Serão os robôs os médicos do capital? Mudança tecnológica tem classe

Foto: Daniel Hertzberg/USN&WR

Serão os robôs os médicos do capital? Mudança tecnológica tem classe

Para onde vai a informática e a robótica numa mudança tecnológica sob a direção das grandes empresas? É um tema atualíssimo onde o Ministério de Saúde de Lula cria uma área de Saúde Digital.

Luiz Vianna, em seu livro O ocaso da clínica, mostra extrema preocupação com a decisão feita de uma máquina substituir o raciocínio clínico, ou seja, a clínica baseada em dados supostamente objetivos substituir a clínica baseada na pessoa com suas singularidades. Há todo um mercado que gira em torno dessa substituição. 

Para a população em geral, um exemplo: os sistemas de pagamento de médicos credenciados nos planos privados de saúde glosam determinados tratamentos, caso não estejam nos seus protocolos baseados em evidências que são construídas a partir de médias estatísticas. Se o paciente estiver fora de um padrão estatístico definido pela empresa, os médicos não recebem. No âmbito público, nada impede que o SISREG (sistema de regulação) esteja parametrizado para recusar tratamentos e exames solicitados pelos médicos de família, numa gestão do SUS voltada para o controle dos gastos, também baseados em estatísticas que não consideram as especificidades de cada paciente.

Ao analisar os fenômenos da vida social, não podemos ser unilaterais, são unidades (e lutas) de contrários. Há um lado extremamente promissor na utilização das inovações tecnológicas em termos de facilitação de comunicações entre áreas distantes e centros de referência, por exemplo, da tirada de dúvidas sobre resultados de exames onde imagens médicas podem ser enviadas a distância em tempo real. Exemplo, assim, um médico de família no interior do Acre pode mandar pela Internet um RX suspeito para tirar uma dúvida num centro especializado em São Paulo, para tomar uma decisão rápida que pode salvar a vida de um paciente. Anteriormente, quando as imagens eram gravadas num filme, isso não era possível.  O acompanhamento de doenças crônicas pode se beneficiar da telemedicina (consultas por Internet) desde que não substitua a necessária interação física entre o médico e o paciente pois o exame físico é fundamental para o diagnóstico e terapia e nenhum dos exames complementares o substitui. Exemplos houveram na pandemia de Covid-19, onde os pacientes eram monitorados frequentemente sem precisar ir a um serviço. A psicoterapia tem sido feita online ou de forma híbrida sem prejuízos, a princípio, para a efetividade do tratamento. Para podermos afirmar, porém, que essas a única inovações somente responderão às necessidades dos povos, tempos que admitir que elas não estão sob a direção popular e, sim, majoritariamente, subordinadas aos interesses das grandes empresas, especialmente das grandes seguradoras de saúde, preocupadas em planejar seu orçamento e gastos, e voltadas para o lucro máximo.

Na África, atualmente, experimentos são feitos com programas de empresas multinacionais substituindo totalmente o profissional por máquinas com consulta médica a distância, exames diagnósticos e prescrições de medicamentos (Luiz Viana em OutraSaúde de 16/11/2023). 

Tomemos o uso da inteligência artificial (IA). Chomsky, por exemplo, é muito claro ao dizer: degradará nossa ciência e nossa ética. Qual o  fundamento de programas de IA como o ChatGPT: análise de grandes bancos de dados e parametrização estatística. O mesmo princípio da Medicina baseada em evidências. Esta, há tempos, tem sido criticada quanto a ser o único critério de tomada de decisão ao nível individual pois, baseada em médias, não consegue captar a singularidade dos sujeitos doentes pois eles podem estar nos extremos da curva normal. Se Imaginemos uma seguradora de saúde ou um governo que trata a saúde como gestão de crises e rebeliões potenciais, ou seja, gestão controlista da pobreza, quem tomará a decisão sobre um tratamento caro? O robô, baseado em protocolos que negarão atendimentos se não estiverem enquadrados nas médias. Isso se faz hoje, mas quem opera esses sistemas pode ter contradições com o método. Pois, as decisões envolvidas nos cuidados dos pacientes são permeadas pela ética, pela moral e pela empatia com o sofrimento, coisas que poderão ser incluídas na parametrização de um robô? Luiz Viana aponta, a quem pertence majoritariamente as tecnólogas de inteligência artificial? Ao grande capital (Outra Saúde de 06/03/2023). De que ideologia o robô poderia ser alimentado, se isso fosse possível? Da ideologia dominante. Qual seria essa ideologia dominante? A Lei de população tão bem colocada no capítulo 24 de O Capital: o capitalismo gera uma população sobrante para as necessidades do capital, as trata com políticas compensatórias baseadas nos impostos, principalmente jogados sobre os trabalhadores assalariados e as classes médias; em épocas de crise, como a atual, a tendência a eliminá-la se torna majoritária, pela violência e descaso. Valerá a pena (ou melhor, em linguagem científica, será custo efetivo) para uma máquina parametrizada pelo capital financeiro, tratar determinadas doenças com alta letalidade nas populações informais pobres? Tais dilemas existem hoje de alguma forma, em serem humanos. Mas esse são contraditórios, tem uma moral que é uma unidade e luta de contrários, ou seja, sujeita a transformação e permeável a considerar o bem estar do povo acima do lucro dos monopólios, há luta coletiva para mudar os termos da sociabilidade. Conseguirá um robô ser dialético? Não, ele será programado para servir principalmente, ao capital financeiro, e aos governos que são chamados a gerir a crise do capital, com seus objetivos de melhor programar receitas e despesas (e lucros) com a saúde 

Dada a composição de classe que orienta o governo Lula, hegemonia latifundiário burocrática servil ao imperialismo, resta-nos acompanhar essas iniciativas e aguçar o entendimento de trabalhadores da saúde e população em geral sobre o que pode estar por vir.

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