Ações de inquilinos em Indianápolis, Providence e Kansas City em defesa de suas moradias. Foto: Tribune of the People
No Estados Unidos (USA), milhares de massas estão resistindo e se organizando para impedir de serem despejadas de suas casas desde o início da pandemia da Covid-19. Contra os despejos, as massas se organizam e lutam ativamente, protestando em frente às casas dos juízes e dos proprietários, além de acorrentarem portas de tribunais.
Foram contabilizados aproximadamente 480 mil despejos desde 15 de março de 2020 até agora, arquivados apenas em 6 estados (do total de 50) e 31 cidades para as quais os dados foram disponibilizados para a pesquisa, de acordo com o Laboratório do Despejo, um projeto de pesquisa da Universidade de Princeton.
O projeto não inclui os dados de despejos que ocorreram sem uma ação de despejo nos tribunais ou quando os inquilinos foram pressionados a sair por notificações de despejo (que não precisam ser arquivadas) e intimidação do proprietário. Isso, além do fato de não abarcar 44 estados estadunidenses, indica que o número real de despejos já realizados em todo o território nacional é muito maior.
A previsão é de que 750 mil pessoas sejam despejadas ainda este ano após o fim da moratória federal de despejo, que designa “a prorrogação do prazo concedido pelo credor ao seu devedor para que uma dívida seja paga”, e acabou em julho deste ano. A previsão é dos economistas do monopólio imperialista Goldman Sachs.
Inquilinos de Kansas vão até os proprietários
Desde o início do ano, a organização Inquilinos da Cidade do Kansas (ICK) tem realizado campanhas vigorosas para combater os despejos em sua comunidade, como a “Janeiro sem nenhum despejo!”. A campanha incluiu manifestações nas casas dos juízes de despejo e fechar portas de tribunais com cadeados. De acordo com a ICK, as ações impossibilitaram cerca de 90% das audiências de despejo naquele mês.
No dia 18/08, ativistas e inquilinos protestaram em frente à casa do seu locador, Matt McGee, que possui inúmeras propriedades na cidade do Kansas e impõe aos seus inquilinos péssimas condições de moradia.
Em entrevista ao jornal revolucionário estadunidense Tribuna do Povo, Sarah e Andrew, dois dos inquilinos de McGee, explicaram que os despejos estão ocorrendo em retaliação a inquilinos que tentam se organizar, mas que McGee se protege contra as ações dos locadores transferindo-os para a responsabilidade de outra empresa antes de iniciar o processo de despejo. Dessa forma, parece que um terceiro é responsável pelo despejo. Por exemplo: a casa de Sarah e Andrew está agora sendo administrada pela empresa Meridian e eles esperam que McGee os despeje em seguida.
Greve de aluguel em Indianópolis
No estado de Indiana, as massas mais profundas, além de correrem risco de despejo, sofrem com condições desumanas de habitação: enchentes periódicas, falta de água quente, bolor de mofo, baratas, ratos e outros. Em todo o estado, cerca de 55 mil despejos foram realizados desde março de 2020. Somente na cidade de Indianápolis, capital do estado, cerca de 19 mil deles foram realizados.
Os inquilinos do condomínio Reverie Estates se uniram à União dos Inquilinos de Reverie (UIR) e iniciaram uma greve de aluguel em 01/08. No condomínio localizado no centro de Indianápolis, eles vivem em propriedades degradadas administradas pela Home Investment Management (H-I), uma empresa de gestão de imóveis que ignora os pedidos de reformas dos inquilinos.
Dois dias antes, em 30/07, a UIR apresentou uma carta com suas reivindicações nos escritórios do Reverie Estates. Ela exigiu o congelamento do preço de todos os aluguéis e das taxas até junho de 2023, bem como ressarcimento pelos tratamentos médicos necessários pela intoxicação por mofo e invasão de esgoto aos apartamentos. Também exigiram a restituição do dinheiro gasto com os reparos dos tetos desmoronando. Além disso, os apartamentos foram mantidos em 3°C durante a maior parte do inverno, provocando extrema umidade. Vazamentos recentes no encanamento acabaram criando cogumelos nos carpetes que forram todo o chão.
