TI sob ataque no Paraná tem processo de demarcação atrasado há 16 anos

AND apurou processo de demarcação da TI Guasu Guavirá, anulado na época do governo de Jair Bolsonaro (PL) e não retomado por Luiz Inácio (PT). Indígenas estão sob ataques constantes na área desde a metade do ano passado.
Indígenas atacados por pistoleiros no final do ano. Foto: Comunidade Avá-Guarani

TI sob ataque no Paraná tem processo de demarcação atrasado há 16 anos

AND apurou processo de demarcação da TI Guasu Guavirá, anulado na época do governo de Jair Bolsonaro (PL) e não retomado por Luiz Inácio (PT). Indígenas estão sob ataques constantes na área desde a metade do ano passado.

A Terra Indígena (TI) Guasu Guavirá, palco de um ataque pistoleiro cruel entre os dias 29 e 31 de dezembro de 2024, está com o processo de demarcação de terras sob tramitação há 16 anos, segundo informações apuradas pelo jornal A Nova Democracia em várias portarias emitidas desde a data.

Os estudos para demarcação da TI Guasu Guavirá começaram em 2009, com a publicação da portaria n° 136 no dia 6 de fevereiro daquele ano.

O estudo é a primeira etapa do processo de demarcação de terras. Ao todo, o processo tem cinco etapas: o estudo, a delimitação, a declaração, a homologação e a regularização.

A informação acessada por AND consta na portaria número 2 do Ministério da Justiça e da Fundação Nacional do Índio (Funai; hoje Fundação Nacional dos Povos Originários).

A única exceção às etapas da demarcação é para Reservas Indígenas que, por serem doadas, adquiridas ou desapropriadas pela União, não passam pelo mesmo processo que terras de posse tradicional.

O Estado brasileiro demorou 9 anos e 7 meses para concluir a fase de estudo da TI Gasu Guavirá. Ao todo, foram 9 portarias expedidas entre 2009 e 2017, um sinal claro de letargia dos órgãos do velho Estado frente à urgente demanda dos povos originários.: número 136 (2009), 11 (2010), 139 (2014), 46, 198, 305, 835, 1.022 e 1.178 (todas de 2017).

Delimitação e anulação

A emissão do parecer de delimitação ocorreu no dia 2 de setembro de 2018, a partir da portaria n° 9 do Ministério da Justiça e Funai. Nela, o presidente da Funai decidiu por: “Aprovar as conclusões objeto do citado resumo (fase de estudo da TI) para, afinal, reconhecer os estudos de identificação da Terra Indígena Tekohá Guasu Guavirá, de ocupação tradicional do povo indígena Avá-Guarani, localizada nos municípios de Altônia, Guaíra e Terra Roxa, Estado do Paraná.

A portaria, além de concluir o processo de estudo, deixou claro a urgência de garantir os direitos dos povos indígenas na região, uma vez que a TI Guasu Guavirá era amplamente ocupada por imóveis de não-indígenas. Os fiscais encontraram 165 imóveis desse tipo na fase de estudos. Até hoje, há 20 processos minerários na região, sete deles em funcionamento.

Dois anos depois, o Ministério da Justiça decidiu, por meio da portaria n° 418 de 17 de março de 2020, “declarar a nulidade do processo administrativo de identificação e delimitação da Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, localizada nos municípios de Guaíra, Altônia e Terra Roxa, no estado do Paraná, instaurado pelas Portarias nº 136/PRES, de 06/02/2009 e nº 139/PRES, de 17/02/2014, e aprovado por meio do Despacho nº 02, de setembro de 2018” (…) “incluindo a nulidade total do RCID já publicado, em atendimento a decisão judicial proferida no dia 17 de fevereiro de 2020.

Não houve nenhuma outra atualização do processo de demarcação entre a portaria de conclusão do estudo e a que anulou o processo. Também não houve nenhuma outra portaria assinada pelo governo de Jair Bolsonaro (2018-2024) sobre a TI Guasu Guavirá.

