Reitoria da Unir quer perseguir e criminalizar estudantes em luta. Na foto, manifestação estudantil combativa realizada em Porto Velho (RO) em 18/10/2022. Foto: Banco de dados AND
Mobilizados contra o aprofundamento da perseguição e criminalização da luta em defesa da educação, estudantes e professores da Universidade Federal de Rondônia (Unir) têm rechaçado o “Regulamento de Caça às Bruxas” impulsionada pela Reitoria da instituição. A minuta foi assim batizada pelos estudantes pois propõe uma série de medidas disciplinares para punir os estudantes e atingir em especial o movimento estudantil organizado. O Diretório Central dos Estudantes (DCE), Centros Acadêmicos (CA’s) e também conselheiros afirmam que não aceitarão participar da maquinação, denunciando que não é papel da Universidade reprimir os estudantes como quer a Administração Superior da Unir. Em 2011 uma medida semelhante (a “Lei da Mordaça”) foi derrotada com a Ocupação da Unir que, contando com apoio da população e dos camponeses em luta no estado, mobilizou centenas de estudantes .
Esse ataque à organização dos estudantes acontece em meio a uma ofensiva reacionária contra as universidades do país. Os cortes de verbas das universidades promovidos por todos os governo de turno do velho Estado foram acompanhados, nos últimos quatro anos, da imposição de reitores interventores escolhidos à dedo pelo Ministério da Educação (MEC) do governo de Bolsonaro e generais. Profundamente atacada, a democracia e autonomia universitárias estão sendo defendidas pelas lutas cada vez mais oragnizadas de estudantes que denunciam, por exemplo, as mais de 20 nomeações de reitores interventores, que não estavam em primeiro na lista tríplice ou que sequer participaram do processo de escolha nas instituições.
Sobre a atual medida de “caça às bruxas”, o DCE da Unir afirmou que “a reitoria busca fundamentalmente retirar os instrumentos de luta e protesto do movimento estudantil, bem no estilo autoritário de seus pró-reitores”, destacando que foi o movimento estudantil que impediu o último corte na educação de quase R$ 3 bilhões em 30 de setembro, além de conquistas da própria Unir, como a construção do Restaurante Universitário (RU).
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panfletagem e passagens em salas poderão ser enquadradas como ‘falta disciplinar’
Na proposta de minuta para novo regulamento disciplinar, redigida por um técnico do Núcleo de Saúde (Nusau) da Unir, estão classificadas como “faltas médias” passíveis de suspensão “organizar eventos e qualquer forma de arrecadação, de propaganda, distribuição de impressos, publicação ou divulgação em imprensa falada, escrita ou televisionada em nome da instituição, sem o consentimento da unidade responsável”, assim como “interromper ou conturbar qualquer atividade acadêmica e/ou técnica administrativas nas dependências da Unir, ou fora, quando em visitas técnicas ou atividades complementares, representando-o”.
Como “faltas disciplinares leves”, passíveis de advertência oral ou repreensão, estão as seguintes ações: “Entrar nas dependências restritas sem autorização ou provocar ruídos nas suas proximidades”. Uma simples manifestação que atravesse o campus entoando palavras de ordem poderia ser enquadrada nesta medida disciplinar.
Todas essas atividades são comuns de se ver por todo o País em mobilizações de estudantes na luta em defesa da educação pública, gratuita e que sirva ao povo.
Estudantes se posicionam contra resolução e desmentem alegações
O DCE afirmou, em nota, que o processo correu por debaixo dos panos, “por um testa de ferro, sob a direção da administração superior”, que a proposição foi articulada pela reitoria e anunciada pela pró-reitora Marcele Pereira. Além disto, manifestou “total indignação” e convocou o conjunto dos estudantes a rechaçar a medida.
Rebatendo a maquinação dos reacionários obscurantistas que promovem a caça às bruxas, o CA do curso de Psicologia afirmou, em nota, que se posicionou contra a resolução: “O CAPsi se manifestou em tempo hábil e mantém sua postura contrária”. Destacando que, mesmo procurado, o sujeito não respondeu aos estudantes. Os estudantes de Psicologia afirmaram ainda que tal medida “não está alinhada com os interesses do corpo discente” e criticam a tentativa de passar “a qualquer custo uma minuta que fere os direitos estudantis”. Além disso, demarcam: “Afirmamos que tanto a gestão antiga, Nise da Silveira, quanto a que assume agora, Ignácio Martín-Baró, é TOTALMENTE CONTRÁRIA às propostas de regulamento disciplinar discente. Entendemos que a proposta concede margem para instituicionalização da censura, restrição de autonomia e perseguições às expressões e reivindicações do corpo estudantil.”.
Na nota do DCE, os estudantes afirmam que “a Unir já possui um Regimento Geral que prevê um regime disciplinar para docentes, técnicos e discentes (artigos 207 a 211), não sendo necessário uma resolução com tipificações bem ao gosto do ideário fascista”. Sobre o objetivo da minuta, afirmam que “o que a gestão autoritária da Unir pretende é NORMATIZAR a punição de estudante mais vulneráveis e ativos politicamente.”. Além disso, contudentemente declaram: “O DCE e os CA’s NÃO DISCUTIRÃO NEM PARTICIPARÃO de processos de elaboração de regime disciplinar específico para estudante porque entendemos que esse tipo de medida fere a liberdade de organização e livre manifestação política dos estudantes. O Regimento proposto é uma afronta a todas as conquistas históricas da universidade que garantiram e garantem o livre pensamento, a manifestação de ideias e a produção científica”.
