Turquia: Preso político morre no 297° dia de greve de fome

Turquia: Preso político morre no 297° dia de greve de fome

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Mustafa Koçak e sua mãe (Fonte: Free Grup Yorum)

Mustafa Koçak, preso político do velho Estado turco, morreu em 23 de abril, com 29 kg, no 297° dia de sua greve de fome em luta por liberdade. Preso em 23 de setembro de 2017 e sentenciado à prisão perpétua em dia 11 de julho de 2019 por “violação da ordem constitucional” do velho Estado turco, o vendedor de sanduíches, de 28 anos, em forma de protesto, iniciou a greve de fome já no terceiro dia do mesmo mês. 

Mustafa foi acusado por um informante policial de ter “traficado armas” para um grupo revolucionário de esquerda que realizou um sequestro ao promotor Mehmed Selim Kiraz, em Istambul, em 2015. Mehmed Selim era investigador do assassinato de Berkin Elvan, um garoto de 15 anos que participou das manifestações de 2013 do Parque Gezi. Em 6 de junho, no caminho para comprar pão, o menino foi atingido por gás lacrimogêneo, e ficou em 269 dias de coma até morrer. Os militantes revolucionários que o sequestraram exigiram que as “autoridades” revelassem os nomes dos agentes responsáveis pelo assassinato do menino para os levar à Corte Popular em Istambul. O sequestro terminou com a morte dos dois militantes e do promotor, com a invasão de equipes policiais especiais. Um grande número de inocentes foi perseguido e preso após o acontecido. 

Detido dia 23 de setembro de 2017 e levado ao Departamento de Polícia de Istambul, de acordo com o relato escrito por Mustafa, os policiais colocaram um documento à sua frente e disseram que desse uma declaração de acordo com o documento, para “dar o fora” ou que “o prenderiam e ele não voltaria a ver a luz do dia”. Por não se sujeitar a tamanha injustiça, ele foi submetido a uma série de torturas físicas. Ameaçaram ele, sua mãe, seu pai e sua irmã. Ameaçaram estuprar sua irmã grávida. Ele foi torturado durante 12 dias, até ser preso no dia 4 de outubro. No dia 3 de julho de 2019 ele começou uma greve de fome, com uma série de demandas (liberdade, um processo justo, o fim das torturas). 

No seu processo do dia 11 de julho de 2019, as únicas “provas” oferecidas pelo velho Estado foram testemunhas forjadas. Uma delas, inclusive, declarou que sua afirmativa não era verdade, e que só a fez sob ameaça.

Já no dia 12 de março de 2020, ele foi levado forçadamente ao hospital. Lá ele foi submetido à soros que violavam sua greve de fome, algo que a Anistia Internacional declara uma forma de tortura. Ele foi preso lá por cinco dias, onde o amarraram com cordas, colocaram objetos em sua boca para não gritar, agiram com violência física e sexual. Ele relatou que não apenas médicos, mas inclusive figuras policiais estavam envolvidas nesses atos. Ele heroicamente mordia as agulhas do soro e as arrancava.

Cabe destacar que o informante policial que acusou Mustafa em 2017, Berk Ercan, foi o mesmo que acusou Mahir Mete Kul, um estudante de ciência da computação de 21 anos, de Istambul, que morreu após ser preso por dez meses, acusado de participar de um grupo de esquerda. Ele foi solto com controle judicial que o proibia de muitas coisas, inclusive de estudar. Após sua soltura, o jovem tentou escapar do regime sanguinário de Erdogan numa viagem a barco arriscada pelo rio Maritsa até a Grécia, mas sofreu um acidente e seu corpo só foi achado por “autoridades” gregas só no mês seguinte.

Greves de fome contra o velho Estado

Em uma situação política nacional onde muitos intelectuais, artistas e mesmo qualquer filho do povo é preso por motivações políticas, sujeito às mais diversas formas de tortura, os presos políticos turcos têm recorrido massivamente, como última forma de luta possível naquelas condições, às greves de fome como forma de luta e denúncia ao Estado reacionário.

Recentemente, a morte de Helin Bolek, da banda Grup Yorum, em seu 288° dia de greve de fome, levantou grande comoção e revolta internacional, sendo que, diante das demandas do grupo musical não terem sido cumpridas pelo velho Estado, Ibrahim Gökçek, companheiro de Helin, continua em greve de fome, tendo passado do seu 300° dia. 

Dia 5 de abril, a Associação de Advogados Progressistas da Turquia fez uma declaração combativa no “dia do advogado turco”. Com oito de seus membros presos, quatro em greve de fome, ela declarou que dois deles, os advogados do povo Ebru Timtik (há mais de 90 dias em greve de fome) e Aytaç Ünsal (mais de 60 dias) vão transformar suas greves de fome em greve de “jejum até a morte”, um termo usado pelos presos políticos turcos em greve de fome, dessa forma, arriscando suas vidas para impor uma pressão ainda maior ao velho Estado pela sua liberdade e de tantos outros presos políticos turcos.

A diferença entre a greve de fome convencional e a de “jejum até a morte” é que na primeira a única alimentação são líquidos (água), sal e açúcar e vitamina B, o que prolonga sua vida, já no jejum até a morte a vitamina B é deixada de lado e a pessoa fica muito mais frágil e correndo risco de morte.

Ebru Timtik e Aytaç Ünsal, advogados do povo em “morte rápida” (Fonte: bianet)

Em suas lutas, Helin e Ibrahim fizeram (e o último ainda faz) “jejum até a morte” em muitas ocasiões. Mustafa Koçak ficou muitos meses em “jejum até a morte”. Quando um ativista ou preso político em greve de fome com demandas claras entra em “jejum até a morte”, o silêncio das “autoridades” tem um peso muito grande.

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