SP: Polícia barbariza 800 famílias em reintegração de posse em Carapicuíba

SP: Polícia barbariza 800 famílias em reintegração de posse em Carapicuíba

Foto: A Nova Democracia

Mal o relógio marcava 4 horas da madrugada do dia 12 de setembro e um verdadeiro aparato de guerra montado pela Polícia Militar (PM), Guarda Civil Metropolitana (GCM) e forças Táticas de municípios vizinhos entrava em ação contra a comunidade do Escadão, em Carapicuíba, na Grande São Paulo.

Da noite para o dia, aproximadamente 800 famílias foram expulsas das próprias casas, construídas em um terreno público, cuja finalidade deveria ser servir ao exercício do direito à moradia ao povo, como diz a ‘fábula’ que é a Constituição brasileira.

Terror contra a comunidade e censura à imprensa

Com o cerco policial e o terror implantado durante a reintegração, os moradores somente puderam retirar seus pertences às pressas e não receberam qualquer indenização pela destruição de suas moradias pela prefeitura, nem mesmo vagas em abrigos.

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Para remover os moradores, foram mobilizados diversos helicópteros, mais de 40 viaturas policiais, centenas de policiais fortemente armados, Corpo de Bombeiros e todo o aparato estatal com fins de garantir que os tratores e máquinas passassem por cima das casas.

Na operação de remoção, em flagrante ilegalidade, todos os jornalistas foram impedidos pela polícia de entrar na comunidade, o que não incomodou o monopólio da imprensa. Como boas hienas, sem qualquer menção às proibições e mesmo às ameaças sofridas pelos moradores, inclusive com detenções, os funcionários das grandes emissoras acordaram com a polícia a realização de filmagens do sofrimento do povo ao retirar seus pertences e de algumas casas sendo desmontadas, com a condição de informar que “tudo se passou na maior tranquilidade”.

Mesmo com dois ou três policiais posicionados por viela e com todo o terror prévio, alguns moradores, ainda que encurralados, espontaneamente, após retirarem seus pertences, encontraram uma forma de dar vazão à sua revolta, incendiando suas próprias moradias. A fumaça podia ser vista a quilômetros de distância.

Foto: A Nova Democracia

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Farsa eleitoral e promessas

A reintegração foi idealizada pelo coronel-prefeito do município, Marcos Neves (PV), em cumplicidade com a Companhia Metropolitana de Habitação (Cohab-SP), dirigida pela prefeitura de São Paulo, e executada pelo aparato policial de diversas estruturas, municipais e estadual, além de contar com a colaboração de magistrados e promotores.

Assim como fizeram os ex-prefeitos – Sérgio Ribeiro (PT) e Fuad Gabriel Chucre (PSDB) – em períodos eleitorais precedentes, no último deles, Neves prometeu ‘mundos e fundos’ em troca dos votos aos 2,5 mil moradores da comunidade, que há cinco anos viviam no terreno. Na prática, o prefeito entregou a única coisa que o povo pobre nunca deixa de receber do velho Estado brasileiro: ameaças, violência policial e a certeza palpável de que contra as massas se leva uma verdadeira guerra reacionária, que não tem piedade com crianças, idosos e mulheres.

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“Nos acusam de criminosos, mas quem é que com uma canetada está mandando pra rua, sem ter pra onde ir, as 450 crianças que vivem na comunidade? É o prefeito! Ele veio aqui na época de eleição e falou que ia defender a comunidade, e agora fala que nós somos bandidos?!”, disse uma senhora, que, indignada, também denunciou a farsa eleitoral: “Eu não votei. Anulei mesmo e não me arrependo. Não dei o voto para nenhum deles, porque nenhum deles faz diferença”.

O que as massas dizem

Como relataram moradores, alguns dias antes, o velho Estado já intensificava a implantação do terror na região: policiamento ostensivo, revistas pessoais e domiciliares, barracos invadidos, moradores ameaçados de morte, atendimentos negados nos postos de saúde por determinação da prefeitura, celulares apreendidos sem autorização, escolas e ruas fechadas, além de linhas de ônibus desviadas para que não passassem perto do local.

Após esses acontecimentos, como foi possível notar, inclusive com a repercussão nacional do caso, a prefeitura e seus papagaios do monopólio da imprensa tentaram jogar a população dos arredores e a opinião pública contra os moradores da comunidade, acusando-os de vândalos e criminosos, e de que “haveria tráfico de drogas”.

Foto: A Nova Democracia

O Comitê de Apoio ao AND acompanhou a reintegração e colheu depoimentos dos moradores.

Quando interrogado sobre a questão da criminalização da luta pela moradia, um morador – que preferiu não se identificar – acrescentou: “Aqui a maior parte é trabalhador, com família. Quem não tá trabalhando é porque tá desempregado e não tem pra onde ir… Eles ficam dizendo que na comunidade tem drogas, que é tudo bandido e que, por isso, vão reintegrar. Se tem droga até no avião do Presidente da República, como é que fica a situação? Vão reintegrar o Palácio do Planalto por causa disso? Isso é desculpa pra nos tirar daqui”.

Um comerciante, expressando alto nível de consciência, esclareceu: “Eles querem jogar todo mundo contra a comunidade. Na verdade, na cidade de Carapicuíba, o prefeito é um coronel. Ele mesmo é dono de áreas griladas da prefeitura, de parte de um shopping center. É só ver quem ele defende: a prefeitura cede área para grandes empresas e familiares de políticos e ataca os moradores da comunidade”. Essa fala foi uma demonstração de que, apesar de todas as tentativas, o monopólio da imprensa, em seu jogo sinistro, não conseguiu esconder o crime cometido contra os pobres.

Foto: A Nova Democracia

Sobre a acusação de que a existência da comunidade proliferaria a criminalidade, outro vizinho foi categórico: “Antes de ocuparem, esse terreno da Cohab era um lixão, inclusive utilizado pela prefeitura como depósito ilegal de entulho. Sempre vinham caminhões e mais caminhões despejar. Aqui, esse parque, depois das 7h da noite, não dava pra passar, era abandonado, vazio. O terreno servia como depósito de corpo. Depois que o povo começou a morar lá, dá pra andar mais tranquilo por aqui nesse horário. Ficou mais seguro, antes era um abandono”, explicou.

Moradores protestaram

Como noticiou o jornal A Nova Democracia semanas antes, após a notificação de que a reintegração de posse movida pela prefeitura ocorreria no dia 12, um protesto dos moradores paralisou uma avenida central da região com barricadas em chamas. Atacados pela polícia, os moradores não se intimidaram e responderam com paus e pedras. Um ônibus foi incendiado.

Foto: A Nova Democracia

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Já no dia 10 de setembro, com cobertura do Comitê de Apoio ao AND (que realizou também uma brigada e distribuiu diversos exemplares), mais de cem moradores marcharam em direção à prefeitura para exigir que a reintegração não ocorresse. No trajeto, os manifestantes cantaram palavras de ordem como Ô Marcos Neves, enganador, cadê a casa que você não entregou?! e Deixa passar a revolta popular!

Nessa ocasião, a prefeitura sequer recebeu os moradores, e preferiu apresentar seus homens armados contra mulheres, crianças e idosos que protestavam.

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