, afirmaram que o Lula falhou no combate ao problema “crônico de violência policial”.
A inação do governo diante da crescente militarização da sociedade aponta para seu agravamento. Neste cenário, a tendência é o crescimento cada vez maior da explosividade das massas em decorrência da rotina insuportável de violações de seus direitos.