Agradando a extrema direita, o Supremo Tribunal Federal (STF) retirou restrições ao uso de helicópteros em operações policiais e a realização de operações perto de escolas, hospitais, postos de saúde e creches. Essas são determinações da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 365, conhecida como ADPF das Favelas e aprovada ontem (03/04) na corte.
A medida foi tão reacionária que foi celebrada pelo governador bolsonarista do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL). “A questão do fim da restrição do uso de helicóptero também é importantíssima. A gente ainda vai ter de analisar essa decisão, o dia a dia da atividade policial é diferente, mas que ela vem apontar algo muito bom, eu não tenho dúvida disso. Ela tirou barreiras importantíssimas. Eu me sinto muito contemplado por essa decisão. A intenção do estado é cumprir a decisão na íntegra”, disse ele, em relação à ADPF. O governo de Castro ficou marcado por 3 das 5 maiores chacinas do Rio de Janeiro.
A ADPF das favelas foi uma medida implementada em 2019 frente à revolta popular com o alto número de mortes por policiais, que em 2018 havia chegado aos exorbitantes 1.520 assassinados – um número maior do que todas as baixas da Guerra das Malvinas (1982). Inicialmente, a ADPF buscava reduzir o número de mortes por agentes de Estado, mas o conteúdo foi completamente alterado.
Além do uso de helicópteros e do fim do que o STF chamou de “restrições territoriais por perímetro à ação policial” – referindo-se às operações nos ambientes educacionais e sanitários –, a ADPF dos ministros aprovou a retirada da necessidade de avisar previamente a ocorrência de operações a diretores de escolas e postos de saúde.
Com esse conjunto de aberrações aprovadas no texto da ADPF 635, o aumento do número já elevado de assassinatos de crianças pobres, principalmente pretas, nas favelas volta a ser uma preocupação. Em 2018, o adolescente Marcos Vinícius, de apenas 14 anos, foi assassinado no Complexo da Maré enquanto usava roupa de escola e uma mochila. Depois de ser alvejado, Vinícius chegou a informar para sua mãe que foi o blindado da polícia que atirou nele. Em 2017, a adolescente Maria Eduarda, de 17 anos, foi morta por um PM dentro de sua própria escola, em Acari, zona norte carioca.
Uma pesquisa do Instituto Fogo Cruzado mostrou que 48% das crianças e adolescentes baleados entre 5 de julho de 2016 e 8 de julho de 2023 (267 mortos e 334 feridos) são atingido em ações policiais – um número que tende a ser subestimado pela manipulação de evidências ou por casos não investigados até o fim.
Apesar da ADPF das favelas, somente em 2023, 871 pessoas morreram em decorrência de operações policiais, o equivalente a 2,3 mortes por dia. Agora, com a queda nas restrições, a possibilidade de um novo crescimento se torna uma nova preocupação para os moradores das favelas da cidade do Rio.
Uma outra medida proposta e aprovada pelo STF é a utilização da Polícia Federal (PF) na investigação de mortes por agentes do velho Estado. A justificativa é minar a “parcialidade” das corporativizadas Corregedorias das Polícias Militares.
Acontece que a situação não tende a mudar muita coisa. Afinal, a Polícia Federal (PF) não é conhecida por uma prática ilibada, conforme mostrou o caso do policial federal aposentado que coordenou o maior grupo paramilitar de tráfico de armas no Brasil. A PF também é conhecida, em outros estados, pela violência policial: em 2024, a Polícia Federal deu cobertura a um ataque de pistoleiros aos camponeses pobres de Machadinho D’Oeste, no interior de Rondônia.