Entre os dias 11 e 14 de março, foi realizada a 51ª Assembleia Geral dos Povos Indígenas do Estado de Roraima, com o tema “Defender os Territórios é Garantir a Vida dos Povos Indígenas”. O evento contou com a presença de 1,1 mil pessoas que se reuniram no centro regional Lago Caracaranã, na Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol/RR. Durante a assembleia ocorreu uma ampla discussão, avaliação, questionamentos sobre a situação dos povos indígenas em todo o Brasil. Os povos presentes anunciaram uma nova mobilização de luta nacional.
Estavam presentes lideranças indígenas de 256 comunidades indígenas dos povos: Macuxi, Wapichana, Wai Wai, Yanomami, Patamona, Sapará, Taurepang, Ingarikó, pertencentes às etnorregiões Alto Cauamé, Amajari, Baixo Cotingo, Murupu, Tabaio, Raposa, Serras, Serra da Lua, Surumu, Wai Wai e Yanomami, Warao e E’ñepa, da Venezuela, além de membros do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Associação Yanomami (HAY), Associação dos Povos Indígenas Wai Wai (APIW), Organização das Mulheres Indígenas de Roraima (OMIRR), Organização dos Professores Indígenas de Roraima (OPIRR) e Organização dos Indígenas na Cidade (ODIC-RR).
O evento teve início com uma discussão sobre o direito à terra e sua necessidade para manter a vida, cultura, costumes e tradições dos povos indígenas, bem como sua extrema importância no cultivo das próprias produções agrícolas da comunidade indígena. Os povos reafirmaram: “Vamos lutar pela nossa existência”. Durante o evento os indígenas realizaram denúncias e ao final elaboraram uma carta constando todas elas como também 46 reivindicações.
51ª Assembleia dos Povos Indígenas de Roraima contou com mais de mil participantes e conclamou: “Defender os Territórios é Garantir a Vida dos Povos Indígenas!”. Foto: Lígia Apel
A carta
Os participantes da assembleia denunciaram o genocídio dos povos originários, as invasões das terras indígenas como parte de um projeto do governo militar genocida dos Bolsonaro/generais, que age deliberadamente para incentivar as invasões e ataques contra os povos indígenas. Assim como tem ocorrido com as TI’s Yanomami, onde aproximadamente 20 mil garimpeiros invadiram o território, e pelo menos quatro comunidades indígenas foram destruídas pelos garimpeiros. Cerca de 200 indígenas moram neste território e estão sitiados sob domínio de criminosos. Os indígenas durante a assembléia relataram todos os ataques e as ameaças que as comunidades indígenas yanomamis têm sofrido, relembraram ainda da morte duas crianças sugadas por dragas do garimpo ilegal.
Os indígenas repudiaram as leis e práticas de regularização fundiária que transferem as terras da União (instância federal) para o estado Roraima (instância estadual) sem antes reconhecer o território dos povos originários. Denunciaram conivência do velho Estado com as invasões e grilagens cometidas por latifundiários e a incompetência do judiciário nos processos envolvendo o direito à terra e reafirmaram o direito à auto-organização.
Sobre construções de Usinas Hidrelétricas, os indígenas se posicionaram contra a construção da usina Bem Querer que afetará nove Terras Indígenas (Tabalascada, Malacacheta, Canauanim, Manoá-Pium, Jabuti, Serra da Moça, Yanomami Ye’kwana, Moskow); Também se posicionaram contra a hidrelétrica no Rio Cotingo, que afetará centenas de comunidades indígenas da TI Raposa Serra do Sol; e as termelétricas da Região Serra da Lua, que atingem três Terras Indígenas (Tabalascada, Canaumim e Malacacheta).
Os povos indígenas de Roraima repudiaram a militarização da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Denunciaram o corte de verbas destinadas à saúde indígena que teve uma redução de cerca de 50%, expondo também a prática frequente dos desvio de verbas destinadas a saúde, configurando, junto às outras medidas, um verdadeiro projeto de genocídio dos povos indígenas. A assembleia destacou o absoluto colapso da saúde dos povos Yanomami que vivem um cenário de guerra, com morte de crianças por desnutrição e malária, além da falta de medicamentos e atendimentos.
Os indígenas exigiram construções de escolas indígenas para atender os alunos das comunidades, pois das 167 escolas indígenas do estado de Roraima, mais de 90 não têm uma edificação para abrigar os estudantes. Os povos denunciaram a entrega de materiais escolares danificados, falta de transporte escolar, merenda estragada e relataram a falta de condições dignas de trabalho para os profissionais da educação. Os povos indígenas repudiaram a exoneração do diretor da escola estadual indígena da comunidade Manoá, Região Serra da Lua, executada pelo governo do estado de Roraima, após este se recusar a delatar quem havia feito vídeos denunciando a situação precária da escola. Aproximadamente uma semana após a assembleia o diretor foi readmitido.
Os participantes também prestaram solidariedade aos povos indígenas Warao, E’ñepa, Kariña e Pemon, da Venezuela, que se encontram no estado de Roraima e que sofreram torturas físicas e psicológicas cometidas pelo Exército durante a Operação “Acolhida”, na capital Boa vista.
Ao final do evento, aguerridos, os povos indígena bravaram as seguintes consignas: “Nenhuma gota de sangue indígena a mais! Nenhum direito a menos!”. A assembleia declarou mobilização em âmbito nacional no Acampamento Terra Livre em Brasília e em Roraima no mês de abril e contra o Marco Temporal no mês de junho.
51ª Assembleia dos Povos Indígenas de Roraima prepara mobilização em âmbito nacional no Acampamento Terra Livre em Brasília e em Roraima no mês de abril e contra o Marco Temporal no mês de junho. Foto: CIR