Força Nacional entra em cena

O governo de Luiz Inácio publicou, entre 2023 e 2024, três portarias sobre a TI Guasu Guavirá. As três medidas colocaram a Força Nacional nos arredores da região sem reverter o processo de anulação da demarcação.

A escolha do uso da Força Nacional foi feita a despeito do caráter latifundista do aparato militar e dos conflitos entre os agentes do órgão e os indígenas do Brasil, inclusive em Terra Roxa, onde fica a TI Guasu Guavirá.

Um dos maiores exemplos recentes foi quando, em setembro de 2024, indígenas Avá-Guarani resistiram a uma tentativa de expulsão por parte da Força Nacional com paus, pedras, arcos e flechas no latifúndio Fazenda Brilhante. Atrás dos militares, os latifundiários observaram e filmaram o conflito no qual indígenas chegaram a confiscar o fuzil de um oficial militar.

Ataque pistoleiro

Sem demarcação, não é surpresa que os latifundiários do estado se sintam encorajados a atacar os indígenas da TI Guasu Guavirá como parte de uma nova ofensiva que já data de meses.

Os pistoleiros que atacaram a Terra Indígena no final do ano a serviço de latifundiários deixaram quatro indígenas feridos, dentre eles uma criança de 7 anos, um adolescente de 14 e outros dois jovens de 25 e 28 anos. Vídeos mostram um dos jovens atingido por um projétil no queixo com o peito coberto de sangue.

Além disso, plantações e a vegetação circundante da TI foram incendiadas pelas hordas de bandidos.

No dia 1° de janeiro de 2025, o Conselho Indigenista Missionário denunciou que: “Com o processo de demarcação paralisado por determinação judicial, com base no marco temporal, as comunidades da TI Tekoha Guasu Guavirá enfrentam desde julho de 2023 uma série de ataques armados, que deixaram barracos destruídos, indígenas feridos por atropelamentos propositais e por disparos de arma de fogo, além e vários feridos com gravidade.”

Criança indígena baleada por pistoleiros. Vídeo: Reprodução

Cimi: ‘Força Nacional age como se nada estivesse ocorrendo’

Eles denunciam que a Força Nacional não serve para impedir os ataques pistoleiros: “A Força Nacional, que foi enviada à região por meio da Portaria Nº 812, do Ministério da Justiça, para atuar e conter a violência, age, ao que parece, como se nada estivesse ocorrendo.” e continuam: “Ao ser permanentemente acionada pela comunidade ou inclusive por instâncias do governo federal, relativiza as denúncias e chega sempre atrasada, depois que os indígenas já foram agredidos. Essa postura não aparenta ser um acaso e já aconteceu durante os graves ataques que esta mesma comunidade sofreu entre os meses de julho e setembro de 2024.

A Força Nacional sabia com antecedência dos ataques que ocorreram no final do ano, mas nada fizeram, segundo os indígenas: “Os ataques dos últimos dias foram anunciados e as forças de segurança pública sabiam disso. A comunidade ficou durante horas cercada por pistoleiros sem que nenhuma ação de proteção fosse realizada.

Um questionamento encerra o parágrafo: “Diante destas circunstâncias, estaria a Força Nacional acobertando essa situação de violência contra os Avá-Guarani, sonegando informações aos órgãos superiores?

Governo vai reforçar presença de militares pró-latifúndio em TI sob ataque no PR – A Nova Democracia
A medida foi tomada após quatro indígenas serem baleados por pistoleiros, dentre eles uma criança de 7 anos, um adolescente de 14 e outros dois jovens de 25 e 28 anos. O envio dos militares não deve resolver a crise, visto que a Força Nacional já agiu várias vezes a serviço dos latifundiários e bandos pistoleiros.
anovademocracia.com.br

O presidente Luiz Inácio não se pronunciou sobre os questionamentos e denúncias acerca da atuação da Força Nacional. O AND entrou em contato com o Ministério da Justiça para esclarecimentos sobre o papel dos militares no estado e aguarda resposta.

O AND também questinou o Ministério da Justiça sobre o andamento do processo de demarcação, mas não obteve resposta.

A matéria segue aberta para novos pronunciamentos.

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