Assinaram também a nota do DCE se posicionando contra o novo regulamento disciplinar o Centro Acadêmico de Jornalismo (CAJOR/UNIR); o Centro Acadêmico de Pedagogia (CAPED/UNIR); o Centro Acadêmico de Enfermagem (CAENF/UNIR); o Centro Acadêmico de Psicologia (CAPSI/UNIR); o Centro Acadêmico de Educação Física (CAEFIS/UNIR); o Conselheiro Discente no Conselho Superior Acadêmico (CONSEA), Heitor Roman; a Conselheira Discente no CONSEA, Vitória da Conceição; a Conselheira Discente no CONSEA – Moara Araujo; a Conselheira Discente no CONSEA, Rosa Guarasugwe; a Conselheira Discente no Conselho de Administração (CONSAD), Poliana Montessi; a Conselheiro Discente no CONSAD, Andrei Siqueira e a Executiva Rondoniense de Estudantes de Pedagogia (ExROEPe)
Enquanto a Reitoria promove perseguição, falta água, luz e assistência estudantil
No mesmo momento em que a burocracia universitária obscurantista se esforça para elevar a perseguição contra o movimento estudantil, os estudantes lutam por direitos básicos, essenciais para estudar e aprender. Reivindicam a finalização da construção e início do funcionamento do RU, direito que é negado aos estudantes desde que a universidade foi criada, há 40 anos atrás. Além disso, um abaixo-assinado com mais de 1,5 mil assinaturas reivindica uma política de moradia estudantil. Atualmente, os estudantes também enfrentam problemas estruturais patentes, como falta d’água e energia elétrica no campus, assim como falhas no site da universidade, deixando alunos sem acesso a documentos.
Na vitoriosa greve de 2011, quando os estudantes ocuparam a reitoria por 56 dias, foram conquistados os RU’s nos campi de Porto Velho, Guajará-Mirim, Rolim de Moura, Cacoal e Ji-Paraná. Entretanto, desde então, várias empresas construtoras faliram, contratos foram quebrados e mais de 10 anos se passaram sem que os estudantes tivessem assegurado o direito à alimentação. A atual reitoria já afirmou que não há perspectiva de abertura dos RU’s antes do 2º semestre de 2023 e as informações sobre a compra de equipamentos para o RU estão em uma licitação junto ao Exército, em um processo sigiloso que não se encontra no orçamento universitário.
Entre o ano de início do abaixo-assinado (2021) até hoje, de acordo com o DCE, a Unir recebeu um valor de R$ 18,8 milhões em emendas parlamentares, o que não foi informado aos alunos.
Estudantes denunciam a atual reitoria
O movimento estudantil da Unir denuncia que a Reitoria, que tem à frente Marcele Pereira, é lenta frente à diversas denúncias de assédio moral e sexual contra professores, técnicos e estudantes, porém é rápida em aprofundar a criminalização contra os estudantes em luta.
A Associação de Docentes da Universidade Federal de Rondônia (Adunir) divulgou uma nota em que repudia o assédio sofrido por um professor no dia 20/11. O docente, que também é chefe de departamento, foi intimidado pela administração da universidade após criticar a situação grave de precarização da infraestrutura do campus de Porto Velho e a falta de professores nos cursos, criando sobrecarga de trabalho.
Já os estudantes denunciam que a reitora Marcele Pereira busca se apresentar como progressista, mas tem em sua gestão apoiadores do governo militar de Bolsonaro e generais. Uma das medidas criticadas foi o convite que Marcele fez ao bolsonarista Marcelo Recktenvald, reitor-interventor na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS). Marcelo foi nomeado reitor da UFFS em setembro de 2019 pelo então ministro da Educação, Abraham Weintraub. Em assembleias dos campi da UFFS, 94,22% da comunidade universitária aprovou sua destituição. De acordo com os estudantes da Unir, convidando Marcelo Recktenvald para palestrar, a reitora da Unir demonstrou o seu apoio ao execrado reitor.
Ocupação de 2011 barrou precarização e criminalização da luta
Não é surpresa que ocorra tamanho ataque à organização estudantil na Unir. Em 2011, o movimento estudantil combativo da universidade realizou uma greve de ocupação de mais de 77 dias, com 56 dias de ocupação do prédio da Reitoria. Os estudantes lutavam por democracia universitária, por uma estrutura digna para os cursos, por laboratórios e por mais professores. A vitoriosa greve de ocupação da Unir de 2011 conquistou a saída do então reitor José Januário de Oliveira Amaral, alvo de investigações por corrupção.
“Aqui não foi ocupação de brincadeirinha. Aqui estávamos preparados para resistir, como resistimos a todas as tentativas de desocupação. De fato, foi uma experiência que significou, de fato, a instauração do co-governo estudantil em uma Universidade. Estávamos com consciência política e moral elevada, tínhamos o apoio de inúmeros professores democráticos, de organizações populares e da população em geral que nos apoiava. Não nos intimidamos com ataques e prisões. Estávamos dispostos a dar o nosso sangue até a vitória final”, foi o que disse, de maneira enfática, uma estudante que dirigiu a greve de 2011 em entrevista ao AND.
Greve UNIR 2011 – Resistimos, Lutamos, com a Greve Triunfamos