O Senado aprovou no dia 25 de outubro a renovação da Lei de Cotas, em um esforço frouxo de fingir uma preocupação com o acesso à Educação. Apesar disto, dados têm revelado que a lei de cotas não têm produzido resultados na democratização da Educação pública e gratuita. Segundo o Inep, o número de cotistas nas universidades teve a maior queda em 10 anos no ano de 2022.
O relatório dá conta que 108,6 mil candidatos cotistas entraram em universidades no ano de 2022, 13% a menos do que o registrado em 2021. Em números reais, a baixa representa 16 mil alunos cotistas a menos nas universidades. Essa queda na entrada dos calouros cotistas tem sido registrada desde de 2019, mas o relatório foi inédito em registrar uma baixa no número de alunos cotistas ao mesmo tempo que houve um aumento no número total de alunos que entraram no ensino superior.
Permanência é central
A razão para a queda é escancarada: além da manutenção do vestibular, medida excludente na seleção de quem entra para as universidades (vale lembrar que o vestibular foi abolido em países como Argentina e Chile, após revoltas estudantes no início do século passado), as décadas de precarização das universidades e esfacelamento das políticas de permanência estudantil terminaram de desencorajar os mais pobres a entrarem nas universidades, ou a impedir os poucos que entram a concluírem os estudos. Fato central nos últimos três anos (período em que a queda do número de cotistas se acentuou) foi a pandemia de Covid-19, contexto utilizado pelo governo federal para o genocídio do povo pobre brasileiro, o mais prejudicado pelo negacionismo, desinformação e também pelas péssimas condições mantidas nos hospitais fruto dos cortes continuados por décadas a fio. Além disto, no contexto da pandemia a fome e a miséria escalaram alturas, lançando milhões de brasileiros nas péssimas relações de trabalho.
As políticas de assistência estudantil (por exemplo, bolsas permanência, restaurantes universitários gratuitos, passe livre universitário e moradia universitária) não são garantidas e, onde existe, se mostram insuficientes. O Brasil, atualmente, conta com 2.377 instituições de ensino superior públicas e privadas, mas só existem 117 residências universitárias no País. A alimentação também é questão candente: neste ano, lutas estudantis em torno do mau funcionamento dos restaurantes universitários já foram noticiadas no Espírito Santo, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso e Pernambuco.
A consequência direta dessas faltas é a evasão escolar. E, com os índices cada vez maiores de abandono, cada vez menos pessoas tentam entrar. Desde 2019 (antes da pandemia), os números de evasão escolar estão em alta. 251.374 alunos concluíram os estudos naquele ano, 3% a menos que no ano anterior. Já uma pesquisa feita pelo Instituto Semesp, com base na evasão entre os anos de 2017 e 2021, revelou que 55,5% dos alunos abandonam os cursos de graduação.
Trabalho e estudo prejudicam conclusão
Além disso, o aumento da pobreza, e a necessidade imediata de buscar trabalho, impede a entrada nas universidades ou, no caso dos que entram, afeta gravemente a conclusão dos estudos.
É o que disse a farmacologista Soraya Smaili, ex-reitora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), à Revista Fapesp: “Alguns conseguem conciliar emprego e faculdade, outros têm mais dificuldade e acabam deixando os estudos em segundo plano”, disse.
EaD é imposta por tubarões da educação privada
Esta crise permanente da educação pública é fruto do projeto privatista que é imposto ano após ano, governo após governo, que se expressa em um movimento duplo: subfinanciamento das instituições de ensino público e repasses de verbas públicas para as instituições de ensino privadas. Frente a essa grave situação, o povo mais pobre é empurrado para formas de financiamentos e matrículas fáceis nas modalidades de Ensino à Distância, oferecidas principalmente por instituições privadas, mas não só. Isto, longe de ser uma “alternativa possível” frente aos desafios para que os filhos do povo possam estudar, é a mais brutal forma de favorecer os interesses das classes dominantes em detrimento de uma educação que sirva ao povo.
Nos últimos dez anos, o EaD cresceu em 700% no Brasil. A modalidade está em tendência de crescimento constante desde o início dos anos 2000. Segundo a reportagem da Revista Fapesp, “Cai de patamar o número de estudantes que conseguem concluir a graduação nas universidades públicas no Brasil”, é muito comum que, dentre os alunos que abandonam os estudos e voltam para a faculdade, a segunda opção seja o EaD.
Isso porque a modalidade, quase sempre paga e com a qualidade comprovadamente pior, engana com a aparência de facilidade pela falta de necessidade de locomoção e possibilidade de montar “horários próprios”. Ambos problemas que poderiam ser resolvidos com as políticas de permanência e turnos acessíveis nas universidades públicas.
Solução
Não há indícios de que o problema da precarização do ensino público, gratuito e de qualidade será resolvido. Para isso, precisaria de investimento. Nas últimas semanas o Tribunal de Contas da União já declarou que o orçamento da Educação será abaixo do piso até, pelo menos, 2024.
Por outro lado, estudantes de todo o País se mobilizam em jornadas massivas de luta por melhores condições na universidade. No dia 26/10, estudantes de Sociologia e Filosofia da Universidade Federal Fluminense (UFF), no Rio de Janeiro, conquistaram todas as suas reivindicações relativas à assistência estudantil após ocuparem um bloco da universidade. Suas pautas eram relacionadas à criação de um curso noturno, para possibilitar o ingresso de trabalhadores nos cursos.