A carta dos inquilinos dizia que a H-I tem se esquivado dos pedidos de reparos dos inquilinos usando desculpas “como não ter uma impressora funcionando, não ter acesso ao e-mail”, com os inquilinos não recebendo nenhuma resposta a ligações telefônicas no escritório do gerente.
Como retaliação a um morador que exigiu pessoalmente a reparação ao mofo preto em sua casa, o gerente da H-I chamou a polícia para entregar uma notificação de despejo de emergência no dia seguinte, alegando que o inquilino estava “pondo em risco a sua segurança”. Essas práticas se tornaram comuns durante a pandemia, pois as moratórias de despejo nunca proibiram os despejos por supostas atividades “criminosas ou violentas”. Portanto, os proprietários inventam desculpas para contornar as proibições de despejo.
Lutando pela moradia
Em 03/08, Sucely Murillo, apoiado por ativistas da Rede de Inquilinos de Rhode Island, realizou uma manifestação em frente à casa do proprietário, Alberto Perez, da empresa imobiliária Providence. No dia da manifestação, os manifestantes não se dispersaram em frente às intimidações da polícia, após o locatário a chamar para reprimir o protesto.
Embora Murillo tenha requerido um programa de assistência governamental para cobrir a dívida do seu aluguel, o locador se recusou a tomar parte no programa junto do inquilino e ganhar o valor devido do governo. Em vez disso, ele está pressionando a família com uma tentativa de despejo, pois a família tem vivido em condições insalubres que Perez se recusa a consertar.
“Minha filha foi mordida por baratas”, disse Murillo ao Tribuna, “tenho ratos em meus armários, na geladeira, no banheiro e no quarto, então não posso ter comida em casa e tenho que dormir com as luzes acesas todos os dias”.
O companheiro de Murillo, Edward, havia sido despejado pelo mesmo proprietário, Perez, de outra propriedade no início de maio. Ele agora é forçado a viver entre seu carro e o já lotado apartamento de Murillo. Apesar das várias táticas de intimidação usadas, Murillo diz que continuará sua luta por moradia. Também afirma que sua luta é apoiada por sua família e membros da comunidade.
Enquanto fazia um discurso em frente à casa de Perez, Murillo disse que a comunidade continuaria a enfrentar proprietários como Perez, “e qualquer um que venha contra nossas famílias, porque somos famílias trabalhadoras, mas nosso sistema não presta, e eu acho que é hora de mudar a maré da história”.
Programas do governo são paliativos e não funcionam
O Estado imperialista ianque aplicou uma medida puramente burocrática de “moratória de despejo”, que já acabou . Entretanto, a medida nunca impediu os despejos.
Continuou, após julho, outra moratória que havia sido imposta pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CCPD), devido ao aumento na contaminação pela Covid-19 que os despejos provocam. Mas essa moratória oferece ainda menos segurança para os inquilinos, funcionando mais como “tampa-buraco”.
O governo federal alega, também, que os chamados programas de “alívio de aluguel” podem cobrir as lacunas quando as moratórias de despejo são insuficientes, dando dinheiro aos locadores para cobrir as dívidas dos inquilinos. Entretanto, esse dinheiro mais que frequentemente se perde na burocracia do próprio Estado imperialista e o locador pode não aceitar os subsídios do Estado ou não colaborar no processo de requerimento do programa pelo locatário.
Isso é muito comum pois o contrato assinado com os locatários obriga o valor do aluguel continuar o mesmo por determinado tempo, e num momento em que a demanda para novos imóveis é alta (principalmente com a enorme quantidade de despejos), é mais vantajoso que o antigo inquilino seja expulso e um próximo contrato seja realizado com o valor do aluguel aumentado. Isso apenas demonstra como o todo-poderoso “mercado” se alimenta da exploração das massas.