Neste mês de novembro foi lançado o 3º Relatório de Monitoramento de Violação de Direitos Humanos na Baixada Santista: Desdobramentos da ‘Operação Escudo/Verão’, e os resultados são alarmantes. Segundo os dados da Secretaria de Segurança Pública, conforme consta no Relatório, “a polícia matou 496 pessoas de janeiro a setembro, número que supera os anos de 2021, 2022 e 2023 inteiros”.
A Operação Escudo iniciada em julho de 2023 contabilizou 28 mortes decorrentes da ação da polícia, enquanto a Operação Verão iniciada em março de 2024 contabilizou 56 mortes decorrentes da ação policial, uma destas vítimas foi o pai de Ryan, uma criança de 4 anos de idade morta pela polícia no dia 5 de novembro enquanto brincava com outras crianças na calçada de sua casa, exatamente no mesmo local onde a polícia havia assassinado o pai de Ryan alguns meses antes.
O governo diz que ”as mortes em decorrência de intervenção policial são resultado da reação de suspeitos à ação da polícia’ e mortes como a de Ryan são ‘efeitos colaterais’’ das ações, revelando a verdadeira essência fascista do governo de Tarcísio de Freitas e seu Secretário de Segurança Pública capitão Derrite.
Para a produção desse relatório foram analisadas a ação policial que resultou na morte de uma criança de 4 anos e um adolescente de 17 anos, e feriu com tiros outras duas pessoas no Morro do São Bento, na cidade de Santos, litoral de São Paulo, e os desdobramentos dessa ação. Os depoimentos dos familiares, amigos e pessoas próximas, além dos registros feitos com câmeras denunciam práticas padronizadas de violências cometidas por agentes do Estado, principalmente as forças auxiliares de repressão.
Destacamos alguns pontos abordados no relatório que reforçam as diversas denuncias apresentadas pelo AND no decorrer dos seus mais de 22 anos de existência, que envolvem práticas sistematizadas reproduzidas por militares que participam dessas ações de execução, como por exemplo a elaboração incompleta do Boletim de Ocorrência e a descaracterização do local do crime para dificultar a pericia, o uso de veículos sem identificação, falta da câmera corporal e a identificação nos uniformes dos policiais, bem como as práticas de tortura e as execuções feitas com tiros à queima roupa, além da interferência durante os procedimentos de exames cadavéricos e durante os atos fúnebres de cortejo
Vale relembrar a denúncia que fizemos aqui há poucos meses, sobre o caso da execução do estudante Gicelio de Souza Filho quando voltava para casa após sair da escola, também no Morro do São Bento. Essa ação policial foi marcada por práticas parecidas com as práticas descritas no Relatório.
Na conclusão do Relatório é apresentada uma lista com mais de 20 pedidos de providências ao Ministério Público do Estado de São Paulo, como:
a) Suspensão imediata das Operações Policiais no Morro do São Bento, sobretudo com a presença de forças especiais;
b) Facilitar a família de Ryan o acesso justo, devido e efetivo ao processo legal, tendo em vista o acompanhamento dos danos materiais e imateriais; isso inclui: gastos com o funeral, tratamentos hospitalares, psicológicos, assim como os custos dos processos judiciais;
c) Reconhecer as violações de direitos humanos ocorridas durante a operação e emitir um formal pedido público de desculpas, garantindo reparação integral às famílias das vítimas, incluindo restituição, indenização, reabilitação e medidas de não repetição;
d) O Estado deve garantir o direito ao luto, sem interferência de agentes do estado, a reparação financeira coletiva dos danos causados pela operação policial nas favelas da Baixada Santista;
e) Demandar da Secretaria de Segurança Pública que apresente o protocolo de abordagem e operação policial em localidades com alta concentração de crianças e adolescentes, como quadras, escolas, creches, hospitais ou postos de saúde; Proibição da utilização de qualquer equipamento educacional ou de saúde como base operacional das polícias civil e militar, vedando-se, inclusive, o baseamento de recursos operacionais nas áreas de entrada e de saída desses estabelecimentos;
f) Determinar a comunicação ao Ministério Público Estadual de qualquer intervenção policial nas comunidades da região da Baixada Santista, contendo os dados gerais e operacionais (como data, hora, unidade responsável e local, objetivo da operação policial, efetivo e armamento empregado, câmeras disponíveis) e posteriormente os resultados operacionais da ocorrência (apreensões, ocorrências, mortes, lesões, disparos efetuados, entre outros);
g) Determinar transparência virtual dos protocolos operacionais das operações, incluindo-se os levantamentos orçamentários dos gastos públicos despendidos, entre outros pedidos importantes, entre outros.
Esse documento foi produzido de maneira colaborativa entre diversas forças políticas como o Movimento Independente Mães de Maio, o Ouvidor das Polícias do Estado de São Paulo, o Centro de Antropologia e Arqueologia Forense CAAF/UNIFESP, parlamentares progressistas, além de outras organizações da sociedade civil e movimentos de defesa dos Direitos Humanos.