Sequência AND #1: Jacó e Jacozinho

Sequência AND #1: Jacó e Jacozinho

Inauguramos com a seguinte postagem a SEQUÊNCIA AND o novo conteúdo do jornal A Nova Democracia voltado à cultura popular. Publicaremos playlists inspiradas em diferentes temáticas (artistas e grupos, estilos, cenas culturais…), brevemente contextualizadas. Nosso objetivo é engajar o público de AND na apreciação musical como um todo e em debates sobre temas da cultura. Estas playlists serão publicadas nas plataformas Spotify e YouTube.


 

1 – Ladrão de terra (Jacó e Jacozinho, 1967)

2 – Castigo do fazendeiro (Sertanejo, 1962)

3 – Filhos da Bahia (Novos Sucessos, 1969)

4 – Filho pobre (Os Grandes Sucessos, 1976)

5 – Tropa saudosa (Jacó e Jacozinho 76, 1976)

6 – Empreitada perigosa (Terra Bruta, 1972)

7 – Violinha barulhenta (Jacó e Jacozinho, 1968)

8 – É fogo (Jacó e Jacozinho, 1966)

9 – Começo do fim (Jacó e Jacozinho, 1970)

10 – Terra bruta (Terra Bruta, 1972)

Extra: Saudade também tem hora (Sertanejo, 1962)*

* Disponível somente no YouTube.

 

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O camponês pobre fala

O espírito do camponês pobre poucas vezes se expressou tão claramente na música brasileira como nas modas caipiras interpretadas pela dupla Jacó e Jacozinho.

A dupla é composta pelos filhos do catireiro paranaense Jacó da Viola (Gabriel Jacob), inicialmente com os irmãos Amado e Benedito Jacob, incorporando posteriormente Antônio Jacob. O período ativo da dupla integra uma rica cena de conformação da música caipira no Brasil, entre os anos 50 e 70, onde dividiram espaço com figuras como Tonico e Tinoco e Tião Carreiro e Pardinho.

Jacó e Jacozinho em sua primeira formação. Foto: Reprodução.

Jacó e Jacozinho destacam-se dos demais, sobretudo, pela seleção de composições que fazem ressaltar, das lamúrias do campo brasileiro, a impavidez e a fúria camponesa. É significativa a reincidência de imagens violentas nas canções, mas também como aparecem: no entremeio de várias músicas sobre a vida e os amores da roça; embaladas pela mesma viola, pelas mesmas harmonias melancólicas. A violência, portanto, é absolutamente cotidiana para o camponês… E há, para além de mera exposição, uma tomada de posição quanto à ela – há uma clara demarcação moral das classes em conflito, portanto, de onde parte a violência justa e injusta.

Lá naquele fim de mundo

O trabalhador sofria

Igualzinho um cão sem dono

A cor da nota não via

Quem falava em dinheiro

Só bala que recebia

Os capangas da fazenda

Deste jeito respondia:

Aqui a bala domina

A boca da carabina

É a nossa tesouraria

(Filhos da Bahia, composição de Moacyr dos Santos e Lourival dos Santos. Novos Sucessos, 1969)

É reflexo de um tempo particularmente violento: o novo ciclo de expansão do latifúndio ocorrido a partir dos anos 40 – que também aparecia em vários sertanejos e baiões da época no tom de “saudade da terra”. Ou seja, sob a perspectiva de imigrantes, camponeses enxotados, como expresso em Saudade também tem hora (composição de Sulino e Moacyr dos Santos. Sertanejo, 1964). Ao mesmo tempo, camponeses médios e pobres de todo o país reagiram e, em diferentes níveis de consciência e organização, realizaram dezenas de justiçamentos e vinganças – isso impactava, ademais, a psicologia dos que recém-chegavam nas cidades.

Jacó e Jacozinho em interpretação teatral de “Ladrão de Terra”. Foto: Reprodução.

Jacó e Jacozinho estiveram entre os que melhor expressaram, em sua época, essa consciência espontânea – personificando um camponês pobre, de maneira quase descritiva, ao afugentar pistoleiros enviados por um “grande fazendeiro”. Aqui é a crueza da realidade que vence pelo conhecimento empírico, a radicalidade das canções se alça para muito além do que outras músicas engajadas da época. Às vezes, basta emprestar sua voz a uma classe para que a guerra cante.

Nós tava de onze a onze na parada nesse dia

Os pobre é carta baixa e os rico são as manilha

Foi uma chuva de bala só capanga que corria

Foi pela primeira vez que o dinheiro não valia

O barulho acabou cedo

Entregaram foi de medo

Terras que me pertencia

 

Na cerca de minha terra, ai ai

Quem mexer ninguém imagina, ai ai

Os arame são de bala, ai ai

E os mourão de carabina, ai ai

(Ladrão de terra, composição de Moacyr dos Santos e Lourival dos Santos. Jacó e Jacozinho, 1967)

Ao longo das últimas duas décadas, o jornal A Nova Democracia tem se sustentado nos leitores operários, camponeses, estudantes e na intelectualidade progressista. Assim tem mantido inalterada sua linha editorial radicalmente antagônica à imprensa reacionária e vendida aos interesses das classes dominantes e do imperialismo.
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