RS: Mais um caso de servidão no interior do estado

RS: Mais um caso de servidão no interior do estado

Foto: Caio Castro/Repórter Brasil

Na segunda quinzena de abril, o agricultor Adão Spinola, de 61 anos, foi resgatado pelo Ministério da Economia em uma fazenda de fumo no interior do Rio Grande do Sul, em Venâncio Aires (a maior cidade produtora de fumo do país), onde trabalhava em “condições análogas ao trabalho escravo”, termo jurídico para referir-se ao trabalho servil e semifeudal.

Não é a primeira vez em que, nessa região, acontecem casos como o de Adão. De acordo com o portal G1, em uma matéria de 2017, cinco empregadores na “lista do trabalho escravo” eram gaúchos, de 132 ao total. Os locais onde esses trabalhadores estavam são próximos de onde Adão foi encontrado. Dois dos quatro locais ficavam em Lajeado e Rio Pardo.

Adão trabalhou por 15 anos na propriedade e seu salário era pago através de moradia. Entretanto, o trabalhador não tinha acesso às instalações sanitárias (chuveiro e vaso sanitário), nem água potável. Para tomar banho, ele tinha que ir até o vizinho e, para beber ou usar água, retirava de um açude próximo a sua casa. Sem banheiro, Adão usava a vegetação na propriedade.

Sobre essa situação, seu empregador, Atelor Luís Bald, argumenta: “Há quatro anos atrás ele veio para cá, tinha água, tinha chuveiro, só não tinha vaso. Aí ele consumiu com tudo”, diz. “Ele simplesmente não cuidou. Ele tinha que preservar e não preservou”, afirmou, tentando justificar o injustificável. Sua casa ficava em um galpão da propriedade, que era tanto sua moradia, quanto seu local de trabalho, onde secava e armazenava fumo. Apenas um quarto e uma pequena cozinha foram improvisados.

Foto: Divulgação/MPT

Apesar de viver em condições de miséria, Adão, supostamente, devia R$ 180 mil reais no Banco do Brasil. Na realidade, Atelor usou seu nome para obter créditos subsidiados no banco, e também utilizou-o como fiador de seus próprios empréstimos. O latifundiário utilizava o valor para financiar suas culturas de milho e fumo, mas nega que seria a única parte beneficiada nos negócios; afirma que ele e Adão eram “parceiros”. Já de acordo com o camponês, ele não recebia nem o próprio salário: “Às vezes me davam um pouco de dinheiro, às vezes não. De uns três anos pra cá, não pude comprar nem um sapato”, expõe.

Não obstante o trabalho servil, Adão revela que, em momentos de embriaguez (vício desenvolvido para conseguir suportar o trabalho), ele já teria sido agredido pelo patrão em uma de suas discussões. “Ele me deu muito soco, comigo bêbado. Quando eu dizia uma coisa que ele não gostava, quando eu pedia alguma coisa e ele negava”.

Esse tipo de relação semifeudal, de trabalho servil, é comum nessa região do estado produtora de fumo. Essas propriedades “terceirizadas” vendem sua produção para grandes empresas, entretanto, a situação dos camponeses quase nunca é fiscalizada. Muitas vezes a própria produção é feita de forma precária, onde eles ficam expostos à agrotóxicos e trabalham exaustivamente para cumprir com as exigências das empresas. Não é à toa que a região é uma das que mais têm casos de suicídio no país inteiro (e a grande maioria no campo).

De acordo com o portal Repórter Brasil, o fumo produzido por Atelor era vendido para as empresas Continental Tobaccos Alliance (CTA) e Tabacos Marasca. A sua esposa mantém um contrato de integração com as duas companhias, comprando sementes e insumos da empresa e se comprometendo a vender ao final da safra. A CTA e a Tabascos não foram responsabilizadas pelo caso.

A propriedade, mesmo após ter sido local de trabalho servil (juridicamente chamado de “trabalho escravo”), continua funcionando, e nela se encontram outros seis trabalhadores em condições similares às de Adão.

Essas relações semifeudais se reproduzem não somente nesta região ou nessa rama de produção agrícola, mas em todo o país e em vários setores. É o que se designa por “semifeudalidade”, ou seja, o caráter semifeudal do país que se reproduz juntamente com a penetração capitalista burocrática no campo, cuja exploração de camponeses e semiproletários com relações pré-capitalistas (sob formas aparentemente modernas e capitalistas) são utilizadas para maximizar os lucros das companhias imperialistas, de grandes burgueses e dos latifundiários.

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