Moradores da comunidade Dona Marta, em Botafogo, zona norte do Rio, fizeram um protesto no fim da tarde do dia 6 e bloquearam a importante via do bairro, chamada rua São Clemente.
Os trabalhadores denunciaram que falta de água na comunidade persiste por pelo menos 12 dias. A companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio (Cedae) interrompeu o funcionamento da Estação de Tratamento do Guandu no dia 3, mas retomou a produção de água no dia 4.
CRISE COM DEDO DO GOVERNADOR
Dias antes da crise de abastecimento de água no Rio de Janeiro começar, o reacionário e facínora governador Wilson Witzel conseguiu aprovar na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro uma emenda constitucional que retira mais de R$ 370 milhões em investimentos nas áreas de saneamento básico e segurança hídrica somente este ano. A promulgação da emenda ocorreu dia 19 de dezembro do ano passado.
A medida autoriza a desvinculação das verbas de diversos fundos temáticos do estado do Rio, dando permissão ao Witzel usar os recursos nas áreas que julgar prioritárias.
Dois fundos têm aplicação obrigatória em investimento em saneamento básico e segurança hídrica: o Fundo Estadual de Conservação Ambiental (Fecam), que teve 50% de recursos desvinculados, e o Fundo Estadual de Recursos Hídricos, cuja desvinculação foi de 30%, de acordo com o orçamento aprovado pelo parlamento local.
O Fecam deve arrecadar R$ 705 milhões em 2020, a serem usados em investimentos em saneamento e conservação ambiental, porém com a mudança Witzel poderá retirar até R$ 352,6 milhões do fundo. O montante corresponde a quase 21% de tudo que o estado planejou gastar nas duas áreas este ano, cujas despesas chegam a R$ 1,7 bilhão.
Entre 2003 e 2019, o estado do Rio de Janeiro deixou de investir em dinheiro carimbado para saneamento básico R$ 11 bilhões. Os técnicos da Cedae constataram a presença de geosmina há 15 anos e nenhuma medida foi tomada.
PRIVATIZAÇÃO DA CEDAE
Em meio à crise hídrica que tem levado água com sabor, cheiro e coloração alterados às casas da capital e cidades da Baixada Fluminense, o governador reacionário Witzel anunciou que pretende fazer mudanças no modelo de coleta de esgoto e distribuição de água potável.
Witzel segue a cartilha. Quando um governo quer entregar uma estatal para o capital privado não estatal começa por demitir, terceirizar e sucatear a manutenção dos equipamentos. Assim, com a queda na qualidade do serviço busca justificar a privatização, que leva à piora dos serviços e eleva a exploração dos funcionários. Cada vez que um serviço é privatizado, o valor da tarifa aumenta para garantir o lucro das empresas. Isso gera desemprego, pois demitem trabalhadores de anos e contratam terceirizados, aumentando o lucro da grande burguesia. É o que vem acontecendo com a Cedae. Segundo o último Atlas de Abastecimento Urbano de Água elaborado em 2015 pela Agência Nacional de Águas (ANA), somente 13% da população urbana do estado acha o abastecimento satisfatório.
Isso, logicamente, permanece atual devido à falta de investimentos em melhorias do sistema nos últimos anos. Este processo de desmonte intensificou-se em março do ano passado, quando o presidente da estatal, Hélio Cabral, a mando do governador demitiu, sumária e ilegalmente, 54 técnicos, todos com papel importante no funcionamento da empresa.
Ou seja, decisões estratégicas para o funcionamento da Cedae estão comprometidas porque técnicos altamente capacitados para tomar medidas rápidas a fim de sanar e até mesmo evitar problemas foram demitidos sem qualquer explicação. A crise hídrica que afeta toda a população fluminense poderia ter sido evitada se o corpo técnico estivesse operando plenamente. “Essas dispensas quebram a espinha dorsal da Cedae, pois atingem os pilares estruturais da estatal e, certamente, há uma motivação de dar celeridade à privatização”, alerta engenheiro e presidente da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge), Clovis Nascimento.
Moradores da favela Dona Marta protestaram após completarem 13 dias sem água. Foto: Banco de Dados AND